Por Yulia Beret, da IPS –
Milão, Itália, 22/1/2016 – Segundo dados oficiais divulgados pelo governo da Rússia, desde abril de 2014 mais de um milhão de cidadãos procedentes da Ucrânia buscaram refúgio em território russo. Apesar desse número, Moscou não reconhece que exista uma crise migratória. Alguns políticos chegaram a dizer que a comunidade internacional deveria aplicar o modelo russo de gestão de grandes quantidades de refugiados.
Inicialmente, o grande número de pessoas que chegou ao sul da Rússia provocou atrito com a população local, que não está acostumada à diversidade e ignora os protocolos que protegem os refugiados. Porém, as comunidades locais tentam proporcionar ajuda e apoio aos migrantes que precisam de assistência.Os ucranianos foram instalados em campos de refugiados totalmente equipados, em sanatórios e escolas, e inclusive em casas particulares, e foram aceitos em muitas cidades russas, como Rostov-on-Don, Krasnodar e Volgogrado.
O governo russo adotou mudanças nas leis relativas aos prazos para emissão de documentos paraos refugiados, incluída a autorização de estadia no país por diferentes períodos. A documentação oferece o status de refugiado ou de solicitante de asilo temporário. Esta última categoria permite permanência maior no país. Inicialmente, todos recebem ajuda financeira. Depois podem escolher onde desejam se estabelecer, já que o sul da Rússia não pode abrigar permanentemente grande número de migrantes. O Estado também os ajuda com hospedagem e assistência para que consigam trabalho.
Uma das regiões onde os refugiados podem se radicar é o distrito autônomo de Khanty Mansy, na Sibéria ocidental, onde é mais fácil encontrar trabalho, devido principalmente à próspera indústria do petróleo. O governo local também concede um subsídio de maternidade e assessoria aos migrantes sobre as leis locais.
Mas ainda é necessário fazer mais para ajudá-los a se integrar, em uma transição que em certas ocasiões é difícil. Em geral, os refugiados em Khanty Mansy foram bem recebidos pela população, pois há muitas semelhanças entre suas culturas. A interação das duas populações é muito importante, porque os ucranianos deixaram para trás suas casas, seus vínculos sociais e sua cultura.
Atualmente, a maioria dos refugiados em Khanty Mansy tem emprego e condições de vida dignas, bem como outros benefícios, como acesso gratuito à universidade e às escolas. Em outras palavras, têm o direito a uma vida segura e digna.Porém, como em toda crise política, a oposição está presente, sobretudo devido às diferenças nas atitudes regionais em relação aos migrantes.
O governo oferece limitadas instruções a respeito e não há documentação indicando claramente quais são os direitos dos refugiados, o que aumenta o estresse burocrático e as dificuldades na hora de conseguir os documentos legais e compreender os prazos para solicitá-los.
Um problema crescente é o alto nível de desemprego devido à entrada de mão de obra não qualificada. Mas as regiões que recebem os refugiados costumam ser as de maior capacidade para absorver esse tipo de trabalhador. Por exemplo, os empregos no setor da construção e produção têm grande demanda, mas o problema surge quando os refugiados têm elevada educação formal e exigem melhores oportunidades de emprego.
Em lugar de destinar ao acaso certos lugares paraos refugiados, é preciso criar uma base de dados que permita selecionar e destiná-los segundo seus conhecimentos e experiência, ajudando, dessa forma, as economias formais.A Rússia carece de política adequada de apoio e aproveitamento eficaz de seus refugiados. Os programas atuais lhes dão apoio por no máximo dois anos, o que é pouco tempo para que muitos se integrem adequadamente.
Além disso, não há associações de proteção e promoção dos direitos dos refugiados. Por isso, o maior impacto recai nos habitantes originários. Como não existe um orçamento independente destinado a crises de refugiados, os impostos locais aumentam para apoiar esse novo segmento da população.Em conjunto com os salários, essencialmente estáticos, e a atual crise financeira, incluída a queda progressiva dos preços internacionais do petróleo, a carga de gastos gerada pelos refugiados recai sobre a comunidade local. Alguns dos habitantes que acolheram os migrantes não conseguiram mantê-los.
A corrupção tampouco ajuda e frequentemente se manifesta em custos derivados da tramitação e expedição da documentação necessária. Representantes de várias organizações não governamentais asseguram que funcionários do órgão estatal correspondente exigem cerca de US$ 2 mil para entregar os documentos aos refugiados de forma “rápida e sem problemas”.
Muitos problemas se acumulam em um breve período de tempo devido à crise dos refugiados ucranianos. Para melhorar sua situação, antes que se agrave, será preciso substituir medidas administrativas com incentivos econômicos e reexaminar os procedimentos de reassentamento, para permitir sua melhor redistribuição em todo o país, de tal maneira que sejam levadas em conta tanto as necessidades da nova população, como as dos habitantes originários. Envolverde/IPS