Por Thalif Deen, da IPS –
Nações Unidas, 13/1/2016 – Este pode ser um ano histórico para as mulheres terem acesso aos principais cargos de poder na Organização das Nações Unidas (ONU) e também nos Estados Unidos. “O empoderamento das mulheres é real. É um momento extraordinário, no qual são mulheres os principais candidatos às próximas eleições presidenciais nos Estados Unidos e à secretaria geral da ONU”, destacou o secretário-geral adjunto da ONU, Jan Eliasson.
“Será histórico e mudará as regras do jogo, caso ocorra, porque seria a primeira vez desde a criação da ONU e dos Estados Unidos”, afirmou à IPS a subsecretária-geral das Nações Unidas, Lakshmi Puri. Primeiro, imagine o simbolismo: o presidente e comandante-chefe dos Estados Unidos, o país mais poderoso e com a maior economia do mundo, e constante defensor e líder mundial em matéria de igualdade de gênero e de direitos das mulheres… ser uma mulher”, destacou.
“Do mesmo modo, imagine o simbolismo de a ONU – o governo mundial, pacificador e construtor da paz, fixador de normas e defensor dos direitos humanos, incluídos os das mulheres e meninas, e do desenvolvimento sustentável e da ação climática, líder em ação humanitária… ser dirigida por uma mulher”, apontou Puri, que também é diretora-executiva adjunta da ONU Mulheres. Seria um sinal, não só para o governo e o povo dos Estados Unidos, mas também para os sistemas políticos patriarcais do mundo, o fato de terem de lidar com uma presidente norte-americana, acrescentou.
Na atual corrida pelas candidaturas para as próximas eleições presidenciais norte-americanas em novembro, há duas mulheres, a ex-secretária de Estado Hillary Clinton, do Partido Democrata, e Carly Fiorina, ex-diretora adjunta da empresa Hewlett Packard, pelo Partido Republicano. No geral, especula-se que Hillary será eleita a candidata presidencial de seu partido na convenção democrata de 25 de julho.
Na ONU existe uma intensa campanha para que uma mulher seja eleita para o cargo de secretário-geral pela primeira vez nos 70 anos de história do fórum mundial. A lista de possíveis candidatas inclui Michelle Bachelet, atual presidente do Chile e ex-diretora executiva da ONU Mulheres, Irina Bokova, da Bulgária e diretora-geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Helen Clark, ex-primeira-ministra da Nova Zelândia e atual administradora do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, e Kristalina Georgieva, também da Bulgária, uma das vice-presidentes da Comissão Europeia.
As búlgaras estão na primeira fila porque, segundo o sistema de rotação geográfica, o cargo de secretário-geral agora deverá ser ocupado por alguém da Europa oriental. O atual secretário-geral, Ban Ki-moon, cujo mandato terminará em dezembro, disse em repetidas ocasiões que é hora de esse cargo ser ocupado por uma mulher. A pessoa que substituir Ban assumirá suas funções em janeiro de 2017.
Yasmeen Hassan, diretora da Igualdade Já, uma organização com sede em Nova York, disse à IPS que 2016 poderá ser um ano crucial para a participação política das mulheres. “Seria realista ver uma mulher líder da ONU, devido às muitas qualificadas de todo o mundo que poderiam ocupar o cargo de secretário-geral e a um processo de seleção mais transparente, que nós e nossos sócios defendemos”, afirmou.
Para Hassan, uma mulher à frente da ONU poderia contribuir em grande medida para a consecução da paz e segurança mundiais, e transformar as atitudes, os comportamentos, as normas sociais, e como são valorizadas e tratadas as mulheres e meninas em todo o mundo. “Isso ajudaria ainda mais a romper os telhados de vidro para as mulheres, enquanto as meninas também poderão ver que não há limites para o cargo que possam aspirar. Uma presidente norte-americana também é uma possibilidade forte e que enviaria uma mensagem muito importante”, ressaltou.
Shannon Kowalski, da International Women’s Health Coalition, apontou que 2016 poderá ser histórico para as mulheres e meninas, mas somente se os países cumprirem os compromissos assumidos na Agenda 2030 e na Plataforma de Ação de Pequim, o acordo adotado em 1995 para tornar efetivos os direitos das mulheres. “Ainda há muito para percorrermos”, enfatizou. Mavic Cabrera-Balleza, coordenadora internacional da Rede Global de Mulheres Construtoras da Paz, expressou suas dúvidas a respeito. “É hora de separar os fatos das falsidades”, afirmou.
Ban Ki-moon garante que designou um número sem precedentes de mulheres na ONU, mas, em um artigo de dezembro de 2015, Karin Landgren, pesquisadora do Centro sobre a Cooperação Internacional, pontuou que as escolhas do ano passado para o nível mais alto de cargos dentro das Nações Unidas foram em 92% de sexo masculino. Entre 1º de janeiro e 10 de dezembro de 2015, foram designados 22 homens e apenas duas mulheres como subsecretários-gerais da ONU.
Por outro lado, o artigo de Landgren diz que em 2015 seis subsecretárias foram substituídas por homens, o que afeta ainda mais o objetivo de gerar uma liderança feminina dentro das Nações Unidas. “Com esse tipo de declarações dos atuais dirigentes, que são predominantemente homens, me aterei ao velho ditado ‘ver para crer’”, afirmou Cabrera-Balleza. Também é lamentável que uma mulher presidente ainda seja uma novidade nos Estados Unidos, destacou. A absoluta necessidade de liderança e participação das mulheres na tomada de decisões já é um fato e não uma novidade em muitos países, acrescentou.
A resolução 211 do Conselho de Segurança da ONU insiste na liderança e participação das mulheres na tomada de decisões, bem como na proteção dos direitos humanos das mulheres como elementos essenciais da paz e da segurança internacionais. “Esses estão na base de toda sociedade civilizada e nas democracias que funcionam. São requisitos para o desenvolvimento sustentável e um requisito nas operações humanitárias que prosperam”, opinou Cabrera-Balleza.
“Ter uma secretária-geral na ONU deveria ter ocorrido há décadas e não depois de 70 anos. Porém, gostaria de destacar que deveria ser uma mulher adequada. Alguém que não esteja em dívida com os grandes contribuintes de campanha, com os partidos políticos ou os membros permanentes do Conselho de Segurança. Alguém profundamente conectada com a sociedade civil e que só esteja em dívida com as pessoas, com os 99% aos quais se supõe que deva servir”, concluiu Cabrera-Balleza. Envolverde/IPS