San Cristóbal de las Casas, México, 27/9/2012 – A pobreza em que viverão suas filhas ou seus filhos é uma razão pela qual as indígenas do Estado mexicano de Chiapas, no sul, buscam interromper a gravidez. O atraso econômico e social em que vivem as mulheres indígenas repercute de maneira negativa no exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos, os DSeR, explicam ativistas dos direitos das mulheres no Estado. Elas desconhecem que têm direito a praticar um aborto legal e diante da falta de infraestrutura médica em suas comunidades, ou dos maus-tratos por parte do pessoal da saúde, recorrem à medicina tradicional ou interrompem a gravidez em lugares inseguros, colocando suas vidas em risco.
A situação se complica quando 17 dos 32 Estados mexicanos reformaram suas constituições para “proteger a vida desde a concepção-fecundação”, o que derivou na restrição das causas legais de aborto e na criminalização das mulheres que o praticam. Isto ocorreu como reação promovida pela Igreja Católica e por setores políticos e sociais conservadores à aprovação no Distrito Federal de uma lei que desde 2007 despenaliza a interrupção voluntária da gravidez até 12 semanas de gestação.
No dia 28 é celebrado o Dia pela Despenalização do Aborto na América Latina e no Caribe, que acontece desde 1990 como um acordo do Quinto Encontro Feminista da América Latina e do Caribe. O objetivo é impulsionar ações para que as mulheres tenham acesso a abortos legais e seguros. Segundo o Grupo de Informação em Reprodução Escolhida, nas entidades do sul do país – onde há mais população indígena –, 25 a cada mil mulheres têm um aborto induzido. Chiapas é claro exemplo da marginalização e da falta de direitos que sofrem as indígenas.
Alejandro Rivera, do Coletivo Integral para a Família, contou que as mulheres rurais e indígenas na entidade contam com informação muito limitada sobre DSeR, bem como acesso restringido aos serviços de saúde. “Se elas procuram os serviços de saúde, há estigma e discriminação por sua condição de indígena, mulher e jovem”, acrescentou. O Conselho Estatal de População informa que quase metade dos adolescentes de Chiapas (43,7%) vive em áreas rurais, onde pouco ou nada se conhece sobre o uso de anticoncepcionais. Na entidade, somente 5% da população usa camisinha.
A Pesquisa Nacional da Dinâmica Demográfica 2009 indica que, do total de mulheres com 15 anos ou mais no Estado, 71% têm pelo menos um filho nascido vivo. Há regiões que colocam Chiapas com a taxa de fertilidade mais alta do país, com 4,6 filhos. Ao mesmo tempo, em dez anos, a morte materna não diminuiu de modo significativo, enquanto a taxa de gravidez na adolescência aumentou.
Para praticar um aborto as mulheres indígenas, pobres e marginalizadas de Chiapas recorrem às ervas ou aos conselhos de suas conhecidas. No México, a interrupção da gravidez é legal sob três condições: violação, risco de morte da mulher e más formações congênitas graves. Contudo, Chiapas é um dos 17 Estados que “protegem a vida” em suas constituições regionais. O Centro de Direitos da Mulher indica que 88 em cada cem habitantes do Estado vivem em alta e muito alta marginalização. As mulheres indígenas e rurais são as mais afetadas, já que têm altos índices de analfabetismo e desigualdade nos acessos aos serviços básicos de saúde, educação e direito à propriedade.
Olivia Velázquez, ativista e defensora dos DSeR, afirmou que o tema do aborto nas comunidades indígenas se aborda “com muita naturalidade”, acrescentando que “as mulheres falam de ações para acabar com a menstruação, sobretudo aquelas que já tiveram mais de três filhos e têm jornada extenuante de trabalho. Até há alguns anos, era comum as jovens recém-casadas ou amigadas buscarem um aborto”.
A indígena Martina Sántiz é uma das mulheres marginalizadas que tentaram abortar diante de uma gravidez indesejada. Moradora em Peña María, perto de San Cristóbal de las Casas, acaba de ter seu sexto filho. Os cinco primeiros são de seu ex-marido, que está preso por homicídio. Sántiz iniciou uma nova relação e teve uma gravidez não desejada. “Não tomava pílula nem nada, porque na minha comunidade não tomamos pílula, mas também não é visto com bons olhos pedir para os homens usarem camisinha. Não queria ter outro filho porque teria que deixar meu trabalho, com o qual pago meu quarto”, contou.
Esta mulher, de 29 anos, dedicada ao trabalho da casa ou à venda de plantas como o cacto, decidiu recorrer ao aborto, por isso procurou uma vendedora de ervas que lhe deu três chás e massagens. Mas não surtiram efeito, porque já estava grávida de quatro meses. Ao completar os sete meses, Martina deixou de trabalhar e colocou para trabalhar quatro de seus filhos pequenos, para que ajudassem no aluguel e na comida. Teve que pedir emprestado para pagar a parteira de sua comunidade. Em agosto passado nasceu seu sexto filho. Envolverde/IPS
* Este artigo foi publicado originalmente pela agência mexicana de Notícias de Comunicação e Informação da Mulher AC, Cimac.