Internacional

Resposta ao ebola deve fortalecer sistemas de saúde

Dois trabalhadores da saúde colocam os pés em um recipiente de água com hipoclorito de sódio, à saída de uma tenda de campanha em isolamento, durante simulação de atendimento a pacientes com ebola no hospital de Biankouman, na Costa do Marfim. Foto: Marc-André Boisvert/IPS
Dois trabalhadores da saúde colocam os pés em um recipiente de água com hipoclorito de sódio, à saída de uma tenda de campanha em isolamento, durante simulação de atendimento a pacientes com ebola no hospital de Biankouman, na Costa do Marfim. Foto: Marc-André Boisvert/IPS

Por Thalif Deen, da IPS –

Nações Unidas, 15/7/2015 – “Todos os investimentos, todos os sacrifícios e todos os riscos que correram os trabalhadores humanitários” estarão perdidos se aparecer novo foco, afirmou o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, durante uma conferência internacional sobre o ebola, realizada no dia 10 deste mês. E isso aconteceu. Foi na Libéria, país que havia sido declarado livre desse vírus.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), que fez essa tranquilizadora declaração no dia 9 de maio, confirmou que um adolescente liberiano de 17 anos, que morreu na primeira semana deste mês, esteve em contato com cerca de 200 pessoas, possivelmente desencadeando a propagação do vírus.

Até a primeira semana de julho, mais de 27.100 pessoas tinham sido afetadas pelo ebola, uma doença altamente contagiosa, que causou a morte de mais de 11.100 pessoas, a maioria em três países africanos: Guiné, Serra Leoa e Libéria.

Nesse contexto, a ONU abrigou a Conferência Internacional sobre a Recuperação do Ebola, para esses três países compartilharem seus planos de recuperação e, o mais importante, reunir fundos para continuar a luta contra a enfermidade e fortalecer os sistemas de saúde da região. Nicolas Douillet, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) na África, disse à IPS que o objetivo da Conferência é mobilizar a comunidade internacional.

As necessidades totais identificadas pelos três países, e em escala regional, pela Mano River Union, chegam a US$ 7,2 bilhões para os próximos 24 meses, US$ 3,2 bilhões para os três Estados e US$ 4 bilhões para essa instituição governamental integrada por Serra Leoa, Libéria, Guiné e Costa do Marfim. Porém, o total solicitado chega a US$ 9 bilhões, a se somar US$ 1,8 bilhão já estão comprometidos.

Com relação à necessidade de um bom sistema de saúde, o ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, disse em uma reunião da ONU, em maio, que os recursos gravemente limitados eram uma “penosa carga”. Também destacou que os países da África ocidental pediam fundos para construir melhores e mais sólidos sistemas de atenção médica com planos de vários anos. Segundo Clinton, antes do foco do ebola, a Libéria tinha apenas um médico para cada 71 mil pessoas. De certa forma, a doença foi um desastre causado pela ação humana.

“Guiné, Libéria e Serra Leoa sofreram a epidemia do ebola com sistemas de saúde gravemente desfinanciados”, afirmou Matshidiso Moeti, diretor da OMS para a África. “Depois de um ano atendendo muitos pacientes gravemente enfermos, o pessoal sobrevivente precisa de apoio, melhor proteção, compensação e reforços. É necessária uma total transformação das instalações existentes, e a construção de muitas estruturas novas”, afirmou. “Se outro foco golpear, o saldo será muito pior”, advertiu.

Sarah Edwards, diretora de políticas e campanhas da Health Poverty Action, disse à IPS que, “de fato, é preciso se concentrar nas necessidades de longo prazo dos sistemas de saúde nessa Conferência e em toda a resposta ao ebola. Especificamente, deve-se considerar como os sistemas de saúde dos países afetados pela doença podem ser financiados de forma sustentável.

Isso deve incluir medidas para ajudar os países afetados a explorar as possibilidades de aumentar a receita procedente dos impostos para financiar o fortalecimento dos sistemas de saúde, além de adotar medidas para deter o fluxo de capitais ilícitos e pagar compensações por qualquer profissional da saúde capacitado nos países afetados e que agora trabalha na Grã-Bretanha.

Após visitar a região afetada em outubro de 2014, Magdy Martínez-Solimán, secretária-geral-adjunta da ONU e diretora do Escritório de Apoio a Programas e Políticas do Pnud, afirmou que “essa devastadora crise sanitária destrói vidas e comunidades. Também prejudica as economias nacionais, arrasando com meios de subsistência e serviços básicos, e pode apagar anos de esforços para estabilizar a África ocidental”. E acrescentou que “agora que trabalhamos juntos para pôr fim ao foco, é hora de garantirmos que esses países possam continuar funcionando e rapidamente se coloquem de pé”.

Guiné, Libéria e Serra Leoa já registravam os piores índices de desenvolvimento humano, emergiam de anos de guerras civis e instabilidades políticas e começavam a mostrar avanços animadores, segundo o Pnud. Em setembro de 2014, a ONU criou a Missão para uma Resposta de Emergência Contra o Ebola, uma estrutura destinada a frear a propagação da doença e evitar que surgisse em países que não tinham o vírus, bem como tratar e atender as pessoas infectadas.

O Pnud informou que o produto interno bruto de Guiné, Serra Leoa e Libéria caiu 2% a 3%. Os países perderão cerca de US$ 13 bilhões, segundo as projeções, por causa do ebola. Os meios de subsistência das pessoas diminuem pela perda de salários e produtividade.

A Conferência contou com as presenças do presidente do Zimbábue, Robert Mugabe, que preside atualmente a União Africana (UA), e dos presidentes da Guiné, Alpha Condé, da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, e de Serra leoa, Ernest Bai Koroma. A reunião foi organizada junto com UA, União Europeia, Banco Mundial e Banco de Desenvolvimento Africano. A UA vai organizar sua própria Conferência Internacional para a Luta Contra o Ebola na África nos dias 20 e 21 deste mês, em Malabo, na Guiné Equatorial.

Por sua vez, a organização ONE, com sede em Washington, disse que acompanhar os compromissos e supervisionar os desembolsos é uma tarefa difícil, e às vezes impossível, “devido ao inconsistente, ineficiente e, frequentemente, nebuloso processo de informação e padrões” manejado. Um documento com pautas, divulgado no dia 7 deste mês, afirma que “uma das perguntas mais fundamentais que se faz durante uma crise humanitária é: ‘quanto prometeram os doadores para este esforço?’”.

“Mas, no caso do foco do ebola, a pergunta foi incrivelmente difícil de responder, convertendo-se em um grande problema”, enfatizou a diretora de política de saúde global da ONE, Erin Hohlfelder. “Se não sabemos quanto foi prometido nem quanto foi entregue, ninguém pode emparelhar os recursos prometidos com as necessidades no terreno. Isso faz com que seja difícil identificar as lacunas e corremos o risco de perder tempo, recursos e vidas”, lamentou. Envolverde/IPS