por Sofia Jucon –
Especialistas em meio ambiente e sustentabilidade apresentaram as responsabilidades ambientais dos municípios e deram 25 dicas de como os administradores municipais podem agir visando ampliar e aproveitar melhor os indicadores que fazem uma cidade ser mais inteligente, resiliente e sustentável
As eleições municipais que definirão os gestores para 2021 chegaram. O Brasil possui cerca de 5.570 municípios. Por meio dos impostos e taxas que seus prefeitos recebem, eles custeiam obras, serviços e políticas essenciais para a qualidade de vida dos cidadãos e das cidades. Dentro do município, o apoio da câmara municipal, através dos vereadores, também é importante para a gestão da cidade. Ultimamente, no bojo das pautas que compõem a administração municipal, um tema vem ganhando cada vez mais importância junto à sociedade e merece atenção dos futuros gestores: a sustentabilidade. Por isso, faz-se importante um trabalho de orientação para uma eficiente gestão ambiental nos municípios, principalmente pelo caráter transversal que o meio ambiente apresenta e suas inter-relações com os diversos setores que compõem as cidades.
Foi com esse propósito que o Conselho Superior de Meio Ambiente (Cosema) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) promoveu, no dia 27 de outubro, uma live aberta da sua reunião extraordinária com base nessa temática visando apresentar as responsabilidades ambientais dos municípios, como os administradores municipais podem agir visando ampliar e aproveitar melhor os indicadores que fazem uma cidade ser mais inteligente, resiliente e sustentável, bem como entender de que forma os munícipes podem fazer a sua parte em prol da sustentabilidade.
Atualmente, 3,5 bilhões de pessoas vivem nas cidades. Previsões indicam que em 2030 quase 60% da população mundial viverá em áreas urbanas, o que aumentará a pressão sobre oferta de água potável, saneamento básico, conservação do meio ambiente e saúde pública. Com a pandemia da Covid-19 fica mais evidente a necessidade de tratativas para um ambiente mais saudável nas cidades e a participação dos cidadãos nesse processo.
Na abertura da live, Eduardo San Martin, presidente do Cosema, reiterou que a indústria faz parte da sociedade, portanto, o que for bom para a sociedade será bom para indústria, desta forma, o Cosema concede, às vésperas das eleições nos municípios, a oportunidade de discutir os temas cujas responsabilidades de enfrentamento de gestão são municipais. Com uma explanação sobre o arcabouço legislativo ambiental existente no estado de São Paulo em torno do ar, água, resíduos, licenciamento ambiental, entre outros, e seus avanços significativos, San Martin lembrou que, apesar disso, a velocidade de avanços nas questões que são de responsabilidades dos municípios não teve, em grande parte deles, os progressos correspondentes. “Essas questões representam problemas ambientais expressivos e que precisam ser conhecidas para, assim, serem enfrentadas e gerenciadas. É importante que os municípios deem atenção à temática ambiental”, pontua.
O executivo ressalta que muitos municípios avançaram criando setores dentro da sua administração voltados exclusivamente para enfrentar questões relativas ao meio ambiente, um exemplo é que não são poucos os municípios que criaram Secretarias Municipais de Meio Ambiente, implantaram departamentos, diretorias, setores, conselhos, assessorias e estruturas menores voltadas para a questão ambiental, mas, segundo San Martin, ainda persistem dois tipos de principais problemas nos municípios. “Um é que nem todos eles enxergam a estrutura ambiental estabelecida como algo voltado 100% aos interesses da sociedade. Não pode se prestar uma instituição ambiental seja o nível em qual ela estiver dentro do organograma municipal, para qualquer outra atividade que não seja o bem da sociedade e, além disso, é importante que as estruturas municipais conheçam aquilo que necessariamente está sob a sua responsabilidade legal. E é exatamente para que nós possamos prestar um serviço à sociedade, em especial às gestões municipais, que nós decidimos sob a diretriz da Fiesp pautar esse tema”, declarou.
Para tanto, San Martin destacou que foram convidados especialistas com maior experiência e conhecimento dentro da gestão ambiental de áreas municipais. São profissionais renomados ligados às áreas de consultoria, planejamento e direito ambiental: Maria Judith Marcondes Schmidt, consultora Ambiental; João Roberto Rodrigues, conselheiro do Cosema e consultor em Engenharia Ambiental; Ivan Maglio, consultor de Planejamento Ambiental; Carlos Silva Filho, presidente da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA); e Tiago Cintra Zarif, procurador de Justiça.
As apresentações ressaltaram as interfaces que a sustentabilidade mantém com o meio ambiente urbano e o quanto é importante para assegurar a qualidade de vida das pessoas e a saúde das cidades.
Foco no munícipe
Na primeira intervenção, Maria Judith ressaltou a importância da iniciativa da Fiesp em esclarecer, tentar ajudar a municipalidade, e, com isso, dar subsídio ao munícipe para que ele receba um serviço, pelo qual paga, de boa qualidade. A especialista elencou as seguintes orientações:
1 – TENHAM PROPOSTAS DE METAS AMBIENTAIS A SEREM CUMPRIDAS
Maria Judith comentou que manteve contato com diversos candidatos à prefeitura na região do Vale do Paraíba, onde reside, e para a gestão 2021-2024, nenhum apresentou propostas de metas ambientais a serem implementadas caso sejam eleitos. “Só ouvi um candidato a vereador dizer que tem meta ambiental a cumprir. Isso mostra que meio ambiente não é o ponto preferido dos prefeitos, mas eu me acostumei tanto a lidar com prefeitos que, para mim, a cada nova eleição é sempre um novo ciclo. É como se eu estivesse com uma nova turma de alunos, aprendi que a cada eleição você tem que começar tudo de novo, orientando os prefeitos, os assessores deles, muitas vezes na Câmara de Vereadores, quais são as funções deles relativas a meio ambiente”.
