Todo ano são despejadas nos oceanos mais de 10 milhões de toneladas de plástico, de acordo com estudo do WWF – o equivalente a mais de 300 quilos do resíduo por segundo. Caso nenhuma ação seja tomada agora, até 2050 os oceanos podem ter mais plástico que peixes. A urgência de agir para enfrentar a poluição plástica e de os governos alcançarem um consenso e firmarem o Tratado de Plásticos no início de dezembro foram ressaltadas publicamente em projeções feitas em Brasília, no Congresso Nacional, na Biblioteca Nacional e no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves.
Até o momento, as ações e compromissos firmados por empresas voluntariamente têm se mostrado ineficazes para enfrentar a poluição plástica, alcançando apenas uma fatia do mercado. Para de fato freá-la, são necessárias regras globais juridicamente vinculantes, isto é, obrigatórias para todos os signatários, para desencadear uma mudança sistêmica em relação ao plástico.
Nesse sentido, o tratado tem o objetivo de propor uma perspectiva abrangente, abordando o ciclo de vida completo do plástico, desde o design dos plásticos, até a produção e o pós uso. Com olhar estabelecido para uma economia circular, até 2040 será possível reduzir em 80% o volume anual de poluição plástica que chega aos oceanos, cortar 25% das emissões de gases de efeito estufa relacionadas ao plástico, gerar uma economia de 200 bilhões de dólares por ano e criar um saldo líquido de 700 mil novos postos de trabalho, segundo a Fundação Ellen MacArthur.
Essa abordagem não apenas é a mais eficaz para combater a poluição plástica, mas também oferece os melhores resultados econômicos, de emprego e climáticos. Por isso, é urgente a finalização do Tratado Global contra poluição plástica ainda este ano.
As primeiras sessões de negociação e o que esperar da INC-5
Pela primeira vez, em março de 2022, a UNEA (Assembleia da ONU para o Meio Ambiente) adotou um mandato de negociação para um novo acordo ambiental multilateral juridicamente vinculativo. Depois de oito meses, em novembro de 2022, a primeira sessão de negociações (INC-1) foi realizada, estabelecendo a organização das negociações e objetivos gerais do acordo. A partir de então, foi possível observar o avanço das discussões e o desenvolvimento do texto do Tratado, principalmente em relação a disposições sobre design de produtos, reutilização e sistemas de refil.
Alguns pontos, no entanto, ainda estão pendentes para serem acordados na INC-5, prevista para ser a última sessão de negociações. São eles:
- Diretrizes para harmonização de design de produtos plásticos, para que evitem o uso de plástico virgem e de polímeros plásticos primários;
- Mobilização de recursos financeiros para a implementação do Tratado;
- Critérios para identificação de produtos plásticos problemáticos e produtos químicos nocivos;
- Responsabilidade estendida do produtor;
De acordo com Luisa Santiago, diretora executiva para a América Latina da Fundação Ellen MacArthur, “o Brasil vem liderando discussões fundamentais no Tratado, como financiamento adequado para países em desenvolvimento, a transferência de tecnologia e medidas de transição justa, especialmente para catadores de materiais recicláveis. Como referência na agenda ambiental global, há espaço para aprofundar questões importantes como harmonização do design de produtos plásticos, para que nunca se tornem poluição, e a eliminação gradual de plásticos comprovadamente problemáticos e desnecessários. É muito importante que o Brasil sustente essa posição ambiciosa de enfrentamento à poluição plástica para poder influenciar positivamente outros países. Temos uma oportunidade única de desencadear uma mudança sistêmica ao definir regras globais.”
Fazendo com que o tratado global sobre plásticos funcione para MPMEs
Um tratado global juridicamente vinculativo significará novas regras e necessidade de adaptação a uma nova – e necessária – realidade. Ao mesmo tempo, é fundamental garantir que o Tratado gere benefícios globais e promova uma transição justa, especialmente para as micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) que fazem parte da cadeia do plástico.
Responsáveis por 70% das oportunidades de emprego em todo o mundo, as MPMEs desempenham um papel crucial nas economias nacionais. Um novo estudo da Fundação Ellen MacArthur, que investigou as vantagens dos modelos de negócio alinhados à economia circular, mostrou que as MPMEs que já estão envolvidas em soluções circulares reconhecem que as regras globais podem fortalecer seus modelos de negócios e melhorar o acesso ao capital. Dentre as empresas ouvidas, 63% encaram o Tratado Global de forma positiva, enquanto 37% se mostraram neutras e nenhuma apresentou opinião negativa.
“Para o Tratado cumprir com a sua função, é importante que ele considere todos os atores do sistema, incluindo as micro e pequenas empresas que lidam com produtos plásticos e os catadores de materiais recicláveis, que já exercem um papel fundamental na reinserção do plástico na cadeia produtiva. O que vemos é que uma economia circular para os plásticos é positiva para todos. Enquanto os modelos de negócio circulares fazem as empresas se destacarem no mercado, a proposta de circular os produtos e materiais em seu mais alto valor, como em sistemas de reutilização, favorece os catadores, que podem ser inseridos em cadeias que remuneram melhor e com melhores condições de trabalho”, avalia Santiago.