ODS 10

Desigualdade e falta de política pública: documentaristas mostram injustiça climática na região do Vale do Ribeira

Produção da USP, em parceria com a produtora Moeté Filmes, narra a vida de comunidades ribeirinhas e quilombolas a partir de pesquisa acadêmica sobre a vulnerabilidade social e climática.

Iporanga | Foto: Paolla Yoshie
Iporanga | Foto: Paolla Yoshie

Uma narrativa que mistura indignação e amor por um território. “(in)Justiça Climática no Vale do Ribeira” conta a história das condições de moradores rurais dos municípios de Iporanga e Eldorado, no Estado de São Paulo. 

O documentário, que conta com direção de Daniel Felipe Paiva e roteiro de Érico Pagotto, é um dos resultados do projeto “Pesquisa Participativa em Ação: Educação para Justiça Climática no Vale do Ribeira — SP”, coordenado pela professora e pesquisadora da USP, Sylmara Gonçalves-Dias. O estudo aponta que os impactos das mudanças climáticas atingem com mais intensidade justamente as populações mais vulneráveis. 

“Quando a gente fala de vulnerabilidade e adaptação para as mudanças climáticas, vemos muito presente naquele território a deficiência de infraestrutura. Um relato muito marcante [durante o filme] foi quando houve a comparação entre as pessoas que moram na beira da estrada principal das que moram em bairros afastados. Quem está próximo ao centro paga menos de dez reais no transporte e quem mora a quilômetros de distância paga de R$200 a R$300 para acessar o centro da cidade”, conta a mestre de sustentabilidade do NOSS EACH (USP), Amanda Cseh. 

A obra traz imagens e relatos de moradores que mostram como o aumento da frequência e da intensidade das chuvas impactam o acesso a direitos básicos, como serviços de saúde, educação e habitação. “Em 1997 foi uma das enchentes que, para mim, ficou na história. Já vi várias enchentes, mas essa deixou uma marca em Iporanga”, conta Zeca, do Quilombo Pilões. Na época, a enchente destruiu a casa dele e deixou a comunidade isolada por meses.

Em Iporanga e Eldorado, pelo menos 10% dos domicílios estão em área de risco de inundações. 

“É um impacto extraordinário das enchentes. Eles sofrem atualmente no Vale do Ribeira essa má condição de infraestrutura que em qualquer chuva todos ficam em situação de isolamento e emergência climática”, explica a pesquisadora, arquiteta e urbanista da FAU/USP, Ana Beatriz Nestlehner Cardoso de Almeida. 

Os pesquisadores da Universidade de São Paulo, integrantes do “Núcleo de Pesquisa em Organizações, Sociedade e Sustentabilidade (NOSS)”, foram à região para desenvolver estudos em campo. Ao longo de um semestre letivo eles criaram materiais didáticos em parceria com uma escola municipal e uma estadual  para apoiar professores, alunos e membros das comunidades locais a compreenderem melhor não apenas as transformações ambientais decorrentes das mudanças climáticas, mas também a reconhecerem seus direitos como cidadãos. 

“Chamamos este material de ”Detetive Climático”, explicou Sylmara Gonçalves-Dias, professora da USP e líder do NOSS. “É importante nos prepararmos e também prepará-los para as mudanças que já estão ocorrendo. E a co-criação de conhecimentos viabilizada por esta forma de ‘ciência-cidadã’ é muito potente”.

O antropólogo Antônio Carlos Diegues, que também foi entrevistado , aponta o Vale do Ribeira como uma das maiores socio-diversidades do Brasil, além de ser uma das regiões com maior biodiversidade mundial. 

O filme, apesar do tom realista sobre as consequências climáticas e seus impactos às famílias, traz a paixão dos moradores pela região. “Quero terminar meus estudos morando aqui no meu território. Quero trabalhar aqui. É meu objetivo mostrar para os mais novos que temos que valorizar a nossa terra”, revela Niceia Prata, moradora do Quilombo Maria Rosa. 

Este filme é financiado pela UK Research and Innovation (UKRI) e Climate-U: Transforming Universities for a Changing Climate. O “webdoc” é um dos resultados do projeto “Pesquisa Participativa em Ação: Educação para Justiça Climática no Vale do Ribeira-SP”, uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP, Brasil) e a University College of London (UCL), em colaboração com a iniciativa internacional Climate-U, implementada no Brasil em parceria com o INCLINE USP. A realização é do Núcleo de Pesquisa em Organizações, Sociedade e Sustentabilidade (NOSS) e da Moeté Filmes.

Envolverde