2 – EVITEM DOAR TERRENOS SEM INFRAESTRUTURA
A especialista comenta ser muito comum prefeitos que querem doar terrenos, principalmente para empresas virem para o seu município, sem infraestrutura nenhuma. “Nós temos aqui na região, por exemplo, um distrito industrial sem água e sem esgoto. Este tipo de ação quase sempre resulta em consequências negativas em termos ambientais”, observa Maria Judith.
3 – BUSQUEM APOIO TÉCNICO PARA AS DEMANDAS AMBIENTAIS
Maria Judith nota que todas as prefeituras, mesmo as que têm secretarias de meio ambiente, precisam de apoio técnico para questões específicas e os principais problemas são os de infraestrutura. “Para se ter uma ideia, não existe drenagem urbana em todos os municípios. Além disso, as instalações que são irregulares, sem aprovação de órgão regulador, o que só pioram a situação, uma vez que depois que a instalação já existe, as casas já estão construídas no entorno, alguém tem que correr e providenciar água, esgoto e luz para essa população. Tudo isso complica e muito a drenagem urbana. Temos que considerar também que cada região tem suas particularidades nas questões de água e esgoto, como as áreas urbanas e rurais, que exigem soluções diferentes”, explicou.
4 – VERIFIQUEM A QUALIDADE DA ÁGUA CONSUMIDA PELA POPULAÇÃO PERIODICAMENTE
A consultora conta que no Vale do Paraíba já houve casos em que a água era considerada potável e depois ocorreram casos de contaminação. “Há muitos anos usávamos índices de avaliação qualidade da água da Cetesb, por exemplo, publicávamos com o objetivo de alertar a população. Hoje, em muitos municípios a responsabilidade dessa avaliação é da Vigilância Sanitária, mas não temos notícia de que esses índices sejam propagados entre os cidadãos. É importante que os prefeitos divulguem os índices de qualidade da água que o cidadão está consumindo”.
5 – FAÇAM A GESTÃO ADEQUADA DOS RESÍDUOS SÓLIDOS
Para Maria Judith, este também é um problema de infraestrutura, o qual considera um dos maiores enfrentados pelos municípios. “Os resíduos sólidos gerados nas cidades, embora o Plano Nacional de Resíduos Sólidos já houvesse previsto isso 10 anos atrás, não são todos os municípios que tem coleta seletiva, nem todos possuem logística reversa e a maioria dos municípios só pensam em uma destinação final que é o aterro sanitário. Em regiões muito urbanizadas como a nossa, fica complicado criar aterros e mais aterros. Isso facilita a vida de empresas privadas, que criam um grande número de aterros privados, mas que ficam muito caros para as prefeituras. E existem muitos políticos que prometem lixo a zero custo para quem votar neles, entre outras questões que geram despesas para o município e que acabam sendo arcadas pelos munícipes, como a destinação do resíduo asséptico hospitalar”, exemplifica.
6 – DEEM ATENÇÃO PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Diante de sua experiência na área, Maria Judith atenta que muitas vezes os profissionais que atuam na área ambiental têm que fazer um trabalho voluntário para chegar até as escolas, até a população de zona rural, por exemplo, para transferir conhecimento e ajudar na ampliação da consciência sobre a importância da educação ambiental e até mesmo sobre saúde ocupacional. É um gargalo que o administrador municipal deve considerar como prioridade, pois um cidadão ambientalmente consciente está mais preparado para contribuir com as ações ambientais do município.
7 – NEM TODO LICENCIAMENTO AMBIENTAL PODE SER FEITO PELAS PREFEITURAS
Judith comenta que algumas prefeituras têm convênio com as secretarias de meio ambiente para fazer o licenciamento de algumas atividades até certo patamar, porém nem todos os prefeitos entendem que existe esse “patamar limite”. “Já atendi casos para instalação de estação de tratamento de esgoto, por exemplo, que a prefeitura expediu o licenciamento ambiental, mas expliquei que não teria como dar andamento no processo porque era um caso típico de que a Fehidro não iria liberar a operação do empreendimento”, contou. Casos como esses levam à morosidade dos processos de liberação dos licenciamentos, geram mais custos, e interferem na boa gestão municipal.
Parâmetros ambientais
Na sequência, o engenheiro João Roberto Rodrigues, que também já trabalhou na Cetesb e é conselheiro do Cosema, fez as seguintes considerações:
8 – UTILIZEM PARÂMETROS/INDICADORES QUE POSSAM AFERIR A QUALIDADE DO AMBIENTE URBANO
O engenheiro frisou que no último século tivemos uma mudança radical na estrutura da sociedade brasileira, especificamente no Estado de São Paulo, onde uma população que era predominantemente rural passou a ser urbana. “Morar em cidades é viver em um ambiente construído pelo homem e que está em permanente mutação, portanto devemos ter parâmetros que possam aferir a qualidade desse ambiente urbano para suportar a vida das populações. Pesquisando, verifiquei que existem várias abordagens para tratar desse tema, entre eles, uma abordagem mais ecológica que privilegia os recursos naturais que existem na cidade; existe outra mais funcionalista que prioriza os elementos urbanos mais ligados aos segmentos econômicos, a funcionalidade dessas atividades de produção. E existe uma abordagem mais sociológica que valoriza a relação entre as pessoas com o seu ambiente construído”, explica.
Elencando alguns parâmetros que podem ser considerados pra aferir a qualidade de um ambiente urbano, Rodrigues cita:
1º – a questão da Água. As prefeituras devem identificar os mananciais de abastecimento da cidade, definir as sub-bacias hidrográficas com base em cartografia existente e exercer algum tipo de controle de ocupação dessas bacias hidrográficas, inclusive, induzindo a um reflorestamento, a uma proteção de nascentes de forma a garantir quantidade e qualidade de água para abastecimento público e, concomitante a isso, fazer a proteção das áreas de preservação permanente porque elas também asseguram a manutenção da qualidade dos recursos hídricos.
