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Seca deixa Papua-Nova Guiné em risco

Habitantes de Avaninofi, em Papua-Nova Guiné, exibem tomateiros perdidos durante a grave seca deste ano. Foto: Catherine Wilson/IPS
Habitantes de Avaninofi, em Papua-Nova Guiné, exibem tomateiros perdidos durante a grave seca deste ano. Foto: Catherine Wilson/IPS

Por Catherine Wilson, da IPS – 

Goroka, Papua-Nova Guiné, 17/11/2015 – Aproximadamente um terço da população de Papua-Nova Guiné, o Estado insular mais povoado do Oceano Pacífico, sofre a pior seca deste século, e os especialistas alertam que a influência do fenômeno meteorológico El Niño continuará até março do próximo ano. Dickson Guina, presidente do Comitê Nacional de Desastres, disse à IPS que 2,4 milhões de pessoas neste país de 78,3 milhões de habitantes sofrem uma grave falta de alimentos e água. Muitas escolas e diversos hospitais tiveram que fechar por causa da escassez de água.

“Nosso problema mais urgente é a água. Não temos um rio perto que possamos utilizar, por isso dependemos da chuva para beber. Mas só existe um tanque de água para cada dez famílias, o que não basta”, afirmou Mangab Selau, da localidade de Siar. “Agora bebemos água de poço, que não é segura para nossos filhos”, contou outra moradora, Hilda Jerome.

Mais de 80% da população vive no meio rural e depende da agricultura de subsistência para seu alimento diário. Mas, desde que começou a época seca, em maio, os rios e as bacias de captação de água da chuva secaram, enquanto os cultivos de primeira necessidade, como batata e inhame, pereceram pela aridez.

A região central montanhosa, onde vive 40% da população, é a mais afetada, e as zonas de maior altitude, como a província de Enga, também sofrem a devastação das hortas devido às geadas. O governo destinou inicialmente uma ajuda de US$ 8,3 milhões, mas agora a aumentou para US$ 60 milhões, para que os distritos enfrentem a seca, confirmou o Comitê Nacional de Desastres. A última seca extrema ocorreu em 1997-1998, e afetou gravemente um milhão de pessoas.

No hospital Kudjip Nazarene de Mt Hagen, na província das Terras Altas Ocidentais, o médico Scott Dooley confirmou à IPS que começam a se propagar as doenças transmitidas pela água. “Muitos dos rios pequenos estão secos e, quando se passa por um rio grande, sempre há muita gente. Agora essas fontes de água estão mais contaminadas e, como muita gente não ferve nem trata a água, ocorre um número maior de enfermidades gastrointestinais”, apontou.

Apenas 40% dos papuásios têm acesso a água potável, e a diarreia provoca 13% das mortes de menores de cinco anos, segundo a Organização Mundial da Saúde. Muitos centros de saúde da região tiveram que fechar por diferentes períodos pela falta de água, incluindo os únicos dois hospitais na vizinha província de Simbu, afirmou Dooley.

Papua-Nova Guiné, que fica a nordeste da Austrália no sudoeste do Oceano Pacífico, experimenta monções tropicais de novembro a março ou abril, e é um dos países mais úmidos do mundo, com precipitação média anual de 3.142 milímetros. Mas a estação seca, que vai de maio a outubro, pode ser grave sob a influência do fenômeno El Niño/Oscilação do Sul, cuja fase quente toma corpo quando sobe a temperatura superficial da água nas áreas oriental e central do Pacífico equatorial, em geral a cada três a sete anos.

O aquecimento das águas da maior bacia oceânica do planeta, somado a outros padrões de circulação atmosférica de grande escala, ocasiona significativos efeitos climáticos regionais observados em grande parte do mundo. Outros Estados insulares da região, entre eles Fiji, Tonga e Ilhas Salomão, também ficam com a pior parte do El Niño este ano, além de Papua-Nova Guiné.

Os 6.700 habitantes da localidade de Avaninofi, nas terras altas do leste, sofreram a perda de colheitas e enfrentarão grave escassez de alimentos até o início do próximo ano. As mulheres, que são as principais encarregadas de trabalhar a terra, sofrem para encontrar fontes alternativas de sustento.

“O solo é muito duro e tentamos regar com água do rio, mas não tem ajudado. Estamos sobrevivendo com bananas. Cozinho duas ou três para as crianças comerem antes de ir para a escola. Depois, à tarde busco outras coisas para cozinhar”, contou Lisa Ovifa, agricultora em Avaninofi. As próximas chuvas são esperadas para este mês. “Mas, quando chegarem, os terrenos demorarão a se recuperar. Não sei como vamos sobreviver”, acrescentou.

Uma vez semeados, a mandioca e a batata demoram três meses para crescer, o inhame cinco meses e os inhames africanos nove. A mudança climática agravará as consequências das condições meteorológicas extremas na produção futura de alimentos, alertou Luanne Losi, analista do Escritório Nacional de Mudança Climática e Desenvolvimento.

“Percebi que as temperaturas diurnas e noturnas são muito mais altas do que eram há  muitos anos. A mudança climática fez com que nossas vidas como produtores de alimentos sejam muito mais difíceis, sobretudo devido aos dias mais quentes”, afirmou Selau. “É muito mais difícil trabalhar no calor mais extremo, que faz com que nossos cultivos murchem e sequem”, lamentou a camponesa de Siar.

As agricultoras do povoado procuram melhorar a produtividade mantendo mudas em áreas pantanosas durante os meses áridos, para depois recuperá-las para a plantação quando as monções chegam.

Jenifa Kena, da organização de desenvolvimento Mulheres na Agricultura das Montanhas do Leste, trabalha para que a população das terras altas rurais se preparem para os impactos dos desastres naturais. Para isso, fomenta o cultivo de variedades mais tolerantes à seca, como inhames africanos, e sua conservação em pó para cozinhá-lo durante a estação seca.

O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários alerta que as consequências da atual seca provavelmente se intensificarão até o primeiro trimestre de 2016, com o consequente risco para 4,7 milhões de pessoas em 11 países do Pacífico austral. Envolverde/IPS