Internacional

Migrantes latino-americanos rumam para vizinhos prósperos

Haitianos em uma lotada passagem fronteiriça entre seu país e a República Dominicana. Os dois países compartilham a ilha caribenha La Española e têm um dos mais altos fluxos migratórios da região. Foto: Patricia Grogg/IPS
Haitianos em uma lotada passagem fronteiriça entre seu país e a República Dominicana. Os dois países compartilham a ilha caribenha La Española e têm um dos mais altos fluxos migratórios da região. Foto: Patricia Grogg/IPS

Por Ivet González, da IPS

Cidade do Panamá, Panamá, 17/6/2015 – A rota migratória do jovem venezuelano Jesús Padrón teve como primeiro destino a Espanha, onde ficou por seis meses em 2009. Mas decidiu regressar ao seu país, terminar a universidade e voltar a tentar a sorte, desta vez no Panamá, onde vive desde 2013. “O Panamá me dava estabilidade econômica e era muito seguro. Também vim fugindo da violência que existe em meu país de origem”, contou à IPS este graduado em Ciências Sociais que trabalha como guia turístico, enquanto economiza para melhorar seu status migratório.

Padrón personifica de alguma maneira a migração intra-regional, um fenômeno crescente que atesta, entre outras mudanças, os avanços econômicos de algumas nações da área, embora permaneça ofuscado pelo grande peso dos Estados Unidos como destino para a migração latino-americana.

Entre os migrantes dentro da região, predominam os jovens e as mulheres, mas o grupo dos profissionais e estudantes também começou a optar por nações vizinhas emergentes na economia, política e sociedade, em detrimento de Europa e Estados Unidos, segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

Atualmente são registrados 7,6 milhões de imigrantes na região, dos quais 3,7 milhões procedem da área, equivalentes a 63% do total, segundo o informe Tendências e Padrões de Imigração Latino-Americana e Caribenha em 2010 e Desafios Para Uma Agenda Regional, divulgado no final do ano passado pela Cepal.

Padrón, de 29 anos, também lavou carro e fez outros trabalhos temporários, mas acredita que logo vai melhorar sua situação, “porque o Panamá tem métodos de regularização e legalização de imigração, além de estar em movimento com sustentados crescimentos econômicos a cada ano”.

A Cepal prevê que este ano haverá uma desaceleração econômica regional, mas que o Panamá encabeça o punhado de países que, prognostica, manterá um alto nível de expansão de seu produto interno bruto (6%), seguido de Antiga e Barbuda (5,4%), mais Bolívia, Nicarágua e República Dominicana (5%).

Em particular, a América do Sul teria este ano uma taxa de crescimento em torno de zero, com risco de começar o retorno à pobreza das grandes camadas da população que passaram a engrossar a classe média, graças a maciças políticas sociais possibilitadas pela bonança econômica. Entre outras razões, foi por esses avanços que, no período 2000-2010, os intercâmbios regionais se aceleraram ao ritmo anual de 3,5%, acima do 1% registrado durante os 20 anos anteriores, afirma o estudo sobre os desafios a serem enfrentados pelos governos em matéria migratória.

Argentina, Venezuela, Costa Rica e República Dominicana são os maiores receptores dos fluxos migratórios intra-regionais. Os principais êxodos ocorrem do Haiti para a República Dominicana, da Nicarágua para a Costa Rica, e da Colômbia para a Venezuela, enquanto a Argentina e suas pioneiras leis migratórias atraem vizinhos do Paraguai e da Bolívia.

Inclusive os emigrantes cubanos, que traçam diferentes rotas para chegarem aos Estados Unidos onde têm garantida a residência graças à Lei de Ajuste Cubano, de 1966, têm uma presença crescente em Equador, México e Venezuela. Já Brasil e México constituem a exceção, com uma população imigrante dominada em 70% e 86%, respectivamente, por pessoas de fora da região. No caso brasileiro predominam os imigrantes europeus e no mexicano os norte-americanos.

Os Estados Unidos continuam sendo o maior destino migratório e acolhe 20,8 milhões dos 28,5 milhões de latino-americanos que vivem fora de seus países. Em seguida está a Espanha, destino de 8%, e Canadá. A migração intra-regional representa 15% do total.

Um coquetel de redução da pobreza, aumento do emprego formal e estabilidade política na América Latina, junto com a crise financeira no Norte industrial e o endurecimento em seus países das políticas de entrada, além do clima de xenofobia, colocam a região como uma alternativa temporária ou permanente para os emigrantes.

Inclusive pessoas de países europeus golpeados pela crise, sobretudo da Espanha, veem uma porta de escape na América Latina, como demonstra um estudo divulgado no dia 5 deste mês pela Organização Internacional para as Migrações (OIM).

Desde 2010, o fluxo migratório europeu-latino-americano passou a ser positivo para essa região, que em 2012 recebeu 181.166 europeus, enquanto apenas 119 mil latino-americanos se trasladaram para a Europa, segundo o documento da OIM Dinâmicas Migratórias Entre América Latina e Caribe (ALC) e Entre ALC e a União Europeia.

Marcada pela acelerada feminização e a persistência de discriminação nos países vizinhos de acolhida, a faixa de migrantes intra-regionais se insere em sociedades com altos déficits de equidade, na considerada região mais desigual do mundo.

“O principal durante os primeiros meses é saber abaixar a cabeça e nunca perder de vista o objetivo: buscar com coragem oportunidades para sua família porque na Colômbia é muito difícil conseguir trabalho”, disse à IPS a jovem Andrea Aguirre, de 20 anos, colombiana que trabalha como faxineira em um hotel da Cidade do Panamá.

Sua esperança e que no futuro possa fazer valer seu diploma universitário de Negócios Internacionais. Mas, no momento, sua preocupação é não cair na pobreza que afeta, segundo dados oficiais, 25,8% da população panamenha de quase quatro milhões, aos quais não chega a prosperidade concentrada no centro financeiro e na atividade associada ao canal interoceânico, cuja ampliação está para terminar.

Outro obstáculo está na discriminação por gênero e nacionalidade, que pesa sobre os imigrantes. “Sempre há choques porque algumas pessoas pensam que todas as mulheres colombianas são prostitutas e os homens traficantes”, lamentou Aguirre.

Segundo o informe da Cepal, os movimentos intra-regionais alertam nos países latino-americanos para o fenômeno dos ilegais e para a proteção dos direitos humanos dos imigrantes, um tema analisado até o momento sob o ponto de vista da segregação sofrida pelos latino-americanos em nações industrializadas de acolhida.

Também leva a enfoques comuns para enfrentar situações de vulnerabilidade das pessoas migrantes em espaços como a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), que ampliem e continuem iniciativas de facilitação migratória aportadas pelo Mercosul, pela Comunidade do Caribe (Caricom) e pela Comunidade Andina.

Outras novas rotas, que segundo a Cepal requerem crescente observação, são os deslocamentos em razão de desastres naturais ou pelos efeitos da mudança climática. Envolverde/IPS