2º – na questão do Solo
É outro indicador possível de ser utilizado e temos dois aspectos fundamentais, que são ocorrências de erosões. Alguns municípios apresentam problemas bastante sérios, principalmente em áreas rurais, alguns em áreas periurbanas, mas que já ameaçam estruturas construídas nas cidades. Fora o risco inerente dessas erosões, elas também promovem o assoreamento de cursos d´água e todas as consequências que podem acarretar. Para Rodrigues, temos também os problemas de riscos geológicos em municípios que tem uma topografia mais acidentada, a ocupação dessas áreas de encostas acaba gerando situações de risco geológico que em casos de precipitações pluviométricas mais intensas gera um risco à segurança das pessoas.
3º – na questão do Ar
Apesar do controle de poluição do ar ser um campo específico e muito centrado na atividade da Cetesb, em São Paulo, por exemplo, temos algumas iniciativas que o município pode adotar. A qualidade do ar é uma questão intimamente ligada à saúde pública e têm duas características fundamentais: do ponto de vista de geração as fontes pontuais, de estabelecimentos industriais, alguns de serviços ou de obras; e as fontes difusas que são apresentadas pelo trafego urbano, poeiras levantadas em vias de circulação, as quais também abrem um campo para que a administração municipal possa fazer algumas intervenções em termos de controlar determinadas fontes e promover uma adequada ventilação dentro do ambiente urbano. Segundo Rodrigues, esse é um aspecto que pouca gente considera ou reconhece como relevante, mas isso tudo tem a ver com a questão da qualidade do ar dentro das cidades. Estudar a questão de circulação também é outro aspecto para evitar o surgimento de congestionamentos e aumento da poluição atmosférica, entre outros.
4ª – A questão do Ruído
É outro parâmetro que pode ser considerado. O mapeamento de áreas críticas de ruído também é importante para assegurar um ambiente de boa qualidade para a vida das pessoas e nesse campo a administração municipal tem a possibilidade de exercer certo nível de controle para aquelas fontes que não são controladas diretamente pela Cetesb, no caso de São Paulo, que diz respeito a anúncios, a casas de espetáculos e outras fontes não licenciáveis pela Cetesb. “Hoje isso também é tratado como uma questão de saúde pública porque acaba afetando a saúde das pessoas, causando irritabilidade, prejudicando o desenvolvimento de atividades intelectuais, escolas, entre outros problemas”, diz Rodrigues.
5º – a questão de Vegetação
É outro indicador importante para os municípios e para o qual existem parâmetros da Organização Mundial de Saúde (OMS) que são o índice mínimo de 12 metros quadrados por habitante e um índice recomendado de 36 metros quadrados por habitante de área vegetal nas cidades. “Trata-se de uma recomendação em nível mundial, mas para cada região isso pode ter uma característica de maior ou menor de intensidade de área vegetada, mas é um aspecto extremamente fundamental a ser considerado pela administração pública. A vegetação proporciona várias vantagens. Uma é quando consigo ter uma área mais extensa de vegetação dentro das cidades, como parques, promover microclimas e conseguir uma temperatura mais atenuada; ela promove retenção de água de chuva, uma área florestada, uma área com árvores retém cerca de 50% de precipitação que ocorre naquele local, em relação à área impermeabilizada, é um percentual bastante significativo para fazer um controle de drenagem urbana. Ela pode promover corredores de vegetação que possibilitam a entrada de ventilação de ar de fora da cidade para os centros mais adensados, que são chamados os corredores verdes, que podem ser instalados em fundos de vales ou ao longo de vias expressas, de forma que isso facilite a penetração de ventos nas áreas mais adensadas e promove uma melhoria na paisagem urbana”, evidencia.
O especialista lembra que a vegetação é sempre um elemento que traz uma tranquilidade para o olhar, para a convivência, além de que promove o sombreamento, mas alguns cuidados precisam ser tomados, por exemplo, com a escolha de espécies, que pode ser orientado por um botânico, um agrônomo, alguém da área específica, para escolher espécies que não percam todas as folhas na época de outono/inverno, que tenha cuidado com o enraizamento dessas árvores, escolhendo espécies que tenham raiz pivotante que é aquela raiz que se aprofunda para não danificar a estrutura de calçadas e vias de circulação, entre outros.
6º – a questão de Fauna
Em ambiente urbano é um tema bastante limitado, mas existe um aspecto que é muito importante relacionado ao controle de vetores, que envolve uma ação de controle mais sanitário nas cidades. “Os ratos, por exemplo, são organismos vivos que transmitem doenças, são reservatórios de moléstias e tem que haver um controle disso. É importante também a preservação da fauna sinantrópica, que é aquela fauna que convive com o homem no ambiente urbano, que traz um pouco de leveza e de alegria para o ambiente, principalmente a avifauna, alguns tipos de insetos, entre outros”, cita.
9 – DIVERSIDADES DE USOS E ACESSOS AOS SERVIÇOS E UTILIDADES URBANAS
Tem que se atentar que deve existir na malha urbana uma diversidade de usos que possibilite o fácil acesso do cidadão a eles, aos serviços, as estruturas e utilidades urbanas que sejam de uso cotidiano. “Essa diversificação de usos nos bairros mais adensados é um aspecto importante para o uso do solo. O controle do adensamento também é importante porque tem a ver com uma adequação da capacidade de infraestrutura que existe, de abastecimento de água, coleta de esgoto, de circulação veicular, de transporte público e assim por diante”, explica Rodrigues.
