Por Olhar Animal –
Fogos de artifício são tradição em festividades brasileiras. Na Copa do Mundo, os estouros no céu sinalizam a comemoração pela vitória da seleção do Brasil e a esperança pelo tão sonhado hexacampeonato. Entretanto, o que é festa para alguns, para outros pode significar pânico. Os cachorros, por exemplo, têm a audição mais sensível do que a dos humanos e podem ter ferimentos graves por causa do susto ou mesmo passarem mal por conta dos estrondos.
Lindiane Samayana, diretora do Serviço Público Veterinário do Distrito Federal (Hvep), conta que o mais comum nos bichinhos, nessas situações, são as lesões neurológicas, como convulsões. “Os cães têm, em média, 60% mais audição do que nós, humanos. Além das convulsões, que acometem principalmente os animais que têm epilepsia, o susto pode causar parada cardiorrespiratória”, explica. Ela conta que, nas festividades de fim de ano e nos jogos de futebol, os acidentes se tornam mais recorrentes. “Também atendemos muitos casos de atropelamento de animais que fogem de casa por causa dos fogos. Oito a cada 10 cães são muito sensíveis ao som dos fogos de artifício e, consequentemente, mais suscetíveis a acidentes”, assinala.
Samayana lembra que há campanhas de conscientização acerca do problema, organizadas pela sociedade civil, e formas de se prevenir para que o pior não ocorra. “Na ocasião que houver fogos de artifício, é indicado que se deixe o animal em lugares fechados, como banheiros e quartos, além de vedar as janelas.Os de menor porte podem ser colocados em caixas de transporte, dica que também é válida para felinos, embora acidentes desse tipo envolvendo gatos sejam menos comuns”, aconselha a diretora do Hvep. No caso de cães que têm epilepsia ou que tenham maior sensibilidade ao barulho, é preciso levar ao médico veterinário para a prescrição de calmante.
Além dos cuidados recomendados por Lindiane, a médica veterinária Joana Barros frisa que a importância de não deixar os animais sozinhos quando eles estiverem assustados com o barulho dos fogos de artifício, principalmente aqueles que foram resgatados e têm traumas de maus tratos. “Colocar uma música ambiente também pode ajudar no momento”, afirma.Há, ainda, indicação de um chá de camomila para os animais tomarem, aos poucos, ao longo do dia. Se o cão tiver alguma comorbidade, é necessário o acompanhamento veterinário.
Tragédia
A designer gráfica Fernanda Guimarães, 29, viveu o terror que todo tutor de pet teme. Na noite do segundo turno das eleições, em 30 de outubro, seus dois cachorros fugiram assustados da chácara onde ela e o noivo, Ecktor Lopes, viviam por causa dos fogos de artifício. Simba, que tinha quatro anos, foi atropelado e não resistiu ao procedimento cirúrgico. O irmão, Shrek, da mesma ninhada, também se machucou na fuga. O pulmão do bichinho se rompeu, vazou ar para a caixa toráxica e teve que passar uma semana em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Hoje passa bem, apesar do trauma. “O Shrek ainda fica muito assustado com barulhos mais fortes, como trovões. Ele se treme todo. Por conta da falta que sente do irmão, ele passou dias com dificuldade para se alimentar”, conta a designer.
Fernanda se considera protetora independente de animais e costuma compartilhar nas redes sociais conteúdos que alertem sobre os perigos dos fogos de artifício. Todos os procedimentos pelos quais os dois cachorros tiveram que passar custou R$ 15 mil. Por meio de doações, parte da quantia foi quitada, faltando ainda R$ 3 mil a serem pagos. Quem estiver interessado em contribuir, pode achar o link da vaquinha on-line no perfil do Instagram @fe.og.
O que diz a lei
Segundo a legislação do Distrito Federal (Lei Distrital nº 6.647/2020), são proibidos o manuseio, a utilização, a queima e a soltura de fogos ou qualquer artefato pirotécnico que produza estampidos. Nesse contexto e em virtude da inércia do governo, foi proposta ação civil pública (processo nº 0710212-81.2021.8.07.00018) objetivando cobrar do governo a aplicação da lei. Embora tenha sido concedida medida liminar determinando o cumprimento imediato da legislação pelo governo do Distrito Federal, a liminar atualmente está suspensa em virtude de decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça. Em sua defesa, o governo alega que a principal dificuldade da aplicação da lei é a fiscalização. Em nota, a Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF) informou que “os efeitos da decisão estão suspensos em razão de liminar e da Sentença n° 3.102 no Superior Tribunal de Justiça (STJ).”
O presidente da Comissão de Proteção e Defesa dos Direitos dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil do DF (OAB-DF), Arthur Regis, afirma que o GDF desrespeita o ordenamento jurídico. “Os fogos com estampidos podem inclusive levar animais a óbito, além de também prejudicarem várias pessoas em situação de vulnerabilidade”, declara. “O Distrito Federal não pode ignorar, não cumprir ou violar a própria legislação distrital. A postura do governo é lamentável e, infelizmente, também viola frontalmente a dignidade animal”.
Atendimento
O atendimento no Hvep ocorre entre 8h e 15h todos os dias, incluindo fins de semana. A triagem começa às 7h30. Nos dias que houver jogos do Brasil na Copa do Mundo, haverá menos atendimentos do que o usual. Nos feriados, o hospital não funciona.
Por Naum Giló
Fonte: Correio Braziliense