Por Raul Galhardi para a Rede de Jornalistas Internacionais –
A partir de questionamentos sobre como o jornalismo deveria tratar da crise climática de uma maneira que engaje a sua audiência, um estudo do Reuters Institute for the Study of Journalism reuniu conselhos de jornalistas brasileiros em relação à cobertura do meio ambiente. Segundo a pesquisa, três questões fundamentais devem ser respondidas pelas redações: quem deveria contar essas histórias? O que se espera que esses profissionais saibam para produzirem matérias com precisão? Como essas histórias deveriam ser contadas?
A formação jornalística
De acordo com o levantamento, é necessário formar uma nova geração de jornalistas que tenham pensamento sistêmico e entendam como as transformações em grande escala funcionam, já que a falta de compreensão da complexidade dessas mudanças pode levar à simplificação excessiva.
A cobertura ambiental também não pode mais ser feita apenas por um grupo em uma redação, mas deve estar no radar de cada jornalista, editor e publisher, o que exigirá educar profissionais em todas as áreas para que possam trabalhar juntos.
“Na grande mídia, há duas vertentes da cobertura ambiental: uma na economia, outra sobre desastres ambientais. Fora da grande imprensa temos as mídias especializadas em pautas socioambientais, que tem se fortalecido editorialmente nos últimos anos, mesmo que ainda enfrentem dificuldades para implementar modelos de negócios sustentáveis”, afirma Dal Marcondes, diretor executivo da Envolverde, primeiro portal de notícias ambientais do Brasil.
Kátia Brasil, editora executiva da Amazônia Real, afirma que a crise financeira das empresas jornalísticas acabou eliminando aos poucos correspondentes na região Norte, o que resultou em uma cobertura da Amazônia muito distante dos acontecimentos, além de ter afastado os especialistas em meio ambiente dos grandes jornais. “É preciso começar tudo de novo”, diz.
Segundo Marcondes, os jornalistas que decidem se dedicar à pauta ambiental normalmente o fazem por conta própria, buscando qualificação em universidades, congressos, eventos, em redes de jornalistas especializados ou em períodos de trabalho em mídias independentes da área.
Para resolver essa falta de preparo dos profissionais midiáticos, o estudo recomenda o consumo de workshops, seminários e palestras disponíveis em diversos meios, assim como a criação de treinamentos específicos dentro das redações. Onde não existir verba para a contratação de especialistas, a realização de parcerias com mídias independentes de nicho é uma alternativa. No entanto, para Brasil, isso ainda é algo incipiente no jornalismo brasileiro.
“A Amazônia Real é uma agência de notícias cujo conteúdo pode ser republicado por qualquer mídia. Temos parcerias com outros veículos independentes e o nosso conteúdo é republicado em mais de 180 países”, explica Brasil. “Agora pergunto: você vê alguma matéria nossa republicada na Folha de S. Paulo, no Estadão ou no Globo? Eles preferem que um jornalista deles vá para a Amazônia fazer uma matéria pontual”.
Jornalismo de soluções
Segundo os especialistas entrevistados pela pesquisa, uma cobertura apenas negativa do meio ambiente gera desespero e sensação de impotência por parte do público, o que leva à negação da realidade. Uma alternativa à essa abordagem seria baseada no “jornalismo de soluções” (SoJo), ao dar perspectivas e mostrar o que não funciona em equilíbrio com soluções que inspirem as pessoas.
Eles argumentam que as histórias feitas sob esse viés são mais profundas e abrangentes do que aquelas que apenas destacam o problema. Elas criam conexão com as comunidades e estimulam sentimentos de esperança, fornecendo informações sobre abordagens alternativas para problemas sociais com base em iniciativas que mostram resultados.
“Eu gosto de apresentar um viés de solução e não apenas de denúncia. Apontar malfeitos é papel do jornalista, mas para todo malfeito é preciso ter uma alternativa de acerto”, considera Marcondes. “O jornalismo do século XXI não pode mais apenas olhar o que já aconteceu, mas é preciso apontar os caminhos do amanhã”. Para ele, o público gosta de pautas ambientais, mas não de matérias “catastrofistas”. “Quando você aponta soluções, cases de organizações, empresas ou políticas públicas inovadoras e que estão resolvendo problemas, isso vende”.
Para a editora executiva da Amazônia Real, é preciso investigar e contar histórias de perto dos acontecimentos, com profundidade, mesmo que sejam catástrofes, com uma cobertura “de dentro para fora” das comunidades e regiões mais distantes dos grandes centros urbanos. “Dessa forma, cria-se muita conexão com o público”, argumenta Brasil.
Dicas para jornalistas
Por fim, o estudo do Reuters Institute elenca uma série de sugestões tanto para editores quanto para repórteres que desejam cobrir o meio ambiente. Eis algumas delas:
– Contrate equipes com diferentes conhecimentos;
– Treine regularmente as equipes;
– Incorpore o jornalismo de dados;
– Esteja aberto a outros formatos e conte histórias com imagens;
– Simplificação requer maestria no assunto;
– Torne os problemas tangíveis e crie conexões;
– Vá além dos critérios ESG (“environmental, social and governance”);
– Lembre-se: você não é um ativista.
#Envolverde