10 – ATENÇÕES COM A DRENAGEM URBANA
O controle de impermeabilização é uma questão extremamente importante nas cidades e que tem a ver com a drenagem urbana. Rodrigues aponta que é um aspecto muito relevante porque uma falta de cuidado com esse parâmetro promove zonas de enchentes, de acumulação de água ou de chegada muito rápida da água de chuva o que acaba causando os prejuízos de tantos munícipes e que frequentemente acompanhamos nos noticiários em épocas de grande precipitação pluviométrica nas cidades.
11 – PRESERVEM OS FUNDOS DE VALES
Há várias correntes que defendem a preservação de fundos de vales. “O vale de um curso d´água é uma zona de expansão desse curso hídrico. Na medida em que ocupamos esses fundos de vale com edificações, com vias, não podemos reclamar quando o rio extrapola sua calha e acaba ocupando essas áreas promovendo todos os problemas ambientais que estamos acostumados a ver”, salienta o consultor.
12 – PRESTEM ATENÇÃO NA SATURAÇÃO DA INFRAESTRUTURA
Ele destaca ainda a atenção que os gestores municipais devem ter na saturação na infraestrutura. “Na questão de infraestrutura, ela deve estar adequada à densidade de ocupação e esse é um aspecto que as prefeituras têm que se atentar que tem que buscar uma equidade no atendimento. Isso passa por uma avaliação que abrange, por exemplo, como é que os vários bairros, as várias comunidades de uma cidade estão sendo atendidas com abastecimento de água, com coleta de resíduos, redes de esgoto, serviço de transporte público, entre outros, e tentar buscar uma equidade para que todos tenham um nível de atendimento satisfatório”, menciona.
13 – VALORIZEM O CONFORTO AMBIENTAL
Na parte de conforto ambiental, João Roberto esclarece que no momento em que é criado um adensamento, uma verticalização das cidades, elas dificultam a circulação do ar e acabam agravando o problema com surgimento das ilhas de calor ou de aumento de temperatura nesses ambientes muito construídos. “Por isso, é preciso atentar para a questão da ventilação natural urbana”, diz.
A questão de insolação também tem que ser avaliada pela gestão pública, para limitar gabarito em torno de instituições, de atividades nas quais a insolação é um fator importante para assegurar a salubridade das edificações.
Também faz parte do conforto ambiental se atentar a questão de paisagens, de barreiras sonoras, junto às áreas críticas de ruído.
Outra questão é a de mobiliário urbano, para que as pessoas que circularem pela cidade tenham um conforto, um apoio quando estiverem se movimentando, ter um banco de jardim para sentar, utilizar um sanitário público, por exemplo. “São aspectos que acabam trazendo um conforto ambiental para os moradores de uma cidade”, atesta Rodrigues.
E por fim, ele faz alusão às referências culturais. “É uma aspecto que é muito relegado normalmente nas administrações públicas e que no meu entendimento é da maior importância para a preservação das memórias da cidade, de edificações, de monumentos, de espaços que são caros à população e devem ter um cuidado especial por parte dos gestores públicos”, alerta.
O especialista acrescenta que a cidade tem que ser um espaço de convivência e proporcionar acolhimento aos seus moradores. Em contrapartida, o envolvimento do morador com o bem-estar da sua rua, considerar o bairro e a cidade onde reside que é um bem pessoal ele vai passar a querer cuidar desse bem. “Cobrar os administradores para encaminharem a gestão da cidade nesse sentido acarretaria em muitos ganhos em termos de desenvolvimento da cidadania, de melhoria das administrações públicas em nosso País”, salienta.
14 – INCORPOREM A FERRAMENTA DO ZONEAMENTO AMBIENTAL NAS SUAS ATIVIDADES
O engenheiro João Roberto atenta para os administradores públicos que o zoneamento ambiental é um trabalho de conhecimento do ambiente em termos das suas limitações e das suas potencialidades. Portanto, é fundamental para a administração pública, tanto municipal quanto estadual e federal, que se tenha esse conhecimento, na medida em que a produção de projetos, de programas leve em conta as características do ambiente, preservando aquelas qualidades e especificidades das cidades que são relevantes para o meio ambiente e toda a sociedade e atentando para aqueles aspectos de limitação que o ambiente oferece em algumas situações. “O zoneamento ambiental é uma ferramenta importante e que as prefeituras deveriam incorporar nas suas atividades”.
15 – OUÇAM A VONTADE DO ELEITOR
João Roberto aproveitou para exemplificar com um projeto piloto em que participou para o desenvolvimento do zoneamento ambiental na cidade de Ubatuba, SP, na década de 80. “Ao término do trabalho, após uma visita promovida pelo Consulado Americano, fizemos a apresentação do projeto. Na época estávamos nos primórdios das tecnologias de sensoriamento remoto e perguntei para uma especialista americana, que tinha grande experiência neste tipo de projeto, sobre o que ela tinha achado do nosso trabalho e se nos Estados Unidos era comum usar essas tecnologias em trabalhos de planejamento. Ela não só elogiou nosso projeto como deu uma resposta que me deixou muito surpreso. A especialista confirmou que o sensoriamento remoto já era muito utilizado nos EUA pela facilidade de acesso à tecnologia, mas, contudo, tinha outro aspecto que ela considerava muito importante: o sensoriamento remoto não detecta a vontade do eleitor. Isso me marcou porque por melhor que eu planeje e use elementos tecnológicos, o conhecimento científico, se eu não ouço o cidadão que vai viver naquele ambiente que estou planejando, que estou interferindo e alterando, o resultado do trabalho pode nos frustrar lá na frente. Essa observação é relevante porque cria um caminho certeiro para as administrações utilizarem, sem cair na linha de ter uma gestão populista, mas é significativo ouvir o cidadão, criar mecanismos para ter associações de bairros, de ruas, para que o cidadão seja um balizador do uso das tecnologias, do conhecimento técnico para a formulação dos planejamentos urbanos”, conclui João Roberto Rodrigues.
