Por Ini Ekott, da IPS –
Lagos, Nigéria, 5/8/2015 – A Nigéria acaba de encomendar a um comitê de especialistas a definição dos objetivos e compromissos que incluirá em suas contribuições previstas e determinadas em nível nacional (INDC) em matéria de mudança climática. E embora pareça não ter pressa em divulgar sua proposta para a cúpula climática de Paris, essa decisão diferencia este país de Gabão, Marrocos, Etiópia e Quênia, as outras únicas nações africanas que ainda não apresentaram suas contribuições.
As INDC são as ações climáticas posteriores a 2020 que os países assumirão sob o novo tratado universal que deve ser alcançado na capital francesa, onde, do dia 30 de novembro a 11 de dezembro, acontecerá a 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática. O rascunho deverá ser apresentado à Organização das Nações Unidas (ONU) em setembro, no máximo.
Antes dessa data, a Nigéria afirma que seu objetivo está claro: fazer com que suas projeções de redução de emissões de gases-estufa posteriores a 2020 acompanhem suas peculiaridades de desenvolvimento, segundo Samuel Adejuwon, subdiretor do Departamento de Mudança Climática no Ministério Federal de Ambiente. Esse país é o quarto maior emissor de dióxido de carbono na África e, sem dúvida, já enfrenta o flagelo da mudança climática.
Desde o norte, o avanço do Saara está dando força à sangrenta insurgência do grupo armado extremista Boko Haram, bem como a um conflito pelos recursos entre agricultores e pecuaristas e pastores em sua região central. Além isso, o nível do oceano sobe causando inundações que afetam o sul.
Em um informe divulgado em outubro de 2014, a empresa de análises globais Maplecroft assinala que Nigéria, Bangladesh, Etiópia, Índia e Filipinas são os países que atualmente correm maior risco de experimentar conflitos promovidos pela mudança climática. As esperanças do país de reduzir suas emissões contaminantes no contexto de suas INDC devem superar vários obstáculos.
Um deles é que, por ser uma economia que depende unicamente do petróleo (que representa uma grande parte de seu produto interno bruto de US$ 500 bilhões, o maior da África), o compromisso que levar a Paris refletirá até que ponto se desfazer dos combustíveis fósseis não pode ser uma prioridade urgente, e porque fazê-lo consumirá tempo e recursos significativos.
Outra prova de fogo para a Nigéria é a escassez de energia. O país produz cerca de quatro mil megawatts para cada 170 milhões de habitantes, deixando boa parte da população em forte relação de dependência com a lenha, o carvão vegetal e os resíduos para atender necessidades domésticas básicas como cozinhar, aquecer, iluminar.
No ano passado, os nigerianos utilizaram pelo menos 12 milhões de litros de diesel e gasolina por dia para fazer funcionar geradores elétricos, segundo o ex-ministro de Energia Chinedu Nebo. O consumo diário de gasolina no país, incluindo os automóveis, é de aproximadamente 40 milhões de litros, segundo a estatal Corporação Nacional Nigeriana do Petróleo.
Reduzir o grau de contaminação causada por esse consumo exigirá grandes investimentos em energia renovável e mais limpa, opinou o professor Olukayode Oladipo, especialista em mudança climática e um dos três consultados pelo governo para elaborar as INDC. O ex-ministro das Finanças, Ngozi Okonjo-Iweala, em 2014 declarou que o país precisava de US$ 14 bilhões anuais de investimentos em energia e infraestrutura vinculada a ela.
Para Oladipo, a chave da questão está em equilibrar um futuro de menos emissões de gases-estufa com as realidades imediatas em matéria de desenvolvimento. “Cada país explora como usar menos energia de um modo eficiente, como depender de fontes renováveis”, apontou. A Nigéria avalia como fazer para que, mesmo consumindo menos energia, sua economia continue crescendo no mesmo ritmo, explicou.
“Não há dúvidas de que o potencial está ali. A tecnologia limpa do carvão pode nos dar boa eletricidade e uma contaminação mínima, ao mesmo tempo”, ressaltou o especialista. Oladipo também enfatizou que, além do combustível, os planos climáticos da Nigéria se centrarão na agricultura, em parte para uma diversificação em relação ao petróleo e também como resposta ao crescente conflito pelos recursos. “Não estamos dizendo que a mudança climática seja o único fator determinante da crise, mas no mínimo aumenta o grau e a frequência com que ocorrem esses conflitos”, afirmou.
Além das atividades do Boko Haram no norte, responsável por pelo menos 20 mil mortes, nos últimos anos, os enfrentamentos entre pastores e pecuaristas contra agricultores pela terra mataram outros milhares na região central do país. No último ataque, em maio deste ano, pastores da tribo fulani mataram pelo menos 96 pessoas no central Estado de Benue, segundo o jornal nigeriano Punch.
O governo concorda que a mudança climática é uma das causas dos frequentes derramamentos de sangue, junto com fatores como a urbanização, mas não faz muito para abordar o problema.
Oladipo acredita que o novo presidente do país, Muhammadu Buhari, tomará mais medidas para enfrentar as derivações fundamentais do aquecimento global. Em seu discurso de posse, no dia 29 de maio, Buhari se comprometeu a ser “um ator mais enérgico e construtivo na luta mundial contra a mudança climática”.
Porém, de acordo com Nnimmo Bassey, da Fundação pela Saúde da Mãe Terra, as propostas apresentadas pela Nigéria, em particular, e pela África, em geral, a duras penas poderão ser conseguidas se os países industrializados – que também são os maiores contaminadores – não fizerem mais do que cumprir seus próprios compromissos e reduzir suas emissões. Oladipo afirmou que pedir urgência de ação a essas nações, incluindo os Estados Unidos, será um elemento-chave das INDC nigerianas e africanas. Envolverde/IPS