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Terramérica - Chile diplomado em terremotos

A presidente Michelle Bachelet visitou, no dia 3 deste mês, um abrigo na comunidade de Camarones, uma das zonas mais afetadas pelo terremoto, a dois mil quilômetros de Santiago. Foto: Presidência do Chile

Santiago, Chile, 7 de abril de 2014 (Terramérica).- O Chile parece ter aprendido algumas lições com o terremoto e tsunami de 2010, e as aplicou com êxito na noite de dia 1º deste mês, quando outro tremor sacudiu o extremo norte do país. Com medo pelo movimento mais forte dos últimos anos, os afetados saíram para os morros, separados por não mais do que dois quilômetros do Oceano Pacífico, depois do alerta de tsunami lançado pelo Serviço Hidrográfico e Oceanográfico da Marinha.

Apesar do temor, quase um milhão de pessoas realizaram com êxito e eficácia a evacuação, e os seis mortos registrados tiveram como causa ataques cardíacos ou soterramento. O terremoto de magnitude 8,2 aconteceu às 23h46 (hora local) e foi o mais forte de uma série de tremores ocorridos no norte desde 1º de janeiro. “Estávamos em nosso apartamento, no terceiro andar de um prédio. Nos abraçamos, eu meu esposo e nossa filha. Logo as janelas foram arrebentadas e começou a cair vidro em nossas costas. Foi terrível” contou ao Terramérica uma moradora de Iquique, ao norte, já instalada em uma área alta e distante da costa.

“Aprendemos muito, e muitos dos elementos que não funcionaram corretamente em 2010 agora foram perfeitos”, afirmou ao Terramérica o diretor do Centro Sismológico Nacional, Sergio Barrientos. Há quatro anos, “houve um colapso do sistema de monitoramento sismológico e pudemos entregar informação sobre o terremoto somente cerca de duas horas depois”, explicou. “Agora, apesar de se tratar de um terremoto bem menor, pudemos entregar a informação necessária nos minutos seguintes após ocorrer”, acrescentou.

A presidente Michelle Bachelet sobrevoou as áreas mais afetadas, Iquique e Ariaca, 1.800 e dois mil quilômetros ao norte de Santiago, e constatou a situação. “Houve um processo de evacuação exemplar, de grande solidariedade, que permitiu que isso se transformasse em um processo sem maiores contratempos e permitiu proteger de um tsunami e de qualquer gravidade ligada ao terremoto”, destacou.

Para Bachelet, que tomou posse pela segunda vez no dia 11 de março, o tremor do dia 1º também foi uma prova de fogo. É que a mandatária concluiu seu primeiro mandato 12 dias depois do terremoto de magnitude 8,8 e do tsunami que em fevereiro de 2010 varreram tudo à sua passagem por vastas áreas do centro e sul do Chile. Naquela ocasião, os protocolos não funcionaram e um tardio alerta de tsunami foi a causa da morte de aproximadamente 500 pessoas, ao que se somou a destruição de mais de 200 mil casas.

Bachelet teve que enfrentar um processo judicial e vários de seus colaboradores da época ainda são investigados. Quatro anos depois, a presidente decretou oportunamente estado de catástrofe para as regiões afetadas e convocou as forças armadas e de segurança para cuidar da ordem pública. Antes, as sirenes haviam alertado a tempo para o risco de tsunami e milhares de pessoas começaram a se deslocar em tranquilidade.

Por trás dessas mudanças, há um forte investimento econômico e humano. Em 2012, o Centro Sismológico assinou um convênio com o Ministério do Interior para fortalecer a rede de sensores e estabelecer novas estações, bem como criar comunicações fortes. O investimento de quase US$ 7 milhões, ainda não completado, incluiu a instalação de dez novas estações de monitoramento, compra de equipamentos, tecnologia com satélite e capacitação para o pessoal do Escritório Nacional de Emergências e para o Centro Sismológico.

As estratégias de preparação e mitigação de desastres estão dando frutos não só no Chile, mas no restante da América Latina, segundo o escritório regional da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Em diferentes partes dessa região são comuns os terremotos, tsunamis, furacões e as erupções vulcânicas, que inevitavelmente se associam a condições de vulnerabilidade, como pobreza e insegurança.

No entanto, as populações locais hoje estão melhor preparadas, a cooperação regional é efetiva e os mecanismos de alerta e resposta são eficientes, segundo a Unesco. “A situação melhorou muito desde o tsunami de 27 de fevereiro de 2010 que afetou o Chile”, afirma a Unesco que, em aliança com as autoridades, se empenha em planos educacionais de preparação diante de tsunamis no Chile, Peru e Equador. No Chile o trabalho foi implantado em 144 escolas de áreas inundáveis, abaixo da cota de 30 metros.

“A educação da cidadania é fundamental nessas situações, principalmente em um país como o Chile, onde um tsunami pode ocorrer 15 ou 20 minutos depois do tremor e a análise de informação demora dez minutos”, explicou ao Terramérica o engenheiro hidráulico Rodrigo Cienfuegos, do Centro Nacional de Pesquisa para a Gestão Integrada de Desastres Naturais.

“A população tem que reagir de forma autônoma, estar consciente de para onde se dirigir imediatamente depois de um terremoto de características como as que tivemos no dia 1º”, acrescentou Cienfuegos, especialista em tsunamis. Um dos maiores desafios agora é ser “vítimas preparadas”: vencer os impactos posteriores, como a condição de abrigado e a falta de alimentos, água e luz. “A ideia é que, passada a emergência, as pessoas estejam melhor preparadas para viver esse período complexo”, ressaltou.

Segundo esse acadêmico da Universidade Católica, o Chile, um dos países mais propensos a terremotos do mundo e com mais de quatro mil quilômetros de costa, deve repensar o assentamento humano no futuro. Para ele, “é preciso conscientizar para a ameaça que significa viver tão perto da costa. É difícil afastar as pessoas que há anos vivem perto do mar, mas devem ser tomadas medidas quando se avalia as instalações de novos assentamentos”.

No momento, a população do norte deve se manter preparada, alertam especialistas em terremotos. Transcorreram 137 anos desde o último grande terremoto no norte do Chile e a energia acumulada nesses anos é maior do que a liberada no dia 1º. Envolverde/Terramérica.

* A autora é correspondente da IPS.

 

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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.