Na última quarta-feira, 18/11 seria realizada a primeira audiência da ACP – Ação Civil Pública, ajuizada pelo IDESC – Instituto Humanizar, contra a poluição ambiental provocada pelos produtos plásticos fabricados, comercializados e/ou distribuídos com material oxidegradável, como se fossem biodegradáveis. Diversas empresas são rés nessa ação: Altacoppo; Arcos Dorados (Mc Donalds); Casas Bahia (Via Varejo); Copobras; Eco Ventures (GoGreen P-Life); Lojas Americanas; Plaslix; Res Brasil (D2W); Strawplast; Supricorp (Gimba) e World Post, além da participação do Ministério Público e da Advocacia Geral da União (AGU). No entanto, a audiência acabou sendo adiada menos de 24 horas antes de sua realização. Também uma das empresas rés ingressou com pedido de tutela de urgência, para que esta Ação Civil Pública transcorra em segredo de justiça.
Para explicar os detalhes destes eventos e outras informações relevantes sobre esta Ação, entrevistamos o cientista social e Presidente do IDESC, Plínio da Franca:
Primeiramente, qual o objeto central desta Ação Civil Pública?
Essa ACP versa basicamente sobre a poluição e danos ambientais provocados pelos plásticos oxidegradáveis, que são potenciais geradores de microplásticos capazes de contaminar e poluir todo ecossistema e provocar prejuízos à saúde humana. Além disso, as empresas arroladas na ação incorrem no crime de greenwashing (propaganda ambiental enganosa), pois afirmam que seus produtos plásticos oxidegradáveis, seriam biodegradáveis e portanto benéficos ao meio ambiente, o que é de acordo com diversos estudos, uma falsa alegação.
Quais foram os motivos do adiamento da primeira audiência desta ACP que ocorreria em 18-11-20, agora transferida para o dia 03 de fevereiro do próximo ano de 2021?
As Casas Bahia, uma das rés, foi citada para comparecimento à audiência no dia 04/11, ou seja, nove dias úteis antes da audiência. Porém, o art.334 do Código de Processo Civil determina o prazo mínimo de 20 dias úteis. Diante desse erro administrativo, o juiz, para evitar qualquer tipo de nulidade no processo e cumprir a lei, adiou a audiência.
Sobre o pedido feito por parte de uma das Rés, de que esta Ação Civil Pública trâmite em segredo de justiça, além de exigir que seja retirada das mídias do IDESC qualquer manifestação sobre a Ação. Poderia nos explicar melhor essa questão?
O que a empresa Eco Ventures, autora do pedido para que a ACP tramite em segredo de justiça pretende é obviamente “esconder” da sociedade as informações e os documentos existentes na Ação, pois assim podem continuar comercializando impunemente seu material oxidegradável. Sabemos que no Brasil a justiça costuma ser lenta e este tipo de manobra normalmente visa apenas “ganhar” tempo e impedir a divulgação pública de informações do processo. Veja o exemplo desta própria Ação, em que ingressamos no dia 10 de julho de 2020 e, com o adiamento, a primeira audiência só deverá ser realizada no dia 03 de fevereiro de 2021, ou seja, praticamente sete meses depois. Em relação aos materiais relacionados a esta Ação divulgados no site e mídias sociais do IDESC, a empresa Eco Ventures também pretende com este pedido que os mesmos sejam retirados e proibidos de serem veiculados, sob a alegação de manchar a imagem da empresa. No entanto, é preciso esclarecer que antes de tomar a decisão de ingressar com essa ACP, estudamos com profundidade os materiais publicamente disponíveis em âmbito nacional e internacional, tais como: pesquisas, estudos, publicações diversas de universidades nacionais e internacionais, entre outros. Além de conversamos e coletarmos informações com especialistas, técnicos e pesquisadores acadêmicos para entender causas e processos dos impactos negativos gerados por esse material oxidegradável. O que veiculamos é apenas parte do vasto rol de informações disponíveis nos sites, blogs, jornais, revistas, programas de TV, anais de congressos científicos, etc. Se alguém ainda tem dúvida, basta acessar a farta documentação probatória anexada a Ação. Porque somente agora, que terão de responder e provar perante a justiça e a sociedade em geral as suas más condutas e práticas, é que estas empresas se sentem prejudicadas em sua imagem e seus aspectos financeiros? Por acaso também irão pedir para “censurar” todas as publicações existentes na internet que afirmam a mesma coisa que estamos alegando nesta Ação?
Caso este pedido da empresa Eco Ventures, para que a ACP corra em segredo de justiça, quais seriam as possíveis consequências disso no que se refere ao acesso de informação para a sociedade? Qual será a posição do IDESC diante deste fato?
