Sociedade

Informação ambiental: você pagaria para ver/ouvir/ler?

O jornalismo Ambiental e a Educação Ambiental formam uma dupla fundamental para a percepção da sociedade sobre as principais demandas de transformação impostas pelos limites da natureza, são duas áreas que precisam de apoio.

por Juan Piva*

A década de 1970 colocou o Meio Ambiente na pauta de conferencistas, governantes, movimentos sociais, empresários e jornalistas. Até então, imaginava-se que os recursos naturais eram inesgotáveis; a palavra “crise” era associada apenas à economia, e maluco seria quem dissesse que o país com 12% da reserva de água doce do planeta passaria, um dia, por uma escassez hídrica em seu estado mais populoso. Entretanto, a sociedade tem se conscientizado e, hoje, defender as causas ambientais não é mais coisa de “ecochato”, tornou-se responsabilidade de todos, muito graças ao Jornalismo Ambiental – mesmo com sua trajetória ainda em construção.

A promoção de ações de sensibilização ou conservação ecológica que, até pouco tempo atrás, espremiam-se nesta semana, agora acontecem o ano inteiro, e a cada novo Dia Mundial do Meio Ambiente – 5 de junho – sentimos a proximidade de sociedades mais sustentáveis. Essa data foi escolhida para coincidir com a da realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, na capital da Suécia, em 1972.

Segundo a Declaração de Estocolmo, “a proteção e o melhoramento do meio ambiente humano é uma questão fundamental que afeta o bem-estar dos povos e o desenvolvimento econômico do mundo inteiro, um desejo urgente dos povos de todo o mundo e um dever de todos os governos”. “Literalmente, a conferência iniciou um processo de transformação social em favor da natureza”, observa a educadora ambiental, Ana Lúcia Maestrello.

A Semana do Meio Ambiente, além de 5 de junho, conta com o Dia Nacional da Educação Ambiental – 03/06 -, a data foi estabelecida com a Lei 12633, em referência à abertura de outra conferência da ONU, a Rio-92. “A reunião de representantes de vários países no Brasil para discutir a problemática ecológica fez com que a Educação Ambiental e a Comunicação Socioambiental não fossem mais encaradas como assuntos da contracultura, pelo contrário, passaram a despertar o interesse público, especialmente por meio da mídia”, destaca a diretora da Maestrello Consultoria Linguística.

E esse evento veio em boa hora: de acordo com informações reveladas pela terceira publicação da série do Instituto de Estudos da Religião (Iser) “O que o brasileiro pensa do meio ambiente e do consumo sustentável” – única base de dados nesta temática no Brasil que possui uma série histórica -, em 1992, quase metade da população não era capaz de identificar um problema ambiental na sua cidade ou no país.

Jornalismo Ambiental

Porém, o cenário mudou com a informação socioambiental passando a ser considerada como assunto de interesse O Ecopúblico, na opinião dos jornalistas ambientais entrevistados pelo Blog da Maestrello para esta reportagem especial. “A democratização da informação ambiental, para mim, hoje parece irreversível graças às políticas públicas de acesso à informação e às tecnologias de monitoramento das transformações do meio ambiente. Um caso bastante notório no Brasil é a taxa anual de desmatamento, medida pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) desde 1988. No entanto, o acesso à informação por si só não garante entendimento dos problemas e questões existentes. Por esta razão, o trabalho de jornalistas e comunicadores especializados ou dedicados à questão ambiental é essencial para que os direitos ao ambiente saudável e à proteção dos ecossistemas sejam, de fato, exercidos”, comenta o coordenador do projeto InfoAmazônia, Gustavo Faleiros.

“O jornalismo ambiental contribui para informar, analisar e refletir sobre os inúmeros impactos ambientais causados em nosso cotidiano. Dessa maneira, a sociedade pode se inteirar, interferir e buscar seus direitos na busca por cidades e um mundo mais sustentáveis. Como esses temas nem sempre são abordados com profundidade pela imprensa tradicional, o jornalismo especializado tentaReinaldo Canto compensar essa lacuna”, diz o jornalista Reinaldo Canto, especializado em Sustentabilidade e Consumo Consciente, também professor de Gestão Ambiental.

