A conservação da Amazônia tem muitas motivações, algumas de natureza subjetiva e outras de caráter objetivo. No imaginário coletivo, a Amazônia é o lugar dos mistérios, com suas florestas infindas e seus muitos povos indígenas – algumas dezenas dos quais ainda não contatados. Sua complexidade e mistérios despertam uma atitude de proteção e cuidado em todo o Brasil e no mundo.
Há, também, um outro conjunto de justificativas de caráter racional e objetivo para a conservação. Existe uma geodiversidade enorme, com grande potencial para a indústria mineral. Temos na biodiversidade amazônica um potencial significativo de desenvolvimento de remédios para doenças, cosméticos e de outros produtos para mais diversos fins. A riqueza dos produtos florestais madeireiros e não madeireiros tradicionalmente possuem valor econômico.
De uma forma simplificada, podemos dizer que a floresta funciona como uma usina de processamento de água. Suga, como se fosse uma enorme bomba, a umidade do Oceano Atlântico. A chuva que cai na região leste é amortecida por uma complexa esponja florestal composta pelas folhas, galhos, troncos e o solo, rico em matéria orgânica, minhocas e milhões de outros pequenos animais. A água que cai rapidamente se transforma em vapor d’água, que sai enriquecido por compostos químicos, denominados de compostos orgânicos voláteis.
Estes compostos funcionam como aceleradores da formação de novas chuvas, atuando nas nuvens de baixa altitude. As chuvas de segunda geração repetem o mesmo processo daquelas que iniciaram o processamento da água, desde o litoral do Oceano Atlântico até as encostas da Cordilheira dos Andes.
No meio desta caminhada, a floresta produz alguns jatos que levam o excesso de umidade para fora da Amazônia. Este fenômeno, chamado de jatos de baixa altitude, levam bilhões de metros cúbicos de água para o sudoeste (Chaco argentino e paraguaio) e sudeste da América do Sul (sul, sudeste e centro-oeste brasileiro). Ao longo do ano, a umidade exportada pela Amazônia para outras regiões é da ordem de 1,7 trilhões de metros cúbicos de vapor d’água, segundo estimativa do professor Eneas Salati.
Podemos dizer que a chuva que cai nas demais regiões do Brasil é significativamente influenciada pelo processamento de água feito pela floresta amazônica. Se constatarmos que a chuva é essencial para alimentar as plantas da nossa agricultura e pecuária e encher os rios que abastecem nossas cidades e as usinas de geração de energia elétrica, podemos dizer que a Amazônia é essencial para o Brasil. Por isso, devemos valorizar economicamente os serviços ambientais prestados pelas nossas florestas para o restante do país.
* Virgílio Viana é superintendente geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS) e coordenador da rede SDSN-Amazônia.
** Publicado originalmente no jornal Diário do Amazonas, no dia 15 de maio de 2014 e retirado do site Mercado Ético.