por Elisio Muchanga, especial para a IPS –
PROVÍNCIA DE NAMPULA, Moçambique, 28 de julho de 2018 (IPS) – Faurito António, 42 anos, do distrito de Lalaua, na província de Nampula, leva duas horas para chegar ao centro de saúde mais próximo para receber os medicamentos necessários para o tratamento da lepra. António, cujo pé foi afetado pela fraqueza muscular que ocorre quando a lepra não é tratada, diz que essa longa caminhada estando doente é a razão pela qual muitos não continuam o tratamento – que pode demorar de seis a 12 meses.
“Há pessoas que abandonam o tratamento alegando a fadiga de percorrer longas distâncias para chegar a um hospital”, disse António à IPS sobre a distribuição rural dos centros de saúde em Moçambique.
Na província nortista profundamente rural e pobre de Nampula, cerca de seis milhões de pessoas são atendidas por um centro de saúde em cada um dos 23 distritos, de acordo com o Ministério da Saúde de Moçambique. A falta de desenvolvimento – muitas das aldeias da região não têm eletricidade ou mesmo estradas pavimentadas – também dificulta o acesso a esses centros.
Essa nação do sul da África estava em uma guerra civil de 16 anos, que terminou em 1992, e está classificada em 181º lugar entre 188 países no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, compartilhando seu lugar com o conflituoso Sudão do Sul. Dados do Banco Mundial mostram que mais da metade da população, 63%, vive abaixo da linha da pobreza, de US$ 1,90 por dia. Uma fonte do Ministério da Saúde afirma que, em média, cerca de 5 mil pessoas são tratadas nos centros de saúde de Nampula, deixando a população restante sem acesso.
Distâncias até os centros de saúde
A província de Nampula foi classificada num estudo como uma das áreas com o maior número de aldeias localizadas a 60 minutos de um centro de saúde. O principal deles, o Hospital Central de Nampula, com 500 leitos, na cidade de Nampula, serve aproximadamente 8,5 milhões de pessoas das províncias de Nampula, Cabo Delgado e Niassa.
Essa província tem o maior número de casos de lepra do país. No primeiro semestre deste ano, o Ministério da Saúde registrou um total de 553 casos, a maioria dos quais nos distritos de Lalaua, Meconta, Mogovolas e Nampula, na província de Nampula, seguidos por Zambézia e Cabo Delgado, com 121 e 84 novos casos, respectivamente.
A lepra é uma doença crônica. Os sintomas iniciais são manchas de pele mais pálida que o normal, o que dificulta o diagnóstico. Se não for tratada, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que “pode causar danos progressivos e permanentes à pele, músculos, membros e olhos”.
No ano passado, o diretor nacional de Saúde Pública de Moçambique, Francisco Mbofana, levantou preocupações de que a doença continuasse sem diagnóstico e sem tratamento. O Clube Moçambique citou-o dizendo que, muitas vezes, os pacientes aparecem pela primeira vez em centros de saúde já sofrendo de malformações de segundo grau, “com evidentes mutilações nos dedos das mãos e dos pés”.
A doença, que é transmitida por meio de gotículas do nariz e da boca, durante o contato próximo e frequente com casos não tratados, é curável com a terapia multidroga (MDT), e o tratamento precoce evita a maioria das deficiências. Desde 1995, a OMS fornece gratuitamente a MDT, graças ao financiamento inicial da Fundação Nippon, uma organização filantrópica sem fins lucrativos do Japão, ativa em muitos países em todo o mundo na eliminação da hanseníase, inclusive em Moçambique.
O tratamento MDT a que António se submete foi doado pela Fundação Nippon e está disponível gratuitamente para todos os pacientes com hanseníase em todo o país. António está na terapia há duas semanas e disse que pode relatar uma melhora.
Identificação precoce da doença por meio da educação
Ao contrário de António, Ermelinda Muelete, 23 anos, teve a sorte de ser diagnosticada precocemente, quando apareceram manchas brancas no seu corpo. No entanto, Muelete, que tomava remédios para a doença há algumas semanas, interrompeu o tratamento porque sentiu que as manchas em sua pele não desapareceriam com a rapidez desejada. Mas ela lamenta a decisão.
