Internacional

Mais mortes infantis em zonas de guerra

Crianças residentes em um local de Proteção de Civis, administrado pela Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul, participam de um evento cultural em Juba, no dia 27 de março deste ano. Foto: JC McIlwaine/ONU
Crianças residentes em um local de Proteção de Civis, administrado pela Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul, participam de um evento cultural em Juba, no dia 27 de março deste ano. Foto: JC McIlwaine/ONU

Por Thalif Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 24/8/2015 – A crescente quantidade de mortes de civis nos conflitos armados atuais, especificamente mulheres e crianças, gera fortes mensagens de condenação por parte de instituições internacionais e organizações de direitos humanos. Os piores responsáveis são as partes beligerantes nos “cinco países mais conflituosos do mundo”: Síria, Iraque, Sudão do Sul, República Centro-Africana e, especialmente, Iêmen, onde o número de vítimas civis aumenta praticamente a cada hora.

A Convenção de Genebra de 1949 continua sendo violada em suas regras básicas das guerras, nos conflitos de Afeganistão, Líbia, Gaza, Nigéria, Birmânia, Somália e República Democrática do Congo, entre outros pontos militares sensíveis. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca de 230 milhões de crianças crescem em meio a conflitos, que envolvem tanto governo como “organizações terroristas” como Boko Haram, Estado Islâmico (EI) e Exército de Resistência do Senhor.

Um novo informe do Unicef indica que um dos piores casos é o do Iêmen, onde uma média de oito crianças são mortas ou mutiladas a cada dia. O estudo, intitulado Iêmen: Infância Sob Ameaça, afirma que quase 400 crianças foram assassinadas e outras 600 feridas desde que a violência aumentou, há cerca de quatro meses.

No conflito de Gaza de agosto do ano passado, segundo estatísticas da Organização das Nações Unidas (ONU), morreram mais de 2.100 pessoas, entre elas 1.462 civis. E, entre as mortes de civis, foram contadas 495 crianças e 253 mulheres, em comparação com as mortes de 72 israelenses, sete deles civis.

Discursando no Conselho de Segurança no mês passado, durante um debate aberto sobre infância e conflitos armados, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, afirmou que é “um imperativo moral e uma obrigação legal” proteger as crianças, e que nunca deveriam “ser colocadas em perigo pelos interesses nacionais”. E destacou que 2014 foi um dos piores anos da história recente para as crianças em países devastados por conflitos militares.

O do Iêmen, por exemplo, é particularmente trágico para as crianças, segundo o representante do Unicef nesse país, Julien Harneis. Costumam ser vítimas mortais de bombas ou balas, “e aqueles que sobrevivem enfrentam a crescente ameaça de doenças e desnutrição. Não se pode permitir que isso continue”, ressaltou.

O informe do Unicef assina que, além de o conflito ser devastador para as vidas atuais dessas crianças, “terá consequências aterradoras para seu futuro”. Em todo o país, quase dez milhões de crianças – 80% da população nacional de menores de 18 anos – precisam de ajuda humanitária urgente. Mais de 1,3 milhão de pessoas foram obrigadas a abandonar suas casas, acrescenta o estudo.

O escritório em Nova York da Arigatou Internacional, uma entidade com sede central em Tóquio, organiza um fórum sobre Ideais Religiosos e Realidade: a Responsabilidade dos Líderes de Impedir a Violência Contra as Crianças, que acontecerá esta semana em Genebra. Rebeca Rios-Kohn, diretora do escritório nova-iorquino, pontuou à IPS que o diálogo inter-religioso pode ter um papel crucial para gerar uma mudança de conduta em áreas do mundo afetadas por conflitos armados.

Rios-Kohn destacou o exemplo dos “corredores de paz” promovidos pelo Unicef, que permitiram vacinar crianças em áreas de conflito. “Mas, embora este seja um assunto importante que tem grande atenção dos meios de comunicação, não devemos esquecer que o problema da violência é mundial e afeta muito mais crianças dentro de suas casas, na escola e na comunidade, bem como em orfanatos, centros de detenção e outras instituições onde residem”, acrescentou.

Rios-Kohn também afirmou que o fenômeno da exploração de crianças na internet, que será abordada no fórum, é um problema enorme que preocupa os especialistas, entre eles a Interpol, por sua crescente magnitude e porque os responsáveis ficam impunes facilmente.

Jo Becker, da Human Rights Watch, apontou que a educação infantil também é afetada, pois, no ano passado, grupos ou forças armadas danificaram ou destruíram mais de mil escolas em todo o planeta. As escolas mais afetadas foram as da Palestina – onde os ataques aéreos israelenses e os bombardeios danificaram ou destruíram 543 prédios escolares em Gaza – e Nigéria, onde o grupo islâmico armado Boko Haram cometeu atentados contra 338 escolas e raptou 276 meninas de sua escola em Chibok, Estado de Borno, em abril de 2014. Em consequência, centenas de milhares de crianças têm negada sua educação, enfatizou.

De acordo com o Unicef, nunca houve tantas crianças refugiadas desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Essa agência também assinalou que as diferentes dimensões da crise que as crianças enfrentam no Iêmen incluem pelo menos 398 delas assassinadas e 605 feridas desde a escalada de março. Nos últimos seis meses, o Unicef também deu apoio psicológico para ajudar 150 mil crianças a enfrentarem os horrores do conflito. Cerca de 280 mil pessoas aprenderam a evitar serem vítimas de minas e outros artefatos sem explodir.

Apesar das tremendas necessidades, o Unicef diz que sua resposta continua sofrendo uma grave falta de dinheiro. Dos US$ 182,6 milhões que pediu para o Iêmen, até agora só recebeu 16%. “Precisamos de fundos com urgência, para podermos chegar às crianças que sofrem necessidades desesperadas. Não podemos cruzar os braços e deixar que sofram as consequências de uma catástrofe humanitária”, ressaltou Harneis. Envolverde/IPS