Por Claudio Fonseca*
Em meio a um debate em que questões estruturais ficaram em segundo plano, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou no último dia 25 de agosto o Plano Municipal de Educação (PME), um conjunto raso de metas e diretrizes que nortearão a educação pública da cidade nos próximos dez anos.
Grupos em “defesa da família” e movimentos sociais “progressistas” monopolizaram a “disputa” e a questão de gênero protagonizou o debate. A inclusão ou não da palavra e o detalhamento da forma como deverá ser tratada em sala de aula não é assunto de menor importância, mas, não é também questão com a qual seria preciso gastar tanto esforço. Os profissionais da educação já sabem como pedagogicamente reconhecer diferenças e educar contra qualquer forma de discriminação.
Enquanto isso, pontos fundamentais como a universalização do acesso, o financiamento e as quantidades de alunos por sala ficaram sem a discussão necessária. Como resultado, metas e estratégias irrisórias para os problemas educacionais da cidade.
Para falar de financiamento é preciso lembrar que, em 2001, foi reduzido de 30% para 25% o montante de recursos do município destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino, especificação de investimento que, seguindo os artigos 70 e 71 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), inclui, entre outros pontos, remuneração e capacitação de professores. Os 5% deduzidos passaram a ser investidos naquilo que o poder público classificou como “gastos com educação inclusiva”, que não são, como pode parecer, políticas voltadas ao aluno como deficiência, mas sim gastos com políticas compensatórias, como o “Renda Mínima” e o “Leve Leite”.
De 2001 para cá, o montante total subiu para 31%, sendo 6% pra a tal educação inclusiva. O texto aprovado amplia o investimento para,no mínimo, 33% da receita, sem identificar, no entanto, qual o percentual destinado à manutenção e desenvolvimento do ensino. Desta forma, autoriza os governos a se apropriarem de mais 2% de receitas da educação para as políticas de inclusão.
É frustrante também a negligencia em relação à quantidade de crianças por educador na rede.A superlotação das salas é um agravante das precárias condições no funcionamento das escolas, inclusive para a saúde dos profissionais e o aprendizado dos alunos. O PME reforça os quantitativos que já constam na portaria de organização de escolas. Não há diminuição progressiva para os Centros de Educação Infantil (CEIs). Nas demais etapas, há uma redução de somente dois alunos por sala paraos próximos dez anos, o que será atendido sem esforço algum, no decréscimo orgânico da população.
Outra questão que devemos temer é o aumento da permissão dos convênios. Hoje 2/3 dos CEIs da cidade são convênios e terceirizações. Seria irresponsável crer no fim imediato deste modelo, que têm sido inclusive ampliado na gestão atual. Mas, no prazo de vigência do Plano, o poder público não só precisa se planejar como atender ao comando constitucional da educação pública gratuita e de qualidade para todos, expandindo a rede física escolar e extinguindo os convênios que, no geral, implicam no atendimento em instalações inadequadas com profissionais sem direitos de carreira e formação adequada.
São modestas também as metas de redução do déficit escolar. A educação infantil não está universalizada em São Paulo. A rede pública é a que tem maior índice de atendimento, porém não ultrapassa 27% da demanda nessa etapa escolar. Atingir 75% da demanda como o Plano prevê diz muito do pouco empenho do poder público para resolver esta questão estrutural.
Ao cabo, estas questões ficaram encobertas pela cortina de fumaça da discussão sobre gênero e sexualidade. O Governo não reconhece que vivemos a era da robótica, da informática, da microeletrônica, e que precisamos modernizar as nossas escolas e dar aos nossos profissionais condições de educar, incentivando e valorizando os direitos humanos e a diversidade. O PME, infelizmente, resultou mais em um programa de governo do que numa necessária Política de Estado. (#Envolverde)
* Claudio Fonseca, 59, é vereador pelo PPS na Cidade de São Paulo e presidente do Sinpeem – Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo.
** Publicado originalmente no site Folha de S. Paulo.