Cidades mais inteligentes e sustentáveis
O consultor de planejamento ambiental, Ivan Maglio, é autor de um livro editado em parceria com outros especialistas “Municípios e Meio Ambiente”, considerado uma obra pioneira na abordagem da gestão ambiental municipal. Maglio lembra que era um tabu falar sobre isso nos anos 90 e o conteúdo do livro trouxe muitas orientações para a aplicação prática da gestão ambiental nos municípios. Atualmente, a obra ainda pode subsidiar os gestores públicos que têm interesse em desenvolver a gestão ambiental em suas cidades pensando nas próximas eleições.
O especialista fez uma retrospectiva do organograma em torno da legislação ambiental em nível municipal, elencando as dificuldades em garantir que os municípios tinham a capacidade, a disponibilidade de fazer o seu sistema de gestão ambiental municipal. Ele deu as seguintes orientações:
16 – ATENDER OS 17 ODS (OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL) DA AGENDA 2030 DA ONU
Segundo Maglio, vários desses Objetivos estão vinculados às cidades. A aplicação dos ODS torna as cidades adequadas às necessidades da população ao disponibilizar espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e ecológicos; ao conservar o patrimônio cultural e natural; qualidade do ar; fazer o planejamento participativo e transporte público que traz acessibilidade à sociedade; proporcionar atenuação das alterações climáticas e maior resiliência a impactos de eventos extremos.
17 – APLICAR DIRETRIZES DA NBR ISO 37120:2017 – INDICADORES PARA SERVIÇOS URBANOS E QUALIDADE DE VIDA
A norma orienta ações para prefeitos e gestores municipais que queiram implantar uma agenda de desenvolvimento para que suas cidades e comunidades sejam mais sustentáveis, com indicadores para inovações no Plano Diretor, contemplando o planejamento urbano e áreas verdes, por exemplo.
18 – MAIOR ATENÇÃO COM AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E QUE MODELO DE CIDADE PODERÁ SURGIR PÓS-PANDEMIA DA COVID-19
Maglio atenta que a discussão em torno da mudança do clima coloca um problema novo para os responsáveis pela gestão municipal, que precisam estar preparados porque já estão prognosticadas as mudanças que vão ocorrer e os problemas que os municípios vão enfrentar com o aumento das temperaturas, entre outros desafios. Segundo ele, o caminho é buscar a mitigação (descarbonização) das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) por meio de ações planejadas nos setores que geram emissões, como transportes, resíduos, energia etc, chegando a promover estratégias para a adaptação à mudança climática para evitar impactos mais críticos no futuro, com implantação de sistemas de parques e áreas verdes, mobilidade urbana sustentável, redução das ilhas de calor, entre outras ações.
Com o cenário de pós-pandemia, o especialista observa que os gestores devem considerar que modelo de cidade poderá surgir. Ele enumera os seguintes desafios a serem trabalhados:
1º – Como ressignificar as cidades e tornar os espaços verdes mais humanos, seguros e inclusivos?
2º – A sensação de segurança das pessoas poderá ser maior em áreas verdes, com maior demanda de locais de encontro;
3º – Como fazer os deslocamentos nesse novo contexto?
Assim, para constatar quais lições podemos tirar da pandemia, Maglio citou o desenvolvimento de uma pesquisa do Programa Cidades Globais realizada pelo IEA/USP sobre “Emoções Momentâneas: Comportamento e Hábitos Cotidianos Pós-Pandemia”, na qual 86% das pessoas indicaram, por exemplo, que sentiram mais falta de estar em áreas verdes no período da pandemia da Covid-19.
Gestão dos resíduos sólidos
Carlos Silva Filho, considerado uma das personalidades de maior referência no setor dos resíduos urbanos, mais conhecido como lixo doméstico, destacou o fato de tratar sobre a gestão municipal sob o viés da sustentabilidade como mais uma agenda de vanguarda da Fiesp. Nesse enfoque de gestão voltada para resíduos sólidos, Silva Filho apresentou alguns pilares que temos nos dias atuais e que cabem aos municípios suas implementações no decorrer dos próximos anos, principalmente a partir das gestões que se iniciam a partir de janeiro de 2021. Suas dicas são:
19 – FOCO EM TRÊS PILARES: PNRS (POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS), NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO E PLANARES (PLANO NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS)
Sob o aspecto da gestão municipal, Silva Filho alerta que precisamos ter conceitos muito claros trazidos pela Lei Federal 12.305/2010, a PNRS, que são a distinção entre Resíduos x Rejeitos e, por conseqüência, a distinção entre Destinação x Disposição final ambientalmente adequada, a qual compreende a redução, a reutilização, a reciclagem, a compostagem, o tratamento dos resíduos sólidos, o aproveitamento e a recuperação energética, bem como outras destinações admitidas pelos órgãos ambientais, dentre elas as incluídas na disposição final.
Silva Filho afirma que a PNRS aborda uma série de alternativas, de soluções que podem ser implementadas para a destinação ambientalmente adequada e a lei não deixa nada de fora, não exclui, não proíbe, esses são pontos que devem ser considerados de uma maneira muito atenta pelos gestores municipais. “A pior solução é a que temos hoje em que praticamente 40% dos resíduos coletados vão para locais inadequados o que é proibido pela lei, que traz uma disposição muito clara para o fim dessas unidades inadequadas. Além disso, vem na esteira na Política Nacional de Meio Ambiente, de 1981, que já proibia a poluição de todas as formas e criminalizada pela Lei de Crimes Ambientais, de 1998, portanto, lixões e outras formas de destinação inadequada são proibidos no Brasil”, salienta.
Outro ponto que a política traz é o planejamento da gestão de resíduos. Silva Filho comenta que os planos de gestão de resíduos sólidos não são só obrigatórios, são demandados pela lei, como são os instrumentos mais importantes para os municípios, para que possam cumprir com as suas estratégias de longo prazo, no tocante a gestão de resíduo no seu território.