Pesquisador na área de Jornalismo Ambiental, o jornalista Wilson Bueno reconhece que a problemática ecológica envolve temas complexos, multi e interdisciplinares, que nem sempre são de fácil compreensão pelo cidadão comum. “Tendo em vista a importância do conhecimento ambiental para a interpretação do mundo em que vivemos e para subsidiar políticas públicas, é indispensável um esforço coletivo para a democratização da informação ambiental. Cidadãos conscientes da relação abrangente entre cultura, sociedade, economia, política e meio ambiente contribuem para a construção de sociedades efetivamente sustentáveis, com a adoção de práticas saudáveis e comprometidas com a relação harmônica entre o homem e a natureza. E o jornalismo ambiental tem um papel fundamental neste processo de democratização e precisa ser exercido com competência e coragem, porque há interesses de toda ordem (políticos e econômicos, sobretudo) que se antepõem a este esforço de democratização da informação ambiental”, reforça o educador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo (Umesp).Wilson Bueno

“Corporações poderosas e governos omissos têm favorecido a destruição e o desperdício dos recursos naturais, a degradação das culturas e do saber tradicional, além da prevalência do interesse econômico e empresarial. A democratização da informação ambiental é vital para a reafirmação da cidadania, dos direitos humanos, da igualdade social e para a própria sobrevivência da sociedade moderna. O conhecimento da problemática ambiental representa, pois, uma etapa importante para o processo de mobilização em prol da construção de uma sociedade sustentável e, portanto, responsável, justa e democrática”, complementa o professor Bueno.

Para ressaltar a importância dos comunicadores sociais na disseminação do conhecimento socioambiental, o fundador do Instituto Envolverde, Dal Marcondes, lembra das riquezas encontradas nas terras tupiniquins. “O Brasil é um dos países Dal Marcondesdo mundo onde o termo Meio Ambiente tem mais significados. Dono de seis importantes biomas e com pouco mais da metade de seu território dentro da Amazônia, o país tem, também, quase 7,5 mil quilômetros de litoral e alguns dos rios mais caudalosos do mundo. Só isso já seria muito, mas, além disso, o Brasil é hoje um dos mais fortes produtores de commodities agropecuárias e minerais do planeta. Com uma população de 200,4 milhões de pessoas, algumas centenas de etnias indígenas, 5570 municípios e 69 regiões metropolitanas reconhecidas, nosso país tem questões ambientais urgentes que vão desde o abastecimento de água e saneamento básico, poluição urbana, coleta e tratamento de resíduos, até preservação florestal e ordenamento da pesca em oceano e rios. No entanto, se fosse eleger um problema que deve ser atacado de frente, e que ajudaria em muitos outros, é a gestão de resíduos e saneamento básico. Lixo e esgoto são os males do Brasil, como diria Macunaíma [índio representante do povo brasileiro, da obra de Mário de Andrade, que leva o nome do anti-herói]”, recorda o diretor executivo do site de Jornalismo e Sustentabilidade.

Construindo redes

“O conhecimento é o poder fundamental a ser distribuído numa democracia. E, em tempos de crise ambiental planetária, torna-se fundamental conhecer as relações humanas com a natureza mais-que-humana (porque ela nos inclui). Neste século desafiador, o jornalista ambiental tem o papel-chave de costurar informações políticas, econômicas, culturais e naturais, ligando os pontos para produzir o conhecimento sobre o nosso contexto inexorável de Vida. E dando base que a sociedade escolha rumos mais resilientes. Portanto, em pleno 2016, não podemos mais Ana Carolinaconsiderar a informação ambiental como apenas aquela que fala a um nicho de especialistas sobre a fauna e a flora. Ora, informação ambiental é toda aquela que traz o contexto natural e suas condicionantes para a Vida. Ambiente é contexto. E informação sem contexto não produz conhecimento”, pontua a jornalista Ana Carolina Amaral, mestra em Ciências Holísticas pelo Schumacher College e secretária executiva da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental (RBJA).

