Os operários paquistaneses “podem sobreviver nas piores condições possíveis de trabalho e suportar o calor extremo”, segundo Zahid Mahmood, diretor-geral da Material Lab, uma empresa líder em testes de materiais em Dubai.
Por Irfan Ahmed, da IPS –
Dubai, Emirados Árabes Unidos, 27/9/2016 – Na zona industrial Al Quoz, em Dubai, um dos Emirados Árabes Unidos (EAU), ônibus levam operários imigrantes até seus afastados locais de trabalho, bem cedo pela manhã. À tarde, ou mesmo altas horas da noite, os trabalhadores voltam aos seus acampamentos pelos mesmos meios. Os operários mal têm tempo para descansar antes da próxima jornada de trabalho. Até oito pessoas chegam a dividir quartos pequenos e sujos.
Com seus pertences entulhados pelos cantos, quase não têm espaço para se mover, e são vulneráveis a infecções, que transmitem uns aos outros. Seus dias começam muito cedo, já que precisam cozinhar os alimentos que levarão para o lugar onde trabalham, e termina tarde, por causa das longas viagens e dos frequentes engarrafamentos no trânsito.
Nos acampamentos convivem trabalhadores de diferentes países, e a prática habitual é destinar-lhes quartos compartilhados segundo suas nacionalidades, que, em geral, são Bangladesh, Índia, Nepal ou Paquistão. O paquistanês Javed Iqbal, de 29 anos, chegou a Dubai por um intermediário que lhe vendeu um visto de trabalho por cerca de US$ 3 mil, e foi necessário sua família pedir empréstimo a outros familiares para fazer esse pagamento.
Como só cursou até o quarto ano, Javed é analfabeto e não pôde encontrar um trabalho em seu país de origem. A única opção que tinha era chegar a Dubai, onde está preso a um trabalho na construção que paga apenas US$ 240 por mês, o que não basta para cobrir seus gastos pessoais e, também, enviar algo para sua família. Ao mesmo tempo, está sob a imensa pressão de devolver o empréstimo que lhe permitiu comprar o visto.
Milhares de paquistaneses como ele acreditam nos contos de fadas que ouvem sobre as perspectivas de crescimento profissional nos Emirados, mas ali espera por eles um pesadelo trabalhista. Em sua maioria, esses operários não são especializados e estão empregados na construção, que não está funcionando bem nos países do Golfo, rico em petróleo. Como seus preços no mercado mundial caíram, os governos têm dificuldades para pagar as construtoras.
“Me inspirou a história de uma pessoa do povoado que foi a Dubai como pedreiro há três décadas. Agora é dono de duas casas e vários hectares de terra”, contou à IPS Muhammad Iqbal, trabalhador migrante da região paquistanesa de Gujranwala. Todos em seu povoado querem seguir seu exemplo, independente da situação existente no Golfo, acrescentou.
O Paquistão depende em grande parte das remessas de dinheiro, que representam 6,9% do produto interno bruto do país, de acordo com o Banco Mundial. Mais da metade dessa quantia procede da Arábia Saudita e de Dubai. Nos Emirados há aproximadamente 1,3 milhões de trabalhadores paquistaneses e cerca de 4,3 milhões na Arábia Saudita.
No último ano fiscal, o país recebeu US$ 19,9 bilhões em remessas, mas em julho estas caíram 20% em relação ao mesmo mês de 2015. Acredita-se que as demissões e a falta de pagamento de salários aos trabalhadores migrantes na região do Golfo sejam a causa dessa redução. Alguns temem que haverá mais notícias ruins devido à perda de empregos no setor da construção.
Entretanto, para Ashraf Mehmood Wathra, governador do Banco Central do Paquistão, trata-se de um fenômeno passageiro e as coisas melhorarão na medida em que esses países adaptarem suas políticas econômicas para compensar o impacto da queda dos preços do petróleo. A mão de obra imigrante paquistanesa na região do Golfo não é diversificada e se limita principalmente a um ou dois setores.
O governo do Paquistão ignorou durante muito tempo esse aspecto e deixou à mercê do setor privado as tendências internacionais de migração trabalhista. Nos últimos tempos, após a demissão de aproximadamente nove mil trabalhadores paquistaneses por empresas construtoras na Arábia Saudita, existe a consciência de que depender desse setor não será uma aposta segura no futuro.
Os operários paquistaneses “podem sobreviver nas piores condições possíveis de trabalho e suportar o calor extremo”, segundo Zahid Mahmood, diretor-geral da Material Lab, uma empresa líder em testes de materiais em Dubai. Os trabalhadores pastuns, da parte noroeste do país, são muito solicitados pela mesma razão. Mas isso tem um lado negativo, já que pouco se faz para garantir sua entrada em outros setores trabalhistas, ressaltou.
Esses operários chegam a receber apenas US$ 210 por mês, embora os que são pedreiros, carpinteiros, supervisores, soldadores e outros trabalhadores especializados possam ganhar mais. Mahmood pontuou que há poucos paquistaneses no setor de serviços, dominado pelos indianos devido ao seu melhor nível educacional e de treinamento. Há poucos paquistaneses guardas de segurança ou no setor de turismo, embora exista grande demanda nessas áreas.
O Paquistão terá que idealizar uma estratégia de desenvolvimento de recursos humanos adequada para permanecer no mercado profissional altamente competitivo e volátil da região do Golfo, opinou Mahmood. Ele também se preocupa com os baixos salários pagos aos trabalhadores paquistaneses e diz que deveriam ser feitas gestões para estabelecer um salário mínimo, por exemplo, de US$ 300 mensais.
“O papel do Estado se torna importante aqui porque os trabalhadores migrantes no Golfo não têm voz. Sem direito de associação nem de reclamar seus direitos, são tão indefesos quanto se pode imaginar”, denunciou Khalid Mahmood, da Fundação para a Educação do Trabalho, com sede em Lahore.
Dilip Ratha, economista do Banco Mundial, diz que o auge da construção no Golfo, financiada pelo dinheiro do petróleo, terminou e agora há menos necessidade de mão de obra imigrante. Essas economias também tentam gerar um espaço para empregar seus próprios cidadãos, algo que vai reduzir ainda mais o mercado de trabalho para os estrangeiros, acrescentou. Envolverde/IPS