“Quero voltar ao tratamento”, contou à IPS no Centro Namaita, uma pequena clínica no distrito de Rapale, província de Nampula, em Moçambique. Muelete contou que, embora os membros da pequena comunidade rural não a tenham rejeitado, ela sentiu que algumas das atitudes e ações deles a discriminavam. Mas nesta quinta-feira, 26 de julho, quando uma pequena manifestação foi realizada na área para sensibilizar as pessoas sobre a doença, ela se sentiu mais confiante.
O embaixador da Boa Vontade da OMS para a Eliminação da Hanseníase, Yohei Sasakawa, visitou o Centro Namaita para avaliar como o financiamento da Fundação Nippon, da qual é presidente, tem ajudado a tratar os moçambicanos com lepra. A Fundação Nippon tem estado na vanguarda do combate à doença. Em 2013, juntamente com a OMS, realizou uma cúpula sobre hanseníase, durante a qual 17 países, que reportaram mais de mil novos casos por ano, emitiram a Declaração de Bangcoc para reafirmar seu compromisso de alcançar um mundo livre da hanseníase.
Em Moçambique, a Fundação forneceu fundos e medicamentos ao Ministério da Saúde para implementar intervenções pós-eliminação nas comunidades dos distritos endêmicos das partes central e norte do país, especialmente a busca ativa de pacientes para o diagnóstico precoce e tratamento. A iniciativa da Fundação Nippon, que começou no ano passado, continuará até 2020.
Segundo Sasakawa, o processo de diagnóstico dessa doença tem sido difícil, pois os sintomas podem levar um tempo significativo para surgirem e não são especificamente dolorosos. Esse longo período de incubação, em média cinco anos, mas em alguns casos até 20 anos, de acordo com a OMS, significa que as pessoas nem sempre procuram tratamento imediatamente. No entanto, ele desafiou as comunidades a serem vigilantes e a tentar identificar se seus parentes têm descoloração da pele, para que possam ser encaminhados a um hospital para triagem e tratamento.
“Na verdade, o surgimento de manchas brancas no corpo do paciente é uma das principais formas de suspeita, o que pode levar a um diagnóstico específico para determinar a doença”, acentuou Sasakawa. “Não demore muito com os sintomas da hanseníase, você precisa consultar um médico no centro de saúde mais próximo para receber tratamento, que é gratuito”, advertiu.
Além de fornecer dinheiro e MDT, a Fundação Nippon também apoia campanhas de conscientização pública que sensibilizam as populações locais sobre a hanseníase, explicam como identificá-la e onde receber tratamento. Nas áreas rurais, a má compreensão da doença dificulta que as pessoas a identifiquem e obtenham o tratamento necessário.
Apenas 9% dos 28 milhões de pessoas do país tem acesso à internet, de acordo com dados do Banco Mundial. Então, o evento educativo fez a diferença para Muelete. “Agora não me sinto rejeitada por causa da minha situação. Sinto-me forte para superar a discriminação e seguir em frente com o tratamento”, enfatizou.
A luta para eliminar a lepra
Sasakawa ressaltou que a Fundação Nippon tem lutado para eliminar a doença. São mais de 210 mil novos casos de hanseníase registrados em todo o mundo em 2016, segundo dados oficiais da OMS de 145 países. Moçambique foi declarado livre da lepra em 2008. No entanto, alguns anos depois, sofreu um surto da doença.
A ministra da Saúde do país, Nazira Abdula, informou que, somente nos primeiros seis meses deste ano, Moçambique registrou cerca de 951 novos casos de lepra, em comparação com 684 casos em 2017. “Os casos podem aumentar, mas estão previstas minicampanhas nas províncias que registram alguns casos de hanseníase”, declarou a ministra em seu escritório em Maputo, ao receber a delegação da Fundação.
Manuel Dias, líder comunitário em Namaita, reiterou o pedido de apoio para combater a lepra. “Pedimos ao senhor Sasakawa que continue trazendo o remédio para lepra aqui para Namaita, porque há muitas pessoas que sofrem dessa doença.” Sasakawa reafirmou seu compromisso de continuar apoiando as comunidades com vistas a erradicar a doença, particularmente nas áreas rurais.
- Reportagem adicional de Nalisha Adams, em Johanesburgo.