por Lyndal Rowlands, da IPS –
Nações Unidas, 30/5/2016 – O mundo está perto de contar com vacinas contra a malária e a dengue, e, no entanto, muitas das que já existem não chegam às pessoas que mais necessitam delas. O último foco de febre amarela em Angola revela a virulência com que voltam doenças infecciosas quando não se cumpre totalmente os programas de vacinação.
Na semana passada, a diretora da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margaret Chan, apontou que o foco dessa doença mortal ocorreu apesar de a vacina estar disponível há quase 80 anos. “O mundo conta com uma vacina efetiva, segura e de baixo custo que oferece proteção para toda a vida contra a febre amarela desde 1937. Deve ser usada de forma generalizada para proteger as populações de países onde a enfermidade é endêmica”, afirmou Chan.
Lamentavelmente, a febre amarela é uma das muitas doenças que persistem, apesar de ser possível sua prevenção mediante a imunização, e que volta de tempos em tempos. No momento, apenas uma das vacinas existentes, a que protege contra a varíola, conseguiu o objetivo de erradicar completamente a enfermidade.
No ano passado, o mundo esteve muito próximo de eliminar outra doença por meio da imunização, quando a Nigéria se converteu no único país da África a erradicar a poliomielite. “Estamos na fase final de poliomielite e esperamos ver em breve sua erradicação nos últimos dois países que a têm, Afeganistão e Paquistão”, afirmou Jean-Marie Okwo-Bele, diretor do Departamento de Imunização, Vacinas e Substâncias Biológicas da OMS.
Em abril, teve início um novo plano ambicioso para adotar uma nova vacina contra a pólio. A mudança ocorreu porque não era mais necessário lutar contra o poliovírus tipo 2, não detectado desde 1999, explicou Okwo-Bele. Porém, o mundo deve ser tão bom eliminando vacinas velhas como o é encontrando novas, disse à IPS. “O fornecimento de vacinas é tão grande agora que devemos melhorar a utilização das que estão disponíveis para podermos nos desfazer delas”, explicou.
“Só no ano passado pudemos trabalhar e quase garantir a disponibilidade das vacinas contra dengue, malária e quase temos uma contra o ebola”, destacou Okwo-Bele. Ainda pode faltar cinco ou sete anos para a vacina contra a tuberculose, mas ela pode ser uma ferramenta importante para lutar contra a resistência aos antibióticos, pontuou.
As últimas e prometidas incorporações à lista de vacinas geram esperança, mas alguns países em desenvolvimento temem que seu elevado custo, especialmente das novas, deixe suas crianças à margem dos avanços. O inconstante e reservado mercado das vacinas, dominado por uma série de grandes companhias farmacêuticas, fez com que no ano passado muitos países em desenvolvimento pedissem à OMS ajuda para atravessar o processo de compras.
“Eles tiveram uma verdadeira frustração por não receberem nenhuma assistência real para se beneficiarem das novas vacinas e oferecer esses benefícios às suas crianças”, observou Kate Elder, assessora em políticas de vacinas da Campanha de Acesso a Medicamentos, da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF).
Uma forma como a OMS atende esse problema é criando uma base de dados com os preços que os governos pagam pelas vacinas. Okwo-Bele ressaltou à IPS que países sem “poder de negociação” pagam preços “muito maiores” pelas vacinas do que outros. Por exemplo, é sabido que países da África austral pagam um preço muito mais elevado pelas vacinas do que outros com renda maior.
Felizmente nem todos os países em desenvolvimento têm que se valer por si mesmos. As nações mais pobres têm acesso a preços muito menores graças à negociação coletiva de organizações como a Aliança Mundial para Vacinas e Imunização (Gavi), integrada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a Fundação Gates.
Mas, segundo o Unicef, as crianças com maiores probabilidades de não serem vacinadas são as que vivem em países afetados por conflitos armados. “Quase dois terços das meninas e dos meninos que não foram imunizados com as vacinas básicas vivem em países afetados total ou parcialmente por conflitos”, disse essa agência da ONU na Semana Mundial da Imunização, que aconteceu na última semana de abril.
Elder afirmou que os governos e as organizações que aplicam vacinas em nações com conflitos só podem ter acesso a preços menores desse medicamento por intermédio da Gavi, se também figurarem entre os Países Menos Adiantados. Então o Iêmen, que está neste grupo de países, pode aspirar por vacinas mais baratas, mas a Síria não.
“É senso comum que as organizações humanitárias devem ter acesso aos preços globais menores, mas, lamentavelmente, não tem sido a fórmula empregada até agora”, explicou Elder à IPS. “Em uma emergência humanitária, uma das primeiras coisas que se faz em um acampamento é vacinar contra o sarampo, porque se surge um foco é muito, muito perigoso”, afirmou.
Segundo Elder, existem disposições para que as organizações humanitárias paguem um preço menor pelas vacinas contra o sarampo, mas não ocorre o mesmo para a relativamente nova e mais cara vacina contra o pneumococo. “Estamos de acordo em que fixar o preço com base apenas no produto interno bruto (PIB) é um indicador artificial”, acrescentou.
Mas, concordamos em levar em conta a capacidade de pagamento, informou o Unicef em uma declaração à IPS. “O trabalho do Unicef de incidir nos mercados para conseguir um estado saudável se trata de influir nos preços justos e acessíveis”, acrescentou a agência. Esse enfoque contribuiu para baixar os preços de algumas vacinas, tanto para países classificados pela Gavi, como para os que não são atendidos por ela.
Okwo-Bele enfatizou que as vacinas devem ser consideradas um investimento importante independente do contexto. “Tem a ver com o princípio básico de que mais vale prevenir do que remediar, e a prevenção é mais barata do que a cura, e isso vale em qualquer lugar, seja um país rico ou em desenvolvimento”, ressaltou. Envolverde/IPS