Por Baher Kamal, da IPS –
Roma, Itália 8/6/2016 – A Organização das Nações Unidas (ONU) identifica 17 grandes mares para seu trabalho, mas o Mediterrâneo talvez seja o caso mais dramático, já que de chamado berço da civilização passou a ser um cemitério para milhares de solicitantes de asilo e migrantes. E é muito provável que seja a bacia de águas mais contaminadas do planeta. O Mediterrâneo abrange superfície de 2,5 milhões de quilômetros quadrados e é rodeado por 22 países, que junto compartilham uma costa de 46 mil quilômetros e abrigam cerca de 480 milhões de habitantes em três continentes – Ásia, África e Europa.
Mas também é uma espécie de grande lago salgado, por ser um mar semifechado, pois só tem dois pequenos pontos de contato com o oceano aberto, o canal de Suez, pelo leste, e o estreito de Gibraltar, a oeste. Isso implica que suas águas precisam de 80 a 150 anos para se renovarem, segundo o Plano de Ação para o Mediterrâneo (PAM), projeto com sede em Atenas, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
Em outras palavras, uma gota de água contaminada permanece circulando no Mediterrâneo durante um século, em média. Acrescente-se a isso que um em cada três de seus habitantes, ou mais de 160 milhões de pessoas, são residentes permanentes nos centros urbanos situados ao longo de sua costa. Além disso, 180 milhões de turistas visitam suas praias anualmente, o que eleva para 340 milhões a quantidade de seres humanos concentrados ali durante a alta temporada.
A consequência é que milhões de pessoas lançam no Mediterrâneo seus dejetos sólidos e líquidos, domésticos e urbanos. O problema fica mais evidente se considerarmos que, até há poucos anos, mais de 40% dos centros urbanos careciam de instalações para tratamento de esgoto, e que 80% destes eram lançados no mar sem tratamento, segundo o Pnuma/PAM.
As atividades industriais também são uma das principais fontes de contaminação, principalmente pelos setores químicos, petroquímicos e metalúrgicos, como confirmam os seguintes exemplos:
– Cerca de 60 refinarias lançam no mar aproximadamente 20 mil toneladas de petróleo por ano;
– Os produtos químicos utilizados na agricultura geram escorrimentos que contêm pesticidas, nitratos e fosfatos;
– Outras fontes de contaminação são as indústrias do tratamento de lixo, produção de solventes, papel, tinta, plástico, tecido, estamparia, tratamento de metais e curtumes.
Mas o Mar Mediterrâneo também está sob pressão de suas intensas atividades marítimas. Quase 30% de todo o comércio marítimo internacional passa por seus portos ou suas águas, bem como aproximadamente 25% do petróleo que o planeta transporta por mar. Deve-se ter em conta que cerca de dois mil navios mercantes de mais de cem toneladas se encontram no mar a todo momento, e que 200 mil chegam a cruzar o Mediterrâneo a cada ano.
Esse tráfego marítimo não provoca apenas contaminação, mas se estima que 50% das mercadorias transportadas por mar têm algum grau de perigo. Algumas substâncias químicas são mais perigosas do que o petróleo, embora as quantidades desses produtos transportadas por via marítima no Mediterrâneo sejam equivalentes a uma fração do volume de petróleo que os navios-tanque transportam.
Por outro lado, a contaminação por hidrocarbonos procedente do funcionamento dos navios inclui uma variedade de lançamentos de petróleo e misturas oleosas que são geradas a bordo. O Pnuma/PAM acaba de lançar sua Avaliação de Dejetos Marinhos no Mediterrâneo, no contexto da Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente, realizada em Nairóbi, capital do Quênia.
O lixo marinho se firma como um problema crítico no Mediterrâneo, exacerbado pelos limitados intercâmbios hidrológicos da bacia com os oceanos, bem como pela pressão de suas costas densamente povoadas, pelo turismo altamente desenvolvimento e os impactos da passagem de 30% do tráfego marítimo mundial, além da contribuição adicional dos rios e das áreas densamente urbanizadas.
Em comparação com a avaliação anterior, de 2008, este informe fornece dados sobre os resíduos e dejetos plásticos que cada país lança no Mediterrâneo e especifica as fontes mais importantes de lixo, as mudanças em sua composição nos padrões de transporte, bem como uma revisão exaustiva dos dados existentes para os quatro compartimentos do meio marinho: as praias, a superfície, o leito do mar e os dejetos ingeridos.
Tudo o que foi dito poderia se perder na maré de informação relacionada com o Dia Mundial dos Oceanos, que é celebrado hoje, 8 de junho. Um informe da ONU diz que os oceanos do mundo – sua temperatura, química, biodiversidade e suas correntes – impulsionam os sistemas globais que fazem com que a Terra seja habitável para a humanidade.
“Nossa água de chuva, água potável, nosso tempo, o clima, as costas, grande parte de nossos alimentos, e inclusive o oxigênio do ar que respiramos, todos, em última instância, são proporcionados e regulados pelo mar. Ao longo da história, os oceanos e mares são condutos vitais para o comércio e o transporte”, destaca o informe.
Por ocasião do Dia Mundial dos Oceanos, a ONU destaca dados e números:
– Os oceanos abrangem 75% da superfície terrestre e contêm 97% da água do planeta;
– Mais de três bilhões de pessoas dependem da biodiversidade marinha e costeira para seu sustento;
– Os oceanos contêm aproximadamente 200 mil espécies identificadas, mas o número real poderia chegar a milhões;
– Os oceanos absorvem cerca de 30% do dióxido de carbono produzido pela humanidade, o que amortiza o impacto do aquecimento global;
– Os oceanos são a principal fonte de proteína para mais de 2,6 bilhões de pessoas;
– A pesca marítima, direta ou indiretamente, emprega mais de 200 milhões de pessoas. Envolverde/IPS