Por Jeffrey Moyo, da IPS –
Harare, Zimbábue, 27/5/2015 – A sul-africana Nompumelelo Tshabalala sai de sua diminuta choça feita com chapas de metal enferrujado e quase cai diante do correspondente da IPS ao se inclinar para não bater a cabeça na parte superior de sua porta improvisada. “Este é meu lar há 16 anos, vivi aqui com meu marido até ele morrer em 2008. Agora vivo com meus quatro filhos nesta choça de dois cômodos”, contou esta mulher de 41 anos.
Tshabalala vive no distrito de Diepkloof na cidade de Johannesburgo, na África do Sul, em um superpovoado “assentamento informal”, eufemismo para designar as favelas onde vivem 15 milhões dos quase 52 milhões de habitantes do país, segundo estimativas da ONU Habitat.
No vizinho Zimbábue, há cerca de 835 mil pessoas residindo nesses bairros pobres, lotados e de autoconstrução, segundo a Reall, uma organização não governamental britânica que atende os problemas relativos à pobreza urbana.
“Na África se tornou normal viver em favelas. É uma tendência com a qual convivemos e que é difícil de combater por vários fatores, que vão desde a corrupção política até as desigualdades econômicas derivadas da crescente brecha entre ricos e pobres”, apontou à IPS o zimbabuense Gilbert Nyaningwe, especialista independente em temas de desenvolvimento.
Entre sua população total, estimada em 1,1 bilhão de habitantes, a África tem mais de 570 milhões de pessoas vivendo em favelas, segundo a ONU Habitat, e 61,7% da população urbana reside nelas. Em todo o mundo, esta agência da Organização das Nações Unidas (ONU) estima que são 863 milhões de pessoas que vivem nesses assentamentos precários, e se prevê que até 2020 esse número chegará a 889 milhões.
As agências de desenvolvimento na África alertam que as favelas são uma tendência em alta no continente, embora, na média, seus países tenham conseguido reduzir a indigência pela metade, com relação aos níveis de 1990, tal como estabelece um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), estabelecidos em 2000.
Nesse aspecto, a África conseguiu reduzir em cem milhões as pessoas que vivem em condição de indigência, e em países como Egito, Líbia e Marrocos a quantidade de habitantes de favelas urbanas praticamente caiu pela metade. No entanto, a Tunísia as erradicou completamente, enquanto Gana, Senegal e Uganda concretizaram grandes avanços, reduzindo em até 20% as populações desses assentamentos.
Entretanto, a África subsaariana continua sendo a região do mundo com a maior “incidência de favelas”. Nela, milhões de pessoas vivem em assentamentos informais caracterizados pela combinação de superpopulação, frágeis estruturas habitacionais e acesso escasso ou nulo a serviços adequados de água e saneamento.
Héctor Mutharika, economista aposentado que integrou o governo do falecido presidente do Malawi, Kamuzu Banda, afirmou que a escassez de serviços prestados pelas autoridades é responsável pelo aumento das favelas na África. Frequentemente, os governantes se preocupam mais em encher seus bolsos com dinheiro público do que em utilizar esses fundos para financiar moradias adequadas para os pobres, o que os empurra a construir assentamentos informais em qualquer parte, pontuou à IPS.
Para o ativista de Ruanda Otapiya Gundurama, as raízes do problema remontam a muito antes. “As favelas da África são o resultado da infraestrutura urbana que se estabeleceu no continente durante o regime colonial, época em que a moradia e a diversificação econômica eram limitadas e tudo o que dizia respeito à governança urbana estava centralizado, enquanto eram criados povoados e cidades para potencializar os estilos de vida e interesses de uma minoria”, afirmou à IPS.
Alguns políticos africanos opositores consideram que essa tendência de aumento das favelas é consequência do fato de os governos não “investirem em desenvolvimento rural nem urbano”, como opinou à IPS Gilbert Dzikiti, presidente da Assembleia Democrática para a Restauração e o Empoderamento, do Zimbábue.
Líderes da sociedade civil africana culpam o crescente desemprego que há no continente pela multiplicação das favelas. Aqueles que não têm trabalho são os “que mal têm meios para melhorar suas próprias moradias”, afirmou à IPS Precious Shumba, diretor da Fundação de Moradores de Harare.
Os próprios habitantes de assentamentos informais, como a sul-africana Tshabalala, acusam as autoridades municipais de ignorar o aumento descontrolado desses bairros por motivos egoístas. “Aqui as favelas são fontes de mão de obra barata, que mantém em funcionamento as rodas da indústria, e é por isso que as autoridades locais não se importam com nossas condições de vida, porque enriquecem cada vez mais graças às empresas que prosperam com base em nosso suor”, afirmou à IPS.
E a expansão dos assentamentos informais repercute na educação e saúde do continente. “Vários países africanos, sem dúvida, ficarão atrasados no cumprimento do Objetivo do Milênio que propõe conseguir educação primária universal até o final deste ano, especialmente considerando que muitos desses assentamentos não contam com escolas que ajudem a educar meninos e meninas dessas comunidades”, destacou à IPS um alto funcionário do Ministério da Educação do Zimbábue, que pediu reserva sobre seu nome.
E, ao mesmo tempo, “na maioria das áreas transformadas em favelas frequentemente não há banheiros, água, clínicas, o que expõe a população a doenças e, portanto, atenta contra o Objetivo do Milênio de frear a propagação do HIV/aids e de outras doenças nos assentamentos informais”, ressaltou à IPS Owen Dliwayo, da organização Youth Dialogue Action Network, do Zimbábue. Envolverde/IPS