Jesús Menéndez, Cuba, 6/4/2015 – Uma engarrafadora de água mineral, pequenas indústrias de alimentos, sistemas de irrigação e reparos viários. Estes são alguns projetos que constam da estratégia de desenvolvimento gestada pelo município de Jesús Menéndez, no leste de Cuba. O Conselho de Administração (prefeitura) dessa localidade de 49.205 habitantes agora tem mais autonomia no planejamento econômico, graças às primeiras medidas descentralizadoras da reforma do governo de Raúl Castro, embora os especialistas as qualifiquem de insuficientes e atrasadas.
“Agora se busca que o planejamento seja feito a partir do município, de acordo com as necessidades e possibilidades reais”, explicou à IPS a vice-presidente para a Economia do Conselho municipal, Nilian Rodríguez. Limitada capacidade de decisão e ação das autoridades locais, exíguos fundos próprios, burocracia e adiamento dos planos territoriais, entre outros problemas, frearam e ainda entorpecem o avanço por igual dos 168 municípios distribuídos entre as 15 províncias deste país.
Apesar de tudo, em seu balanço regional preliminar de 2014, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) destacou, sobre o desempenho de Cuba, que “se mantém o processo de descentralização que busca a autonomia financeira dos governos locais”.
Os primeiros passos para maior autonomia dos poderes locais despertam as esperanças e capacidades de autogestão em lugares afastados dos centros como Jesús Menéndez, da província de Las Tunas, 654 quilômetros a leste de Havana. Os habitantes desse município de 637 quilômetros quadrados vivem em sua maioria na área rural e o restante no casco urbano.
Junto com Granma, Holguín, Santiago de Cuba e Guantánamo, Las Tunas forma o oriente cubano, a região com menor índice de desenvolvimento do país, onde saltam à vista as desigualdades entre regiões, pequenas populações, capitais provinciais e Havana, que apresenta as maiores oportunidades.
Com a agricultura como atividade fundamental, e sem grandes indústrias desde que em 2004 sua centenária central açucareira fechou, Jesús Menéndez integra o grupo de 26 municípios selecionados em 2010 pelo Ministério de Economia e Planejamento para implantar programas de desenvolvimento integral.
Os recursos para esse projeto “não virão do cofre centrado do Estado”, disse Rodríguez, sobre o básico orçamento central destinado, que chega com destinos específicos e bastam apenas para preservar os serviços existentes e paliar algum problema acumulado.
O plano de investimentos é de dez anos e, no caso de Jesús Menéndez, é estimado em 300 milhões de pesos cubanos (cerca de US$ 12 milhões), destinados a executar um programa que inclui a produção, o sociocultural, a infraestrutura institucional e o ambiente.
Segundo a funcionária, o financiamento virá pelos microcréditos bancários para construir moradias, empreender negócios privados ou fazendas; do imposto de 1% sobre a renda que desde 2015 todas as empresas, sociedades mercantis e cooperativas pagam aos cofres municipais, e da cooperação internacional, entre outros.
O ajuste econômico oxigenou o magro fundo dos governos locais ao ceder-lhes a arrecadação tributária do crescente setor privado, que ao fim de fevereiro empregava 489.929 trabalhadores, e das 329 cooperativas não agropecuárias. A Cepal prevê que em 2015 essa contribuição “aumente dentro da renda bruta (do país) em 11%.
A arrecadação municipal é usada em áreas e serviços que beneficiam cada população, e em Jesús Menéndez “representa mais de 5% do orçamento municipal”, pontuou Rodríguez. Na localidade há 1.630 trabalhadores privados, mas ainda não foram criadas cooperativas que não sejam agropecuárias.
Desde 2009, o Ministério da Economia também apoia os municípios com as Iniciativas Municipais de Desenvolvimento Local, na elaboração de suas próprias estratégias de desenvolvimento com projetos econômicos autossustentáveis, que ampliem a produção local, completem cadeias produtivas e elevem o bem-estar comunitário.
Além disso, o banco estatal criou em 2010 o Fundo de Fomento Governamental, ao qual entidades municipais podem apresentar projetos autofinanciáveis, sustentáveis, que gerem ganhos em benefício local e onde participem ativamente as prefeituras. Mas essas medidas representam “paliativos”, com “impactos em geral positivos” para o desenvolvimento local, assegura o economista Juan Triana no informe Presos no Fogo Amigo, recopilado em seu livro Miradas a La Economia Cubana, de 2014.
Triana alertava que a nova Lei de Investimento Estrangeiro, daquele ano, estabelece níveis de aprovação no Conselho de Estado, Conselho de Ministros e ministérios, mas “exclui os governos territoriais, fechando, dessa maneira, uma oportunidade significativa aos territórios de compensarem os déficits que têm em matéria de investimento”.
O especialista analisou que atualmente “os territórios ficam presos dentro de si mesmos por suas limitadas capacidades de manobra” para se inserirem em programas nacionais e globais de desenvolvimento. Triana propõe acelerar as medidas descentralizadoras e empoderar diretamente as localidades para evitar “o aumento das desigualdades territoriais”. Municípios perdidos na geografia cubana, como Jesús Menéndez, arrastam pesados fardos de inúmeras pendências.
Como parte da reestruturação, que reduziu de 156 para 61 os engenhos açucareiros em 2004, foi paralisada a Central Açucareira Jesús Menéndez e mais de três mil trabalhadores tiveram que mudar de emprego. A indústria regia a vida da localidade, com poderes até administrativos, como no resto das comunidades açucareiras.
Dados municipais revelam que em 2005 a produção de bens e serviços foi à bancarrota de 25 milhões de pesos cubanos (US$ 1 milhão), para voltar em 2013 a US$ 51 milhões de pesos cubanos (pouco mais de US$ 2 milhões). Em 2008, o furacão Ike devastou o município e deixou sem teto 14 mil famílias, entre outras graves consequências econômicas. Ainda faltam ser construídas 1.700 casas das que foram destruídas na ocasião.
Diante da grave situação, a localidade protagonizou no triênio 2009-2011 um projeto de desenvolvimento local participativo sui generis, por ser coordenado daqui com manejo descentralizado do orçamento, com apoio da organização internacional Oxfam e da Agência Canadense para o Desenvolvimento Internacional.
Zoraya Pupo, diretora do Centro de Desenvolvimento Local, destacou que a iniciativa foi fundamental, porque “ensinou todos os atores a trabalhar em grupo, administrar e executar a partir do município”, uma carência que os municípios enfrentam para encarar suas novas faculdades. “Despertou o potencial” da localidade, ressaltou à IPS.
Experimento reservado
Sem muitos detalhes nem dados públicos, acontece desde 2011 um experimento nos governos locais e nas províncias de Artemisa e Mayabeque, vizinhas a Havana, e no município especial Isla de La Juventude, segunda maior ilhota do arquipélago cubano.
A experiência, entre outras mudanças, separa a direção dos Conselhos da Administração (prefeituras) e de outros órgãos municipais e provinciais. Além disso, modifica estruturas e poderes, sobretudo dos governos municipais, para torná-los mais independentes, protagonistas e com bases econômicas sólidas.
A iniciativa vai durar até o ano que vem e as autoridades pretendem replicar as mudanças no resto do país e até valorizar a introdução de uma reforma na Constituição para consagrar a nova estrutura. Envolverde/IPS