Primeiramente, é importante ressaltar que, apesar do pedido ter sido feito somente por uma das rés (Eco Ventures), se acatado tal pedido pelo juiz do segredo de justiça na Ação, todas as demais rés também serão beneficiadas. Mas fazendo uma análise do novo Código do Processo Civil e suas inovações, quanto à adoção pela Justiça de impor segredo em um processo, na minha visão, esse pedido não se encaixa nessa ACP. O segredo de justiça é quando há risco de expor informações privadas do réu ou do investigado e quando o processo contém documentos sigilosos, como escutas telefônicas e extratos bancários. Por isso iremos nos manifestar oficialmente nos autos do processo, sendo que a íntegra deste documento estará em breve disponível no site do IDESC (https://www.institutohumanizar.org.br/)
Também para nossa satisfação estamos recebendo a cada instante diversas manifestações de apoio de pessoas e instituições identificadas com as causas ambientais, entidades, organizações, parlamentares e sociedade em geral. É muito perceptível a crescente repercussão e apoio a esta ACP, inclusive essa própria entrevista é prova disso. Assim como a publicação do dia 17/11 registrando o apoio a ACP do Presidente da Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados o nobre deputado Rodrigo Agostinho e, também, do nobre membro da referida Comissão deputado federal Nilto Tatto. Na função de cientista social, até pondero que esse pedido de cercear o direito de divulgar informações sobre a Ação e, pior ainda, “esconder” da sociedade algo de interesse público por meio do mecanismo de segredo de justiça, é uma afronta à democracia e um desrespeito à sociedade, que tem o direito garantido pela Constituição Federal, diga-se de passagem, de saber o que se passa com relação aos fatos e eventos relacionados, devidamente fundamentados nos documentos anexados à ACP e, provas contundentes, de origens fidedignas.
Para aqueles que ainda não conheciam o IDESC, o Sr. poderia nos contar um pouco sobre o histórico de vocês com a causa ambiental no Brasil.
O IDESC foi constituído no ano de 2008 por pessoas identificadas com causas ambientais, o que trouxe como consequência natural ações e projetos voltados à proteção e preservação do meio ambiente. Porém, já atuo e milito há muito mais tempo nesta área, podendo citar como exemplos, minha participação no desenvolvimento e coordenação do Projeto de Zoneamento Ecológico Econômico à gestão ambiental do setor de reparação automotivo de Belo Horizonte – MG, realizado para a Secretaria Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais e associação do setor, trabalho esse que culminou no Projeto de Gestão Ambiental do Setor Automotivo de Minas Gerais. Atuei como consultor para a Secretaria de Meio Ambiente e CODEMA, além de prestar consultoria por mais de 18 anos para Companhias estaduais e municipais de Saneamento em Minas e São Paulo. Tenho a grata honra de ter sido eleito delegado, pelo setor empresarial de Minas Gerais no período de 2005 a 2007, para colaborar na construção das Políticas Públicas Nacionais do Meio Ambiente – PNMA/MMA, com seis emendas aprovadas na construção das Políticas Públicas Nacionais do Meio Ambiente, na IIª Conferência Nacional do Meio Ambiente do MMA. Também fui eleito relator dos Grupos de Trabalho de Mobilização Social e de Cidades Sustentáveis do Fórum Estadual pela construção da Agenda 21 em Minas Gerais de 2004 a 2006.
Para finalizar, qual a importância do apoio e participação da sociedade civil nesta Ação Civil Pública contra os plásticos oxi”bio”degradáveis?
É fundamental. Pois atualmente as empresas já perceberam a necessidade de serem reconhecidas no mercado como ambientalmente “corretas” e ou sustentáveis. Com isso, devemos ter cada vez mais produtos e serviços que se apresentarão como “soluções” ambientais e/ou não poluentes. E esse movimento, que me parece irreversível, é altamente desejável em uma sociedade que busca o desenvolvimento sustentável, devendo ter o apoio de todos. Por outro lado, devemos ser absolutamente contrários a qualquer prática de greenwashing, que se trata apenas de uma estratégia de marketing para “colar rótulos” positivos do ponto de vista ambiental nos produtos que comercializam, como o de ser “biodegradável”, que é o caso das empresas rés da nossa Ação Civil Pública, quando na realidade não possuem tal “qualidade”, induzindo o consumidor ao erro e potencializando os riscos de danos ambientais. Somente com a vigilância da sociedade em geral e a criação de leis criteriosas é que evitaremos essa prática em nosso país, inibindo e banindo do mercado as empresas que agem dessa forma nefasta cujo único objetivo é lucrar na “onda da economia verde”, sem de fato se preocuparem com os impactos ambientais gerados por seus produtos.
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