Por Thalif Deen, da IPS –
Nações Unidas, 6/8/2015 – A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou que 2015 já é “o ano mais mortal” para milhões de migrantes e solicitantes de asilo que fogem de situações de guerra e perseguição em seus países de origem. Mas o Paquistão proporciona refúgio seguro. “Em todo o mundo, um em cada 122 seres humanos é atualmente refugiado, ou deslocado ou solicitante de asilo”, afirmou o escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).
Mas um dos fatos menos divulgados é que o Paquistão foi um dos primeiros países a dar proteção segura a milhões de pessoas que fogem de um conflito militar em um país vizinho, o Afeganistão. Segundo o Acnur, esse país vem abrigando mais de 1,5 milhão de refugiados afegãos registrados desde a invasão soviética ao território afegão, em 1980.
Atualmente, a Turquia ocupa o primeiro lugar, pois tem registrados mais de 1,7 milhão de refugiados, principalmente da Síria, que está devastada pela guerra. O Paquistão vem em segundo lugar e Jordânia em terceiro, com 800 mil. Os países em desenvolvimento agora recebem mais de 86% dos refugiados do mundo, em comparação com os 70% de há dez anos.
Diante da consulta sobre como seu país enfrentou essa crise nos anos 1980, a representante permanente do Paquistão junto à ONU, Maleeha Lodhi, explicou à IPS que, na realidade, seu país recebeu muito mais de três milhões de refugiados no momento mais álgido do conflito, em 1990. Um censo de 2005 confirmou esse número, do qual 1,5 milhão de registrados, enquanto o restante estava sem documentação.
“A ONU e a comunidade internacional tiveram um papel importante no apoio aos esforços do Paquistão para cuidar de nossas irmãs e irmãos afegãos”, pontuou Lodhi. “Mas boa parte desse esforço se deveu aos nossos próprios modestos recursos, porque consideramos que esta é nossa responsabilidade humanitária”, acrescentou.
“Foi o povo do Paquistão que mostrou uma generosidade e uma compaixão exemplares ao abraçar os refugiados afegãos e estender-lhes sua ajuda e seu apoio, e isso por mais de três décadas”, ressaltou a embaixadora. Em um painel da ONU sobre a situação dos refugiados e migrantes, realizado na última semana de julho, Lodhi afirmou que “nunca tentamos devolver nenhum, nem erguemos barreiras ou muros, mas os abraçamos como parte de nossa responsabilidade humana”.
Enquanto centenas de milhares de refugiados continuam fugindo para a Europa, alguns países desse continente tentam limitar a quantidade entradas ou proibi-las completamente. Peter Sutherland, representante especial da ONU para as Migrações Internacionais, disse à imprensa que a tentativa de proibir a entrada de imigrantes e refugiados, especialmente os procedentes de Síria, Líbia, Eritreia, Somália, Sudão e Afeganistão, é “uma resposta xenófoba à questão da livre circulação”.
A crise humanitária se derramou sobre a Europa, especialmente a Alemanha: são registrados cerca de 175 mil pedidos de asilo, contra os 25 mil apresentados na Grã-Bretanha no ano passado. Segundo a ONU, a União Europeia (UE), com 28 países membros, recebeu 570.800 solicitações de asilo no ano passado, o que representa aumento de quase 44% em relação a 2013.
O ponto crítico, segundo o jornal norte-americano The New York Times, está nas principais autopistas britânicas, lotadas de tráfego, onde os imigrantes abrem passagem através do Túnel do Canal da Mancha desde a cidade portuária francesa de Calais. “Os britânicos culpam os franceses, os franceses culpam os britânicos, e ambos culpam a UE por uma política incoerente para as milhares de pessoas, muitas delas fugindo de horrores políticos em seus países e que na Europa tentam encontrar emprego e um futuro melhor para elas suas famílias”, afirmou o jornal.
Enquanto a Áustria anunciou medidas de emergência para resolver a crise de refugiados na frente nacional, o chanceler desse país, Werner Faymann, declarou que dar acolhida aos refugiados é um direito humano que seu Estado está obrigado legal e moralmente a cumprir. A Áustria tem cerca de 8,5 milhões de habitantes, e na primeira metade deste ano recebeu mais de 28 mil pedidos de asilo, pouco mais do que em 2014.
Acredita-se que no ano passado morreram 3.072 imigrantes que tentavam cruzar o Mar Mediterrâneo, enquanto estima-se que esse número foi de 700 em 2013, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM). No mundo, esta agência estima que morreram pelo menos 4.077 migrantes no ano passado, e pelo menos 40 mil desde 2000.
“A verdadeira quantidade de vítimas mortais provavelmente seja maior, pois muitas mortes ocorrem em regiões afastadas e nunca são registradas. Alguns especialistas sugerem que para cada cadáver encontrado há pelo menos outros dois que nunca serão descobertos”, apontou a OIM.
Lodhi afirmou à IPS que, “embora os desafios atuais não tenham precedentes quanto ao seu alcance e sua natureza, eles exigem respostas ancoradas nos valores da compaixão e da empatia, bem com estar à altura de nossa responsabilidade humanitária coletiva”. No painel da ONU, a embaixadora afirmou que metade dos refugiados do mundo atualmente são meninos e meninas, e que esse número aumenta exponencialmente.
As mortes no Mediterrâneo se somam aos falecimentos ou desaparecimentos de muçulmanos rohingyas enquanto fugiam da perseguição, do confinamento e das ondas de violência mortal que sofriam. “Como a comunidade internacional respondeu a tudo isso?”, perguntou Lodhi.
“Francamente, não fazendo o suficiente e não agindo de modo decisivo em vista dessa emergência humanitária. De modo vergonhoso, a comunidade internacional ignorou no passado enormes sofrimentos humanos. Nos lembramos de Ruanda e Srebrenica, entre outras crises”. E, ressaltou Lodhi, a atual crise de refugiados pode assinalar um novo motivo de vergonha. Envolverde/IPS