Por Tharanga Yakupitiyage, da IPS –
Nações Unidas, 30/1/2017 – A aproximação do décimo aniversário da Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas motivou diferentes ativistas a analisarem os problemas que ainda afetam essas comunidades. A Declaração, aprovada em 13 de setembro de 2007, foi a primeira de seu tipo a reconhecer e destacar a importância dos direitos indígenas. A Declaração “contém o caráter coletivo dos direitos dos povos indígenas e tem por objetivo remediar injustiças históricas e atuais”, apontou Victoria Tauli Corpuz, relatora especial da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, durante uma entrevista coletiva realizada no dia 26.
Os relatores especiais são especialistas independentes designados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, e não são funcionários permanentes da organização.
Embora não seja juridicamente vinculante, a declaração garante aos grupos indígenas o direito à livre determinação, a terras e a viverem livres de qualquer tipo de discriminação. Porém, Corpuz disse que há “graves retrocessos” na implantação dos direitos indígenas, incluída a ameaça de indústrias mineradoras e extrativistas despojarem as comunidades de suas terras tribais.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nos últimos dias seu plano de autorizar os polêmicos oleodutos Dakota Acces (DAPL) e Keystone XL, projetos que foram suspensos por seu antecessor, Barack Obama, devido à preocupação pelas consequências que trariam para o ambiente e pela falta de consultas a grupos indígenas norte-americanos.
A situação em torno do DAPL chegou inclusive aos salões da ONU, o que levou Corpuz a pedir a Washington que, segundo seu compromisso de aplicar a Declaração, consultasse os grupos indígenas aos quais negou informações e que foram excluídos do processo de planejamento do projeto. “É lamentável que agora, apesar de as demandas ainda não estarem respondidas, esse tipo de decisão tenha que ser novamente consultada com os próprios indígenas porque, afinal, são eles os diretamente afetados”, destacou a relatora.
Embora o exército dos Estados Unidos tenham anunciado o início de um processo de Declaração de Impacto Ambiental sobre o projeto de US$ 3,8 bilhões, críticos afirmam que o Corpo de Engenheiros dessa força não avaliou adequadamente o potencial de vazamento do oleoduto nem suas consequências para o ambiente.
Segundo dados do governo norte-americano, os vazamentos em oleodutos são bem comuns, o que aumenta o risco de contaminação da água. Entre 2010 e 2013, houve dois mil casos de vazamento, que chegam à média de 1,6 por dia. A extração, o transporte e a queima do petróleo também aceleram as emissões de metano e carbono na atmosfera, contribuindo para o aquecimento global e a mudança climática.
“Não nos opomos à independência energética. Nos opomos a projetos de desenvolvimento imprudentes e politicamente motivados, com o DAPL, que ignoram nossos direitos nos tratados e colocam em risco nossa água”, respondeu o presidente da tribo sioux da reserva de Standing Rock, David Archambault II, à ordem do presidente Trump de continuar com a construção do oleoduto em seu território. “A criação de um segundo Flint não fará com que os Estados Unidos sejam grandes novamente”, acrescentou, se referindo à cidade de Michigan onde a água potável está contaminada com chumbo.
Erich Pica, presidente da organização ecologista Amigos da Terra, destacou que as decisões refletem o desprezo de Trump pelos “milhões de norte-americanos que lutaram para proteger do perigo dos oleodutos nossa terra, água, sítios culturais sagrados e o clima”.
Corpuz também criticou um projeto de lei do Estado de Dakota do Norte, que legalizaria o ato de atropelar por acidente manifestantes que bloqueiam estradas, como ocorre com os ativistas contrários ao DAPL. “Essa lei não é absolutamente coerente com o direito internacional dos direitos humanos. Como se pode justificar atropelar ou tratar violentamente um manifestante quando cada pessoa tem direito de protestar?”, questionou a relatora. Os povos indígenas simplesmente protegem seus direitos sobre a terra, acrescentou.
Corpuz também insistiu na necessidade de os países incorporarem a Declaração aos seus planos e às suas leis nacionais para garantir os direitos indígenas. “Minha mensagem é que os povos indígenas continuem afirmando e reivindicando seus direitos consagrados na Declaração da ONU, mas que também convoquem os Estados a cumprirem realmente sua obrigação” de aplicá-la, enfatizou. “O que temos de fazer agora é utilizar seriamente a celebração desse décimo aniversário da Declaração da ONU para fortalecer ainda mais o diálogo”, pontuou. Envolverde/IPS