Assisti estes dias o programa ‘Cidades& Soluções’ liderado pelo jornalista ambientalista André Trigueiro. O tema era Cop30 e ele convidou três debatedores, a Ana Toni, que ocupa a primeira posição na Secretaria de Mudanças Climáticas do MMA; o filósofo Cortella e se não me falha a memória, Sérgio Andrade, apresentado como executivo do Relatório dos ODS.
A pergunta base era: o que avançou desde o ‘Acordo de Paris ‘ que completará 10 anos, e o que esperar do encontro de Belém?
Como balizas para a avaliação, ofereceu-se três ‘escoras’:
– o tempo – por que o sentido de urgência está sendo abandonado? E não é o Trump sozinho… o povo da nação mais poderosa do Ocidente votou nele, conhecendo seu negacionismo.
– conjuntura: uma década se passou e uma crise mundial ainda paira após pandemia, conflitos armados, recessão econômica e inflação em vários países.
– por que as evidências (agravamento dos fenômenos climáticos) não estão disparando ações compatíveis por parte seja dos governos, dos políticos, dos empresários e da sociedade civil?
Naturalmente são perguntas que demandariam de cada debatedor longas explanação para um programa de meia hora.
Então vamos aos highlights anotados por mim:
Ana Toni: a transição energética já é realidade e inevitável, basta contabilizar investimentos, mudanças sensíveis na matriz energética dos países da OCDE, China e Brasil, por exemplo; portanto, escala já tem, falta acelerar a descarbonização.
Brasil: tem condições de liderar a COP mas nenhum país avançará sozinho. Há que ter uma mobilização dos governos subnacionais. Trump não poderá deter o que alguns estados americanos já fazem.
Sérgio Andrade: os indicadores econômicos do Brasil são bons e houve avanços em alguns ODSs: mortalidade infantil e materna, acesso global à energia (hoje na casa dos 91%), mas sublinhou que há aspectos críticos a observar na produção e distribuição de alimentos. Há fome e isso é inaceitavel.
No aspecto da consciência sobre a importância da sustentabilidade reconhece que houve avanço conceitual mas que em termos de ações estamos ainda longe das metas do milênio.
Na contabilidade geral, considerando os 17 Objetivos, verifica-se o cumprimento de cerca de 40%. No Brasil essa percentagem está em torno de 19%.
Cortella: Fez a meu ver uma das melhores perguntas da noite: ‘O que nos falta saber’ para que tomemos as devidas providências?’
Segundo o filósofo, a certeza científica e a linguagem técnica que cerca a questão da Emergência Climática não foram devidamente traduzidas para os corações e mentes da opinião pública.
Segundo ele, existem distrações demais da nossa atenção (pandemia, por exemplo) e falta uma ‘erotização ‘ do tema. A catástrofe exaure em vez de mobilizar a energia do desejo.
E ele ainda concluiu dizendo que as mudanças climáticas não são trágicas, mas dramáticas.
Acentuou didaticamente a diferença entre uma e outra. Enquanto a tragédia, no sentido grego, fala da intervenção dos deuses no destino dos homens, o drama é conosco: somos nós que temos de enfrentar nossas próprias mazelas.
Identificou o momento atual da história humana como uma ‘luta tanática’ em que o ser humano pode sim criar as condições de sua própria extinção.
Ou seja, drama, drama, drama…
Tanathos, Eros, e a jornada do Herói.
Só faltam 8 meses para Belém.
* foto: na minha modesta percepção, pode não ter Eros, mas temos compaixão. Eu morro de tristeza quando vejo imagens assim.
* Samyra Crespo é ambientalista, coordenou a série de pesquisas nacionais intitulada “O que o Brasileiro pensa do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável” (1992-2012). Foi uma das coordenadoras do Documento Temático Cidades Sustentáveis da Agenda 21 Brasileira, 2002. Pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins/RJ. Ex-Gestora do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.