Cidade do México, México, 7 de abril de 2014 (Terramérica).- A América Latina não leva a sério o acordo para eliminar as emissões de mercúrio: o perigoso metal continua solto na exploração artesanal de ouro e de combustíveis fósseis, e é objeto de contrabando. A União Europeia proibiu a exportação de mercúrio em 2011, e os Estados Unidos o fizeram em 2013, o que fez disparar o comércio dentro da América Latina.
“As exportações do México triplicaram nos últimos anos. E ganham auge as atividades como a extração de ouro de eletrônicos reciclados”, disse ao Terramérica o especialista senegalês Ibrahima Sow, da Divisão de Mudança Climática e Químicos do Fundo para o Meio Ambiente Mundial (GEF).
Em outubro, 18 países da América Latina e do Caribe assinaram um acordo internacional para proibir a exploração de novas minas de mercúrio, pôr fim às atuais, controlar as emissões aéreas e regular a mineração artesanal de ouro, que utiliza esse perigoso metal. No mundo, 97 países assinaram o Convênio de Minamata sobre o Mercúrio, mas apenas um o ratificou, os Estados Unidos, por isso faltam 49 para entrar em vigor.
Minamata é a cidade japonesa que deu nome à doença causada por envenenamento com mercúrio. Na década de 1950, foi descoberta ali essa síndrome, com mais de cem mortos, e afetados que, com o passar das décadas, superaram os dois mil. Depois se soube que haviam ingerido pescado da baía, contaminado com mercúrio de uma indústria petroquímica. Esse metal é neurotóxico e cancerígeno.
Na América Latina é usado na mineração artesanal do ouro e em insumos hospitalares. A extração, o refino e transporte de hidrocarbonos para geração termoelétrica e a siderurgia, entre outras atividades, também liberam mercúrio. Além disso, em vários países é contrabandeado.
“É difícil quantificar a importação ilegal. Sabe-se que a mineração artesanal e de pequena escala utiliza mercúrio de contrabando, principalmente proveniente de Peru e Equador, mas não se conhece dados precisos”, explicou ao Terramérica o vice-ministro de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Colômbia, Pablo Vieira. Segundo as autoridades colombianas, o tráfico acontece através de suas áreas de selva e fronteiriças.
A organização não governamental Mercury Watch estima que as emissões latino-americanas superaram as 526 toneladas em 2010, e a Colômbia foi a líder, com 180 toneladas. Em uma avaliação publicada em 2013, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) calculou que as emanações de mercúrio por atividades humanas chegaram a 1.960 toneladas em 2010, com a mineração artesanal como fonte principal (727 toneladas), seguida pela queima de carvão no setor energético, industrial e doméstico (475 toneladas).
A América Latina contribuiu com 292 toneladas, das quais 245 corresponderam à América do Sul. A extração artesanal de ouro é praticada em pelo menos uma dúzia de países latino-americanos, principalmente na região andina e na bacia do rio Amazonas, mas também na América Central, segundo o Pnuma. Cerca de 500 mil mineradores artesanais do ouro impulsionam a demanda legal ou ilegal do mercúrio.
México e Peru têm minas de mercúrio, mas não há exploração primária formal na região. Trata-se de uma extração secundária, pois o mercúrio costuma estar misturado com outros minerais, ou de reciclagem do metal já extraído e usado com outros fins. Os maiores produtores são México, Argentina e Colômbia, enquanto os principais consumidores e importadores legais são Peru, Colômbia e Panamá.
Em 2012, México, Argentina e Colômbia encabeçaram a lista regional de exportadores de mercúrio e produtos onde esse metal está presente, segundo a Mercury Watch. O mercúrio se encontra em forma natural em certas rochas, e na água, no ar e nos solos devido às emanações industriais. Pela ação de bactérias e micro-organismos, se transforma em metilmercúrio, que se acumula nos órgãos de diferentes espécies animais, sobretudo nos peixes.
A abordagem legal é variada na região. No ano passado, a Colômbia aprovou uma lei que estipula a eliminação do mercúrio em cinco anos na mineração e em dez anos na indústria, entre outras medidas. No Peru, o parlamento debate desde novembro o projeto de lei 2795/2013-CR para eliminá-lo da mineração e substituí-lo em atividades industriais. Já as leis de mineração da Bolívia, Costa Rica e Honduras proíbem o mercúrio.
Dados do Pnuma indicam que havia 11 fábricas de cloro-álcali com tecnologia de baterias de mercúrio distribuídas em sete países da região em 2012. Várias delas planejam adotar tecnologias livres do metal até 2020. “O conteúdo de mercúrio nos produtos, a substituição, o armazenamento transitório, bem como sua disposição final são aspectos significativos da gestão do mercúrio”, detalhou ao Terramérica a subsecretária do Ministério de Habitação, Ordenamento Territorial e Meio Ambiente do Uruguai, Raquel Lejtreger.
O Uruguai importa produtos com mercúrio e em seu território funciona uma fábrica de cloro-sosa, cuja transformação está decidida, mas exige financiamento. O GEF emprestou financiamento para este e outros sete países da região, tanto para a negociação do Convênio como para a adoção de novas tecnologias e alternativas ao perigoso mercúrio. Mas falta muito. Envolverde/Terramérica.
* O autor é correspondente da IPS.
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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.