Atlanta, Estados Unidos, 30/11/2012 – Quando na década de 1980 surgiu o HIV/aids, o estereótipo de uma pessoa que vivia com esta doença nos Estados Unidos era um homem branco, jovem ou de meia idade e homossexual. O estigma persistiu durante décadas, embora hoje inclua pessoas de outras etnias. Contudo, na realidade, quase a maioria dos que vivem com HIV (vírus da deficiência imunológica humana, causador da aids) nos Estados Unidos são muito mais velhos, entre eles muitos convivem com a doença há 20 ou 30 anos, outros que a contraíram em idade avançada e os que podem tê-la contraído sem saber por muito tempo.
Novos estudos mostram que mais da metade dos habitantes dos Estados Unidos com HIV ou aids (síndrome da deficiência imunológica adquirida) terão 50 anos ou mais até 2015. “Tantos esforços tradicionais de prevenção do HIV estão dirigidos a jovens e adolescentes”, que as pessoas de mais idade “podem acreditar que não correm risco, embora estejam sexualmente ativas”, disse à IPS o diretor executivo da Georgia Equality, Jeff Graham.
Vários fatores contribuem para esta mudança demográfica: melhoria nas terapias contra a aids, que permitem viver mais tempo; avanço das medidas educativas e de prevenção dirigidas aos mais jovens, como a difusão do uso de camisinha; e o envelhecimento da população norte-americana em geral. “Em certas áreas do Estado da Flórida, foi registrado aumento de aposentados com HIV positivo pela primeira vez e que não pensam que podem estar em risco de contrair qualquer tipo de doença sexualmente transmissível ou HIV”, indicou Graham.
Um estudo de 2006 com mil pessoas, com idades em torno dos 50 anos que viviam com HIV na cidade de Nova York, ajudou a inspirar o projeto artístico The Graying of Aids (O Envelhecimento da Aids), que expõe, mediante fotografias e entrevistas, relatos de idososna primeira pessoa. O projeto começou como um ensaio de Katja Heinemann na revista Time, e depois se converteu em um site e uma exibição na última conferência mundial sobre HIV/aids realizada em Washington. Naomi Schegloff é sua atual codiretora.
Um motivo pelo qual os idosos tendem a não se ver em situação de risco é que muitas campanhas de saúde pública estão dirigidas a pessoas mais jovens, tanto nos Estados Unidos quanto no resto do mundo, explicou Schegloff à IPS. “Em muitas culturas, as pessoas não querem admitir que os idosos fazem sexo”, detalhou. A tendência para a invisibilidade dos idosos que vivem com HIV se reflete inclusive na maneira como são obtidos dados estatísticos em todo o mundo.
“É muito desigual a forma como se registra o espectro de idades. Em muitos lugares, as estatísticas só chegam até os 49 anos”, pontuou Schegloff. “É verdade que no início da epidemia ninguém sonhava que as pessoas infectadas viveriam tanto, que passariam dos 30 anos e envelheceriam com o HIV”, acrescentou. Estas pessoas “estão vivendo muito mais, e isso é maravilhoso. Algumas com as quais falamos têm HIV quase desde o começo”, afirmou.
Um dos desafios específicos dos idosos com HIV/aids é que também podem ser medicados para outras doenças, frequentemente associadas com a idade. “Muitos estudos sobre medicações se baseiam na premissa de que esse é o único remédio que tomam”, alertou Schegloff.
Segundo Graham, “outro dos desafios para os idosos que vivem com HIV é que têm mais probabilidades de sofrerem doenças como diabete, problemas cardíacos, pulmonares ou outras, que tendem a afetar os mais velhos. IsTo significa mais medicamentos para tomar e a necessidade de estar a par dos efeitos secundários e das interações dos diferentes remédios”.
Não há muitos estudos sobre o assunto, acrescentou Graham, e os que fornecem cuidados médicos e “têm experiência com pacientes idosos, podem não ter conhecimento em HIV”. Também pode ocorrer que “uma pessoa viva em algum tipo de comunidade para idosos e se sinta adicionalmente isolado e estigmatizado por ter HIV. Não há o mesmo tipo de redes de apoio disponíveis para os idosos como para os jovens ou de meia idade”, acrescentou.
Pode ocorrer que os médicos que atendem pacientes idosos nem mesmo pensam em realizar exame de HIV, embora tenham sintomas que em alguém mais jovem indicaria esse tipo de exame. Se uma mulher com mais de 50 anos se queixa de fadiga e calores, o médico pode considerar que, provavelmente, isso seja causado pela menopausa. Também há um grupo de idosos que não praticam sexo seguro. Consideram que se já não há risco de engravidar não é preciso usar camisinha, advertiu Schegloff.
As mulheres negras são um dos grupos com mais rápido aumento do HIV nos Estados Unidos. Outro fator que contribui para o envelhecimento da aids são os idosos gays, que durante anos usaram preservativos e acabam se cansando desse uso, destacou Schegloff. Um tema que veio à luz por meio dos projetos artísticos é o medo de morrer na solidão e como se exacerba com o HIV/aids se o casal ou os amigos morreram vítimas dessa doença. Muitos idosos nos Estados Unidos não têm recursos financeiros para sobreviver bem à enfermidade, pois carecem da assistência social e têm pouca ou nenhuma economia.
Diante da pergunta sobre o que deveria ser feito para abordar o envelhecimento da aids, Schegloff respondeu: “Eliminar o teto de idade para a educação e os exames. Eu ficaria encantado se houvesse mais educação dos provedores de saúde e serviços sociais sobre o estigma associado ao HIV e ao envelhecimento, já que as pessoas enviam constantemente mensagens que podem magoar os idosos”, enfatizou. Envolverde/IPS