O especialista informa que a logística reversa e a responsabilidade compartilhada devem ser consideradas na gestão municipal. “Uma vez que a lei traz responsabilidade para determinados setores que colocam certos tipos de produtos no mercado em parceria. Por isso, o uso do termo responsabilidade compartilhada em parceria com as gestões municipais, de forma que os municípios e os gestores não são proibidos de realizar etapas previstas na logística reversa, mas caso as realizem precisam estar em parceria com os setores privados aos quais cabe essa responsabilidade. Esses gestores municipais precisam buscar alternativas, precisam traçar alianças para que a logística reversa deslanche em sua cidade”, completa.
20 – ATENÇÃO PARA AS DISPOSIÇÕES RELATIVAS AOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO
O Novo Marco Legal do Saneamento Básico alterou a lei 11.445, de 2007, trazendo algumas determinações específicas, começando pela abrangência da lei que trata dos serviços públicos especializados de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos ao lado de abastecimento de água, tratamento de esgoto e drenagem de águas pluviais, considerando esses serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos como as atividades operacionais de coleta, transbordo, transporte, triagem para fins de reutilização ou reciclagem, tratamento, inclusive por compostagem e destinação final dos resíduos domésticos, dos resíduos originários de atividades comerciais, industriais e de serviços em quantidade e qualidade similares a dos resíduos domésticos, que por decisão do titular sejam considerados resíduos sólidos urbanos, dos resíduos originados nos serviços públicos de limpeza urbana, entre outros eventuais serviços de limpeza urbana. “No caso desta lei, o titular é o município, portanto todos esses serviços estão abrangidos e detalhados no novo marco legal, e a sua execução, a sua prestação pelo titular deve seguir e observar essas determinações. Assim sendo, cabe especificamente que esses gestores ambientais municipais tenham pleno conhecimento das novas disposições porque essas regras da lei federal 14.026/2020 realmente afetam em uma série de pontos na execução dos serviços públicos de limpeza urbana e de resíduos sólidos”, explica Silva Filho.
Ele acrescenta que o primeiro ponto a se destacar, conforme o detalhe da lei são os princípios para prestação do serviço de gestão dos resíduos. “No artigo 2º há uma qualificação desses princípios, entre eles a universalização do acesso e efetiva prestação do serviço”, indica.
Silva Filho chama a atenção sobre o que são serviços que devem ser prestados de maneira integral e interconectados. “Temos visto muitas decisões de Tribunais de Conta, principalmente, que diante de um processo de contratação determinam, orientam pela separação da contratação do serviço cada um num bloco diferenciado, esquecendo que são serviços que estão todos interconectados em que a eficácia de um, e justamente a produtividade, afeta diretamente a qualidade do outro por serem serviços contínuos, então a lei vê como princípio fundamental a integralidade”, expressa.
Ele lembrou que a gestão dos resíduos está ligada à área da saúde pública e, segundo estudo da Abrelpe, hoje a destinação inadequada de resíduos sólidos afeta a saúde de 76 milhões de brasileiros, trazendo problemas de saúde para essa população a um custo de US$ 1 bilhão por ano. “Temos que continuar e orientar a prestação desses serviços para a conservação dos recursos naturais e em direção à economia circular”, pontua.
21 – BUSCAR E ADOTAR A SOLUÇÃO REGIONALIZADA DOS SERVIÇOS
A solução regionalizada faz parte dos princípios fundamentais do Novo Marco Legal do Saneamento. “Devemos entender que não é possível uma solução individual para 5.570 municípios no Brasil. Além disso, é necessário buscar a seleção competitiva do prestador de serviço, a contratação através da licitação pública e, nesse ponto, a lei diz que o titular desse serviço, no caso os municípios, além de formular a respectiva política pública de saneamento básico, cabe a ele prestar diretamente os serviços ou conceder a prestação deles, bem como definir, em ambos os casos, o responsável pela regulação e fiscalização da prestação desse serviço”, informa o presidente da ISWA. Assim, ele destaca que temos uma nova demanda para esses gestores ambientais municipais que envolvem organizar a prestação direta, fazer a concessão e sempre definir uma entidade responsável pela regulação e fiscalização. “Essa é uma tônica dessa nova regulamenta, que busca disciplinar as regras de execução desses serviços com entidade reguladora e normas de regulação”, enfatiza.
No tocante a prestação, para os casos em que o administrador não integre a administração do titular, Silva Filho informa que depende da celebração de contrato de concessão mediante prévia licitação. “Com isso, este novo marco subiu um degrau na forma de execução dos serviços públicos de saneamento básico e nisso temos abastecimento de água, tratamento de esgoto, limpeza urbana, manejo de resíduos e drenagem de águas pluviais exigindo a celebração de contrato de concessão, o que leva a contratos de longo prazo, prevêem investimentos e uma execução integrada com vistas ao cumprimento pleno das determinações legais”, atenta.
De acordo com Silva Filho, um ponto muito forte que a nova lei trouxe para as gestões municipais é a questão da sustentabilidade econômico-financeira dos serviços. “Segundo a nova lei, os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-financeira assegurada por meio de remuneração pela cobrança dos serviços e, quando necessário, por outras formas adicionais. Não é mais condicional, aqui o legislador assumiu que isso deve acontecer e no caso de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, na forma de taxas, tarifas e outros preços públicos”, explica, e acrescenta: “essas taxas e tarifas devem considerar a destinação adequada dos resíduos coletados, o nível de renda da população de forma isolada ou combinada e poderão ainda considerar as características dos lotes, o peso ou volume coletado por habitante ou por domicílio, entre outros. Temos que considerar vários elementos na composição desses instrumentos de remuneração que se tornam obrigatórios e que a lei dá um prazo de até 12 meses da vigência da lei para sua proposição, ou seja, até julho de 2021, configura renúncia de receita e exigirá comprovação de atendimento pelo titular do serviço, no âmbito da Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Silva Filho informa que a ANA instituirá as normas de referência para a regulação dos serviços públicos em nível federal.
