Por Jaime Gesisky e Clarissa Presotti –
A manobra de um grupo de deputados ligados ao agronegócio e à indústria para tentar aprovar na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara o substitutivo do deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), que cria o licenciamento ‘flex’ no país, sofreu hoje mais um revés.
A votação do substitutivo não aconteceu devido ao esforço de última hora do governo e de deputados aliados ao meio ambiente, que pediram a obstrução.
Pelo menos dez deputados votaram pela retirada de pauta, entre parlamentares do PSOL, Rede, PMDB, PSDB e PT.
Segundo o deputado Nilto Tatto (PT-SP), o texto flexibiliza de tal forma o licenciamento e dá tanta autonomia aos estados para fazerem como bem entenderem, que a Câmara pode estar criando “uma fábrica de Marianas”.
A sessão foi encerrada por falta de quórum.
O texto do relator Mauro Pereira defende a flexibilização de regras do licenciamento ambiental, além de retirar a necessidade da autorização em casos específicos.
Os estados e municípios poderiam, por exemplo, definir quais empreendimentos estarão sujeitos ao licenciamento, de acordo com os critérios de natureza, porte e potencial poluidor, e em qual modalidade (licenciamento ordinário, em três etapas, simplificado ou isenção do processo).
O agronegócio estaria dispensado do licenciamento e os prazos para análise de licença pelos órgãos ambientais seriam reduzidos.
Eis porque este é o texto dos sonhos dos deputados apoiados pelo agronegócio e setores da indústria.
Para o deputado Edimilson Rodrigues (PSOL-PA), que liderou a obstrução da votação, a sociedade não foi chamada para debater esse novo parecer.
Ao contrário do que vinha ocorrendo com a proposta apoiada pelo ministério do Meio Ambiente, elaborada a partir de um projeto que também já estava em tramitação na Câmara, porém, de autoria do deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP).
“Foi uma surpresa para todos os setores da sociedade que vinham discutindo uma proposta mais ampla, que simplificasse o licenciamento, mas que garantisse as salvaguardas ambientais e sociais, evitando judicializações”, disse Tripoli ao WWF-Brasil.
O texto do deputado paulista aglutina diversas propostas de lei para o licenciamento em tramitação no Congresso.
Mas seu principal mérito é dialogar com um espectro mais amplo da sociedade.
Foram várias audiências públicas, inclusive com a participação de representantes da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Confederação Nacional da Indústria (CNA), Ministério Público, ONGs.
Reações
O projeto do relator Mauro Pereira, veio à tona depois de um possível aval positivo da Casa Civil da Presidência da República na semana passada, conforme divulgou na última sexta-feira (9) o Observatório do Clima.
A reações vieram logo em seguida.
A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) foi a primeira a se manifestar. Repudiou, por meio de uma nota, a inclusão do projeto de lei na pauta de votação “sem que a sociedade tenha tido a chance de opinar em tema tão complexo, que envolve interesses difusos.”
O projeto, diz a nota, “sofre ampla resistência pelo seu conteúdo inconstitucional, está cheio de equívocos técnicos e jurídicos” e tramitou por meio do açodamento e exclusão da sociedade brasileira de seu debate”.
Ontem foi a vez de um grupo de cerca de 250 organizações da sociedade se civil – entre elas o WWF-Brasil – se manifestar publicamente.
A nota de repúdio alerta que “a eventual aprovação da proposta sem debate público geraria inúmeras consequências negativas, como o aumento de risco de ocorrência de desastres socioambientais, a exemplo do rompimento da barragem de rejeitos em Mariana (MG).”
Segundo a nota, o projeto do deputado Pereira também reflete “a ausência de prevenção, mitigação e compensação de impactos decorrentes de empreendimentos, a violação de direitos das populações atingidas, a ampliação dos conflitos sociais e socioambientais e a insegurança jurídica aos empreendedores e ao Poder Público”.
No início da tarde de ontem, o jornalista André Trigueiro informou em seu perfil no Facebook que o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho (PV-MA), enviou uma carta ao chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB-RS), pedindo que o projeto do licenciamento ‘flex’ fosse retirado da pauta da Comissão de Finanças na sessão de hoje.
A Casa Civil não se manifestou publicamente até o momento.
Enquanto isso, a bancada ruralista já se articula.
Os deputados ligados ao setor rural querem retomar a votação do projeto para a próxima quarta-feira (21).
O deputado Luis Carlos Heinze (PP/RS), um dos principais integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), adiantou ao WWF-Brasil que tentará conseguir votos e aprovar o licenciamento ‘flex’. (WWF Brasil)
* Publicado originalmente no site WWF Brasil.