O editor do Programa Terra da Gente, Valdemar Sibinelli, também aponta que, em tempos de muita informação e pouca conscientização, o jornalismo é desafiado a transformar as pessoas para que se construa, de forma permanente, uma sociedade sustentável. “As informações são muitas, mas, às vezes, ineficazes. Ou pecam no conteúdo – nem sempre correto ou substancioso – ou na forma, muitas vezes desinteressante para o público-alvo. Apesar de a matéria-prima já ter alguns milhões de anos, desde que o Homo sapiens começou a povoar a Terra, ainda temos muito a aprender sobre as relações do homem com a natureza. Entender é o primeiro e essencial requisito para ser entendido – e isto serve, neste contexto, especialmente para os jornalistas ambientais”, afirma o colaborador da EPTV, emissora filiada à Rede Globo.

“A forma de transmissão de informação, pelos vários meios de comunicação, não seduz quem mais está disposto a mudanças, os jovens e as crianças. Menos tom professoral e mais ritmo de internet é o que quer a nova geração. Por sua vez, se a transmissão da informação não é tão simples quanto possa parecer em tempos de comunicação de massa instantânea, dá para imaginar a dificuldade maior que é levar o leitor/ouvinte/telespectador/internauta à reflexão e à ação. “Se uma pessoa não se dispõe a parar de desperdiçar água mesmo já sentindo a falta dela, por que se preocuparia com o perigo de a temperatura da Terra subir 2°C antes de 2100? Menos mal que o jornalista é só um dos atores desta conscientização ambiental, que deve ser preocupação rotineira nas famílias, escolas, igrejas, órgãos públicos, privados e do terceiro setor. Primeiro, muda-se o homem, e o homem muda a sociedade”, continua Sibinelli.

Vilmar BernaHomenageado pela ONU com o Prêmio Global 500 de Meio Ambiente, em 1999, o editor da Revista do Meio Ambiente, Vilmar Berna, enfatiza que a democratização da informação ambiental é uma causa. “As escolhas que fazemos em nossas vidas, seja nos hábitos de consumo, seja de cidadania e eleitorais, dependem das informações que recebemos, dos valores que abraçamos, de nossos sonhos, ideias, da exata compreensão do contexto em que nos situamos e podemos influir. Sem uma democratização da informação socioambiental, de qualidade, não manipulada pelo marketing mentiroso, em quantidade suficiente, dificilmente a sociedade conseguirá mudar suas escolhas. Não é por acaso que a mídia ambiental vem perdendo patrocínios e os jornalistas ambientais postos de trabalho. Uma boa maioria da sociedade – e mesmo os seus representantes políticos – precisa de mais informação ambiental, mas não se dispõe a pagar por ela, ou financiá-la, por que é uma informação que fala verdades inconvenientes, em vez de mentiras confortáveis. Mais que uma questão profissional ou comercial, a democratização da informação socioambiental é uma causa, uma bandeira, uma missão, onde poucos davis enfrentam gigantes golias, uma pequena e aguerrida resistência que sobrou a este modelo predatório e injusto, uma pequena esperança de que ainda poderá haver um futuro para a nossa espécie neste planeta, se formos capazes de ajudar a cidadania a despertar de seus sonhos de consumo e se fortalecer na luta contra os golias do atraso”, alega Berna, que, para não ficar só no discurso, fundou a Rede Brasileira de Informação SantilliAmbiental (Rebia).

Contudo, sustentabilidade não é obra que se acabe. Como o próprio mundo, está sempre em construção. Ou, como a
agricultura, em eterno ciclo de renovação. “O importante é o jornalista, evangelicamente, sair a semear a boa semente. Sempre haverá uma terra boa onde ela frutificará”, conclui Sibinelli, ex-editor da Revista Terra da Gente, que deixou de circular por falta de recursos financeiros e para se dedicar mais ao público internauta, em seu portal.

E você, leitor do nosso blog, vai esperar para ver outro veículo de comunicação socioambiental morrer ou irá colaborar para que nasçam outras mídias focadas na sustentabilidade do planeta? Reflita…

 *Juan Piva  –  Maestrello Consultoria Linguística