Temos também as alterações da PNRS que este novo marco trouxe. Silva Filho destacou a redação do artigo 54 que trazia originalmente os prazos para disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos que, por um longo tempo, foi lido como prazo para fim dos lixões, mas não é. “Em sua alteração consta que a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos deverá ser implantada até 31 de dezembro de 2020, exceto para os municípios que até essa data tenham elaborado o Plano Intermunicipal de Resíduos Sólidos ou Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos e que disponham de mecanismos de cobrança que garantam sua sustentabilidade econômico-financeira”, explica.
O especialista alerta que os gestores municipais devem se atentar aos novos prazos previstos neste novo marco do saneamento.
Segundo ele, é nesse contexto que precisamos observar a agenda municipal para a gestão de resíduos sólidos nas plataformas dos candidatos nessas eleições. “Aquele que assumir a partir de 1º de janeiro terá todas essas demandas no seu colo para serem resolvidas”, observa.
Garantia do atendimento à legislação vigente
O Ministério Público também fez sua contribuição para o tema com a participação do procurador de Justiça Dr. Tiago Cintra Zarif, que foi o coordenador da área ambiental do Ministério Público do Estado de São Paulo e hoje integra o Conselho Superior do Ministério Público.
Em sua explanação, Dr. Zarif fez as seguintes observações:
22 – OS GESTORES MUNICIPAIS DEVEM DESENVOLVER ATIVIDADES NA ÁREA AMBIENTAL QUE POSSAM TRAZER GANHOS À COLETIVIDADE
O Procurador de Justiça observou que os especialistas elucidaram e abordaram questões que representam o dia a dia de atividades do MP ao falarem aquilo que acontece na realidade e que deveria ser o trabalho da prefeitura, do gestor público solucionar, e quando eles não fazem cabe ao Ministério Público trabalhar e cobrar do gestor público as ações necessárias.
“Os políticos devem ficar cientes de todas essas orientações pronunciadas neste evento para saber qual é o trabalho deles, o que seria o ideal em uma atividade na área ambiental, que possam trazer ganhos à coletividade. Os prefeitos, os vereadores estão lá para respeitar e atender a coletividade. As apresentações desses especialistas mostram o caminho adequado para isso. Independente de outras pautas importantes que fazem parte do contexto dos municípios, como a defesa da fauna urbana, no caso a proteção dos cães e gatos, por exemplo, que ganham muita a atenção dos cidadãos, o meio ambiente é importante para o desenvolvimento da sociedade num todo, para a saúde pública e para a qualidade de vida e deve ser um ponto de atenção nas manifestações dos candidatos em suas campanhas eleitorais”, declarou o procurador.
Dr. Zarif explanou sobre a atuação do MP com um breve histórico das iniciativas na área de meio ambiente e sua evolução ao longo do tempo. Ele comentou casos emblemáticos de ações que aconteceram com empresas por desatenção aos aspectos ambientais de suas atividades e que levaram à geração de poluição e, consequentemente, a autuação de multas.
23 – ATENÇÃO À RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADMINISTRADOR PÚBLICO
Dr. Zarif observa que muitas vezes o administrador público desconhece que existe a responsabilidade civil pública, por exemplo, no acidente de trânsito onde há a necessidade de provar culpa ou dolo para que haja o dever de indenização. “Na ação civil pública, o inquérito que está sendo apurado por dano ambiental, a responsabilidade é objetiva, ou seja, independe de dolo e culpa. Muitas vezes as pessoas questionam isso, mas na atuação não se discute se houve a culpa da empresa ou da prefeitura sobre determinado ato. Se houve o fato e, direta ou indiretamente teve a participação do poder público ou de uma empresa, já há a responsabilidade e o dever de indenizar e recuperar o meio ambiente, conforme determina a lei”, orienta.
Ele observa que existe a teoria do risco integral. “Basta a atividade contribuir para a eclosão do evento danoso para existir a responsabilidade. A prefeitura tem seu dever de fiscalizar se ela não o fizer corretamente pode ser também alvo dessa constatação e investigação, porque ela tem o dever de verificar se a empresa está funcionando direito ou não e autorizar o alvará quando permite a sua autuação”, explica.
Existe ainda o Princípio da Precaução, que, na dúvida, deve ser sempre favorável ao meio ambiente. Segundo Dr. Zarif, a precaução determina que o Poder Público, ao licenciar uma obra ou um empreendimento, deve verificar se há possibilidade de causar dano. Se houver a possibilidade é o suficiente para inviabilizar a licença sob pena de responder por essa autorização. “A precaução deve prevalecer sobre a questão de lucro, é sempre necessário que os municípios vejam isso. Eles podem ser responsabilizados por sua omissão quando ocorrer o dano, uma vez que a administração municipal tem o dever de fiscalização, tem o dever de acompanhar e é quem vai dar a autorização e as licenças, portanto, a omissão ou a concessão dada de forma irregular, o administrador público responde por isso, independente se foi o funcionário que fez ou se o prefeito autorizou as licenças de competência do município”, elucida.
