Por Jewel Fraser, da IPS –
Porto Espanha, Trinidad e Tobago, 20/2/2017 – Os países da Comunidade do Caribe (Caricom) encontram cada vez mais dificuldades para entrar nos mercados dos Estados Unidos e da União Europeia (UE) com suas exportações de alimentos. As tarifas já não são os principais obstáculos para o acesso a esses mercados, segundo um documento do programa Superação de Obstáculos Técnicos ao Comércio, aplicado em conjunto pelo Grupo de Estados da África, do Caribe e do Pacífico (ACP) e a UE.
A aliança ACP-UE considera que “os obstáculos não tarifários se converterão no principal desafio do futuro sistema comercial multilateral”. Especificamente, se refere aos obstáculos técnicos relacionados com o cumprimento das normas sanitárias e fitossanitárias nos mercados de exportação e também de outras disposições, incluídas as relacionadas com a rotulagem e embalagem dos produtos.
A UE considera que, para seus sócios da ACP, tais obstáculos técnicos e não alfandegários são tão problemáticos que aportou 15 milhões de euros, a partir de 2013, para ajudar esses países em desenvolvimento a melhorarem seus processos e poder cumpri-los. A Associação Caribenha de Agronegócios (Caba) teve acesso a fundos para ajudar seus membros a avançarem na certificação de Análises de Riscos e Pontos Críticos de Controle (HACCP), um passo que Estados Unidos e União Europeia exigem desde o começo deste século para todos os alimentos que entram em seus mercados
Dez dos membros da Caba estiveram presentes em uma conferência regional, realizada em Porto Espanha em janeiro, para informar sobre os benefícios que receberam do treinamento na certificação HACCP. Andre Gordon, diretor executivo da empresa TSL Technical Services Limited, disse aos delegados presentes na capital de Trinidad e Tobago que anualmente a Grã-Bretanha registra cerca de um milhão de pessoas que contraem doenças transmitidas pelos alimentos, das quais 500 morrem e cerca de 20 mil exigem hospitalização.
Lidar com essa situação custa a esse país US$ 1,75 bilhão por ano, afirmou Gordon, acrescentando que nos Estados Unidos são registrados aproximadamente 48 milhões de casos de enfermidades transmitidas por alimentos, o que resulta em 128 mil internações e três mil mortes. O custo chega a, aproximadamente, US$ 77,7 bilhões anuais.
Um informe de 2016 intitulado Combatendo as perdas de alimentos por descumprimento dos requisitos de qualidade e segurança nos mercados de exportação: o caso de frutas e hortaliças da região da América Latina e do Caribe, redigido por dois especialistas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), destaca tudo o que está em jogo para os exportadores caribenhos.
Segundo o documento, América Latina e Caribe fornecem mais de 90% das frutas e quase 80% das verduras importadas pelos Estados Unidos. Porém, alguns países da região têm “taxas de rejeição muito altas”, como Bolívia, República Dominicana e Jamaica. “Embora muitos países da América Latina e do Caribe tenham um bom índice de aceitação em comparação com outros que exportam para os Estados Unidos e a UE, alguns apresentam um desempenho muito ruim, o que revela uma grande disparidade na preparação para o comércio de exportação dentro da região”, ressalta o documento.
Segundo o informe da FAO, “as inúmeras falhas na manipulação ao longo da cadeia são, provavelmente, a causa das queixas dos compradores internacionais”. Gordon – que no começo deste século supervisionou a transformação da indústria jamaicana de ackee (Blighia sapida) para que cumprisse as normas da Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos e tivesse acesso ao mercado desse país – explicou à IPS os obstáculos que os exportadores caribenhos devem vencer.
“O problema, em geral, com as empresas agroindustriais do Caribe é a falta de capacidade técnica e o desconhecimento dos requisitos, bem como falta de recursos para implantar os sistemas necessários”, afirmou Gordon. “A mudança cultural necessária provavelmente seja a maior limitação para aplicar e manter os sistemas de certificação. Se as empresas não têm a visão de se converterem em atores globais, então o esforço e os recursos necessários parecerão inalcançáveis e sem uma boa relação qualidade-preço”.
O informe As medidas sanitárias e fitossanitárias geram altos custos e perdas para os países em desenvolvimento, publicado em 2007, pouco depois de a UE ordenar a certificação HACCP para todos os que exportam para o bloco, aponta que, “como o nível de renda dos países em desenvolvimento é muito menor, o custo do cumprimento é relativamente superior ao dos exportadores dos países industrializados”.
E prossegue pontuando que “a rápida mudança nas medidas sanitárias e fitossanitárias, os regulamentos e as notificações de novas regulamentações é outro problema enfrentado pelos países em desenvolvimento ao prepararem seu cumprimento. Também impõe custos adicionais aos investidores e exportadores e cria incertezas”. No entanto, concluiu Mehdi Shafaeddin, autor desse documento, “embora o custo do cumprimento seja alto, o custo do não cumprimento é ainda maior”, devido à perda de cota de mercado ou à redução do acesso.
Gordon revelou que, em 2010, o Caribe foi a segunda região com maior número de rejeições de alimentos nos portos de entrada dos Estados Unidos. Um informe da FAO, de março de 2016, revela outros problemas que as agroindústrias caribenhas enfrentam na hora de exportar.
A diversificação e a competitividade da agricultura do Caribe sofrem “a pequenez e a fragmentação da maioria das unidades agrícolas, ausência de fortes organizações agrícolas de base, custo da mão de obra agrícola, envelhecimento demográfico dos agricultores, um sistema educacional que não prepara os jovens para buscar oportunidades de emprego no setor agrícola”, alerta a FAO.
O presidente da Caba, Vassel Stewart, afirmou que o problema das pequenas unidades agrícolas está sendo abordado plenamente com a formação da Cabexco, uma organização que reúne as pequenas e médias empresas do setor agroindustrial do Caricom para adquirir de forma conjunta matérias-primas e serviços, e comercializar os produtos de seus sócios. E enfatizou que as economias de escala resultantes também permitirão que seja mais fácil suportar o custo do cumprimento das normas impostas por Estados Unidos e União Europeia aos exportadores de alimentos. Envolverde/IPS