Internacional

Recorde de emergências humanitárias ofusca Dia da População

Jovens no acampamento de refugiados Ifo 2, em Daddab, no Quênia, que tem o apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). Foto: Evan Schneider/ONU
Jovens no acampamento de refugiados Ifo 2, em Daddab, no Quênia, que tem o apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). Foto: Evan Schneider/ONU

Por Thalif Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 10/7/2015 – Ao comemorar, no dia 11, o Dia Mundial da População, a Organização das Nações Unidas (ONU) se encontra em meio a uma batalha praticamente perdida contra as emergências humanitárias causadas pelos conflitos armados, que afastam milhões de pessoas de seus lares e as convertem em refugiadas.

O número de refugiados pela força alcançou o recorde de quase 60 milhões de pessoas no final de 2014, segundo os mais recentes dados da ONU. Mas essa quantidade continuará aumentando ao longo deste ano, a julgar pelo número sem precedentes de pessoas que fogem de seus países de origem e, em sua maioria, cruzam o Mar Mediterrâneo buscando a segurança dos países europeus.

“Entre eles, a maioria das mulheres e das adolescentes enfrentam ameaças particulares, em consequência da falta de saúde e outros serviços essenciais”, afirmou Babatunde Osotimehin, diretor-executivo do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). “As complexas emergências às quais respondemos incluem conflitos prolongados, agravados por governos deficientes ou falidos, pelas consequências da mudança climática e da participação de grupos extremistas que reclamam território, recursos e poder”, acrescentou.

Populações Vulneráveis em Emergência é o tema do Dia Mundial da População deste ano, e seu objetivo é ressaltar as necessidades especiais das mulheres e das adolescentes durante os conflitos e os desastres humanitários. A ONU assegura que a quantidade de pessoas com necessidade de ajuda de emergência duplicou desde 2004 e chegou aos cem milhões atualmente, acima dos 60 milhões de refugiadas. A necessidade atual de financiamento para 2015 é de US$ 19,1 bilhões, em comparação com os US$ 3,4 bilhões de 2004.

Joseph Chamie, ex-diretor da Divisão de População da ONU, disse à IPS que o tema do Dia Mundial da População deste ano é oportuno e apropriado devido ao número recorde de refugiados. É provável que essa cifra histórica continue crescendo nos próximos anos, na medida em que a instabilidade política e os conflitos armados seguirem sem solução e se generalizarem ainda mais, enfatizou.

“O deslocamento forçado de milhões de homens, mulheres e crianças gerou uma crise humanitária que desafia países em todas as regiões do mundo”, destacou Chamie. Para ele, os numerosos serviços que necessitam as populações vulneráveis, como alimentos, moradia, roupas, saúde, educação e segurança, saturam a capacidade dos governos e das organizações não governamentais. Lamentavelmente, a comunidade internacional não consegue entrar em acordo sobre uma solução integral para a crise, ressaltou.

Segundo Chamie, “os governos e os eleitorados são cada vez mais reticentes em aceitar uma grande quantidade de pessoas com necessidades, etnicamente diferentes e que podem representar uma ameaça para a estabilidade social”. A incerteza econômica, os déficits públicos sem precedentes, o alto desemprego e a preocupação pela identidade nacional e cultural estão contribuindo com um sentimento crescente contra os imigrantes, apontou.

Segundo um informe do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), divulgado este mês, das 137 mil pessoas que cruzaram o Mediterrâneo para a Europa no primeiro semestre deste ano, a grande maioria fugia da guerra, do conflito ou da perseguição, transformando-se, assim, em uma crise de refugiados.

Um terço das que chegaram à Itália ou Grécia procedia da Síria, cujos cidadãos são considerados, quase universalmente, aptos para receber o status de refugiados e outras formas de proteção. Em quantidade, Afeganistão e Eritréia ocupam, respectivamente, o segundo e terceiro lugares por origem dos migrantes, que também, em sua maioria, são considerados com direito a obter a condição de refugiados.

Houve aumento de 83% no número de refugiados e migrantes que cruzaram o Mediterrâneo entre janeiro e junho, com um total de 137 mil, em comparação com os 75 mil de igual período do ano passado, segundo o Acnur. O número de mortos no mar também atingiu uma cifra recorde em abril, quando mais de 1.300 pessoas se afogaram ou desapareceram em um único mês, em comparação com as 42 mortes de abril de 2014.

Em comunicado divulgado nos Estados Unidos, o UNFPA diz que as mulheres e as adolescentes que se encontram em situações de emergência humanitária também correm um risco muito maior de sofrer abusos, exploração sexual, violência e casamento forçado durante os conflitos e os desastres naturais. Além disso, muitas mulheres que sobrevivem às crises assumem a chefia de sua família e a responsabilidade de cuidar dos filhos.

Frequentemente têm de superar enormes obstáculos para cuidar da saúde das crianças, dos enfermos, feridos e idosos, e sobre elas recai a maior parte da carga correspondente ao socorro e à reconstrução. Dessa forma, descuidam de suas próprias necessidades para se preocuparem com os demais, segundo o UNFPA.

Uma das prioridades do UNFPA é potencializar e proteger o bem-estar das mulheres, das adolescentes e jovens, bem como atender suas necessidades e inquietações específicas. “Trabalhamos em estreita colaboração com os governos, o sistema da ONU, os sócios locais e outros em preparação para os desastres, para garantir que a saúde reprodutiva se integre às respostas de emergência”, afirmou a agência.

“Neste Dia Mundial da População apelamos à comunidade internacional no sentido de redobrar os esforços para proteger a saúde e os direitos das mulheres e das meninas”, exortou o UNFPA. Envolverde/IPS