Dr. Zarif informa que o Ministério Público pode ter conhecimento dos fatos de diversas maneiras, ou por reportagens de jornais que divulguem ações irregulares das prefeituras ou por representação de qualquer cidadão. “Qualquer cidadão pode representar o MP dizendo que está ocorrendo um dano ambiental em determinado lugar. Chegando essa representação ou notícia, o promotor de Justiça vai ter que tomar providências, pois é obrigação dele fazer o acompanhamento desde que haja o mínimo de fundamento. E se tiver por algum motivo para o fato indicado estiverem faltando alguns elementos ele pode, diante de notícias e fatos, o que se chama uma representação, pedir informações a mais para que tenha o maior subsídio para a investigação. Havendo esse maior subsídio, inicialmente ou depois dessa diligência, é aberto o chamado inquérito civil, que é uma questão administrativa. Atualmente, o MP abre o inquérito e permite que as pessoas se manifestem, façam sua defesa, o que acho muito importante e até para a própria atuação do MP, que ao ter conhecimento do contraditório, antes da própria ação, já se sabe o que vai enfrentar”, observa.
24 – SEJAM TRANSPARENTES SOBRE O SEU POSICIONAMENTO EM RELAÇÃO ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS QUE O MUNICÍPIO ENFRENTA
Para ilustrar essa dica, Dr. Zarif contou que tempos atrás uma prefeita procurou o promotor público em sua cidade e solicitou que todas as vezes que tivessem uma questão em que ela tivesse causado um dano ambiental ao município, que o Ministério Público a procurasse diretamente. Conforme Dr. Zarif, a prefeita foi transparente e falou abertamente que se fosse do seu interesse político acatar o MP para resolver o problema e atender a coletividade, ela cumpriria e, com isso, ganharia os trunfos políticos. Mas, caso não fosse de seu interesse, porque desagradaria parte do seu eleitorado, o MP poderia entrar com a ação que ela discutiria em juízo e, se o juiz determinasse e julgasse que ela teria que fazer a ação de reparação, ela seria obrigada a cumprir e, sendo assim, não desagradaria ninguém porque estaria cumprindo uma ordem judicial.
“Eu achei essa conduta, por parte da prefeita, sensacional. É o exemplo de visão que se todos os políticos tivessem seria uma excelente forma de resolver os problemas municipais porque, de uma forma ou de outra, o administrador não está brigando com o Ministério Público e nem o Ministério Público está brigando com ele, e, dessa maneira, conseguem chegar a um acordo, cuja solução vai ser decretada na ação judicial pela decisão do juiz. Essa é uma atitude de muito bom grado para aplicar, se os administradores públicos entendessem que gera mais benefícios para a sua gestão e a sociedade”, aponta.
O promotor fez algumas considerações em relação aos que os especialistas que o antecederam abordaram, pois muitas das questões elencadas, que cabem ao município atenderem, acabam chegando ao Ministério Público. Ele citou os exemplos de problemas com ruídos em casos que o poder público não fiscaliza a empresa, um bar, um restaurante, casa de shows e até igrejas que são questionadas por causa da poluição sonora; casos de condomínios que invadem áreas ambientais, algumas de preservação permanente, que a prefeitura licencia e não toma as devidas cautelas; entre outras situações. “Dos 100% de ações civis públicas ajuizadas, 75 a 80% são procedentes e a atuação do promotor de Justiça é confirmada e arquivada assim que solucionada a questão”, comenta.
25 – ATENDAM AS EXIGÊNCIAS DAS ÁREAS AMBIENTAIS
Outra questão apontada pelo procurador é que o poder público, em relação à gestão ambiental do município, que ele se preocupe em atender as exigências dos técnicos das áreas ambientais. “Nesta live, por exemplo, temos vários consultores ambientais dando aulas de como os gestores públicos devem agir e como devem fazer. Então procurem essas pessoas para que possam fazer um trabalho adequado na área ambiental de suas cidades, com o cuidado e cautela necessária, porque quando se tem esse respaldo técnico vai ser melhor para o gestor e ele, por sua vez, vai dar uma melhor resposta à população mostrando o que está fazendo em prol do meio ambiente”, orienta.
Quando se fala em meio ambiente, Dr. Zarif frisa que está se falando em saúde pública, por exemplo. “Tudo isso é para o bem da coletividade e o administrador sai ganhando com ações planejadas e adequadas, pois ele conquista uma plataforma positiva para divulgar aos seus eleitores sobre o que ele fez e o que pretendeu fazer e ajuizou pelo bem da comunidade. E o Ministério Público estará sempre ao lado daqueles que tiverem interesse em agir de forma adequada, em trabalhar junto com o MP e resolver as demandas ambientais em prol da sociedade”, conclui o procurador de Justiça.
Engajamento do cidadão
Essas 25 dicas salientam que nem sempre os administradores públicos percebem o que são de sua competência, de responsabilidade e de importância para serem geridos no dia a dia de uma administração municipal. Os especialistas foram unânimes em afirmar que o engajamento do cidadão é essencial para a evolução da agenda ambiental dos municípios, o que significa a necessidade de mais abertura e incentivos para as ações de educação ambiental, por exemplo, junto aos munícipes.
Eduardo San Martin, presidente do Cosema, chamou a atenção dos prefeitos para o fato de que a questão ambiental não só uma obrigação legal a se dedicar como foi exposto com muita propriedade e didática neste evento. Ele frisou que com base nos conteúdos expostos, todos entenderam que a gestão ambiental é responsabilidade do município. “Essa questão não envolve, portanto, só o cumprimento da exigência legal, mas a necessidade de fazer um bem para a sociedade. O prefeito que quer ter voto pelo seu trabalho, o que configura um reconhecimento do seu eleitorado, deve entender que o voto que a atividade ambiental traz é resultado do bem que ele faz para a sociedade. Então, fortaleçam suas áreas ambientais, sejam por meio de assessorias, departamentos, diretorias, secretarias. Designem para conduzir essas áreas ambientais pessoas que tenham, em primeiro lugar, capacidade e honestidade. Essas pessoas vão lhe dar votos, os quais serão o reconhecimento da sociedade pelo trabalho que vocês estão fazendo para melhorar a qualidade de vida da sua população”, afirmou ao final da live.