Quem passeia pelas dunas da Lagoa da Conceição, em Florianópolis (SC), pode se assustar ao ver o corte de árvores que acontece no Parque Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição. O que acontece, na verdade, é a retirada de pínus invasores que ameaçam espécies nativas e endêmicas (que ocorrem apenas na região). Ao contrário do que se possa imaginar, às vezes, para conservar o meio ambiente é preciso retirar plantas já estabelecidas que desequilibram ambientes naturais e comprometem o funcionamento dos ecossistemas.
Nativos da América do Norte, os pínus ou pinheiros americanos, introduzidos no Brasil para fins de reflorestamento, representam um problema ambiental para ambientes naturais porque eliminam, gradativamente, as plantas nativas em função de sombreamento e utilizando a água disponível no subsolo. Cada ecossistema possui suas características, seu processo de evolução natural, adaptadas às diversas espécies que compõem determinada região. Porém, a introdução de plantas ou animais que não fazem parte dessa cadeia afeta consideravelmente todo ciclo de desenvolvimento entre os seres vivos, assim como fazem os pínus na restinga da Lagoa da Conceição e em outras unidades de conservação do sul e sudeste.
Para realizar o controle da espécie, grupos de voluntários eliminam os pínus do parque desde 2010. No momento há um esforço de divulgação e solicitação de ajuda da população residente na região para que também elimine os pínus de seus quintais, pois funcionam como fontes de sementes para a invasão no parque. Até 2017, cerca de 270 mil pínus de todos os tamanhos já foram eliminados.
Não faltam exemplos nos ambientes naturais brasileiros de situações de invasão por espécies exóticas. Por motivos econômicos, o caramujo-gigante-africano (Achatina fulica) foi introduzido no Brasil, causando impacto ambiental, econômico e à saúde humana. O javali, introduzido ilegalmente para fins de caça e criação, invade a metade sul do país e causa imensos prejuízos à agricultura, além de impactar espécies nativas de porcos-do-mato. O mosquito-da-dengue Aedes aegypti (“odioso do Egito”, na tradução do Latim) é outro exemplo muito conhecido. Causador das doenças dengue, chikungunya e zika, acarreta grandes custos à saúde pública.
Para cada espécie naturalmente existente há outras que interagem com ela ou dependem dela para que o ecossistema funcione de forma harmônica. O conjunto de seres vivos em cada local se regula, equilibrando o ambiente. Quando chega uma espécie exótica, o controle natural pode não ocorrer, pois os inimigos naturais que fazem o controle da espécie não vêm junto com ela. Quando a exótica se torna invasora, a consequência é a propagação descontrolada e o desequilíbrio ambiental. Como as introduções de espécies estão ligadas a interesses humanos, cabe também ao ser humano melhor escolher espécies a introduzir e arcar com a responsabilidade de medidas de prevenção e controle.
Há evidências contundentes de consequências ecológicas negativas da invasão por espécies invasoras. Entre elas estão a eliminação de espécies nativas por competição ou predação, alterações em ciclos ecológicos como a produção de água e a frequência e intensidade de incêndios naturais, mudanças químicas nos solos e mudanças em processos de polinização e dispersão de sementes.
A disseminação global de um conjunto de espécies de alta capacidade de adaptação e invasão tende a levar à homogeneização da flora e da fauna em países com condições ambientais similares. Ou seja, ocorre gradativa redução da diversidade natural de espécies e da relação entre os diferentes seres vivos e os serviços ambientais provenientes dessas interações. Sem a adoção contínua de medidas de prevenção e manejo para a conservação da biodiversidade, invasões por espécies exóticas vão tomar cada vez mais espaço e interferir na sustentabilidade dos processos naturais.
* Sílvia Ziller é fundadora e diretora executiva do Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.