Internacional

Iniciativas contra o HIV excluem LGBT

Organizações LGBT estão fora da reunião de alto nível para pôr fim à aids até 2016. Foto: Jorge Luis Baños/IPS
Organizações LGBT estão fora da reunião de alto nível para pôr fim à aids até 2016. Foto: Jorge Luis Baños/IPS

por Tharanga Yakupitiyage, da IPS –

Nações Unidas, 6/6/2016 – Os tratamentos contra o HIV/aids aumentaram e melhoraram, mas algumas populações, como as comunidades de lésbicas, gays, bissexuais e transgênero (LGBT), continuam excluídas. Em um informe divulgado antecedendo à reunião de alto nível para pôr fim à aids, o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV/aids (Onusida) afirma que houve um aumento no acesso às terapias antirretrovirais em 160 países.

Mas o documento também recorda que é necessário redobrar os esforços para reduzir e prevenir o HIV (vírus da deficiência imunológica humana), causador da aids (síndrome de deficiência imunológica adquirida), porque há muitos setores sociais considerados fundamentais que ainda permanecem marginalizados. Nas Américas Central e do Norte, e na Europa ocidental, os homens que mantêm relações com homens representam quase 50% das novas infecções de HIV. Na América Latina e no Caribe a proporção é de 30%.

O HIV/aids também afeta de modo desproporcional as mulheres transgênero. Segundo o Grupo Internacional de Referência sobre Mulheres Transgênero e HIV/aids (IRGT), 19% delas são portadoras do vírus e têm 49 vezes mais probabilidades de se contagiarem do que outros adultos não transgêneros. Além disso, as pessoas LGBT também sofrem “discriminação, estigma violento e exclusão social, o que limita seu acesso aos serviços essenciais contra o HIV”, destacou à IPS a diretora de políticas da Coalizão para a Saúde das Mulheres (IWHC), Shannon Kowalski.

A permanente exclusão das comunidades LGBT das respostas contra a doença no mundo concentrou a atenção da ONU. A Rússia, junto com a Organização para a Cooperação Islâmica (OCI), que reúne 57 países, incluindo Arábia Saudita e Egito, proibiram 11 instituições LGBT de participarem da reunião de alto nível, que acontecerá entre os dias 8 e 10 deste mês, em Nova York.

“Nos deixa indignados a exclusão de organizações LGBT e, em particular a de organizações trans e nossas aliadas”, declarou à IPS um dos diretores da Ação Global pela Igualdade Trans (Gate) e do IRGT, Mauro Cabral. A exclusão de participantes transgêneros nos “condena, nos deixa em silêncio”, acrescentou. O Gate foi uma das organizações que ficaram fora do encontro. Por sua vez, Kowalski pontuou que a medida foi “extremamente frustrante. Realmente, parece uma tentativa descarada de negar a realidade”.

O diretor executivo da Pangea, Ben Plumley, se mostrou especialmente preocupado pela possibilidade de a Assembleia Geral se arrogar o direito de excluir uma organização da sociedade civil de qualquer país sem motivo algum. “Foi uma medida trágica e retrógrada e estabelece um precedente perturbador”, destacou à IPS. O IWHC e a Pangea são duas das organizações da sociedade civil que enviaram uma carta ao presidente da Assembleia Geral, Mogens Lykketoft, expressando sua “profunda indignação” com a medida.

“Excluindo organizações, a Assembleia Geral envia um sinal terrível ao mundo, de que está disposta a deixar que a discriminação e o preconceito sejam obstáculos para nossos esforços para acabar com a aids”, diz a carta. “Também mostra um desapreço pelas comunidades mais afetadas pelo HIV e as intenções dos Estados membros de debilitar o resultado da reunião de alto nível, mediante exclusão e consequente omissão”, prossegue.

Consultado sobre a possibilidade de alcançar o objetivo 90-90-90, Plumley disse à IPS que a exclusão de comunidades LGBT “garante” que as metas não serão alcançadas. A Onusida criou uma estratégia para acelerar a redução do HIV/aids até 2020 que implica que 90% das pessoas com o vírus conheçam sua condição, 90% dos que a conhecem tenham acesso a um tratamento adequado, e 90% das pessoas que recebem antirretrovirais diminuam a carga do vírus em seu organismo.

Dessa forma se tenta acabar com a epidemia até 2030, no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Em lugar de se concentrar nos recursos para as próximas décadas para controlar a epidemia, temos que retroceder e lutar por questões básicas de direitos humanos. É hora de liderança, não de medo”, apontou Plumley. Cabral sugeriu à ONU incluir as vozes das comunidades afetadas para que deem sua própria perspectiva e tenham uma “participação significativa”, e também poder de decisão.

Lykketoft afirmou que a decisão não está em suas mãos, mas Kowalski observou à IPS que pode fazer muitas coisas, como incluir representantes LGBT como panelistas na reunião de alto nível e criar espaços específicos para discutir os direitos dessa comunidade. Alguma coisa desse tipo foi feita, mas Kowalski ressaltou que devem aumentar, prosseguir e ampliar as conversações inclusivas.

Cabral destacou a necessidade de a ONU assumir um papel destacado na coleta de dados sobre as populações LGBT afetadas pelo HIV/aids, para melhorar a destinação de recursos e para que estes cheguem aos que mais necessitam. Porém, acrescentou que a inclusão de pessoas transgênero em política e nos processos de decisão em escala internacional depende do lugar que ocuparem na sociedade.

“Vivemos em um mundo que nos persegue, nos golpeia e nos mata, é muito difícil pensar que as organizações internacionais irão ter uma política revolucionaria”, disse Cabral à IPS. Kowalski, Plumley e Cabral destacaram a necessidade de os governos priorizarem a inclusão da comunidade LGBT nos esforços de prevenção do HIV/aids. “Os governos devem enfrentar os fatos, tomar medidas e responder às realidades da vida das pessoas”, ressaltou Kowalski.

Nos últimos dois anos, o número de pessoas com HIV que recebem antirretrovirais aumentou para 17 milhões, dois milhões a mais do que o objetivo fixado pela Declaração Política sobre HIV e Aids, de 15 milhões para 2015. Nas regiões mais afetadas do mundo, como África oriental e austral, o número de pessoas que recebem tratamento mais do que dobrou, de 24%, em 2010, para 54%, em 2015. O número de pessoas em tratamento diminuiu as mortes relacionadas com o HIV/aids em 43% em todo o mundo.

“Melhora a consciência sobre o potencial das terapias antirretrovirais”, enfatizou o diretor executivo da Onusida, Michel Sidibé, por ocasião da apresentação do informe dessa agência. “Exorto todos os países a aproveitarem a oportunidade de acelerar a prevenção do HIV e os programas de tratamento para acabar com a epidemia de adis até 2020”, acrescentou. No entanto, reconheceu os obstáculos que enfrentam alguns setores, como as comunidades LGBT. Envolverde/IPS