Lilongwe, Malawi, 30/4/2013 – Esnart Phiri, viúva e com cinco filhos, dormiu vários dias seguidos do lado de fora do mercado estatal de venda de milho da capital de Malawi, chamado Admarc, para poder conseguir o apreciado alimento. As filas nunca acabam nos Admarcs, porque milhares de pessoas são forçadas a esperar durante dias por este produto primordial na dieta deste país de mais de 14 milhões de habitantes.
Phiri contou à IPS que durante as noites coloca seu filho mais velho na fila para não perder o lugar, enquanto ela e os outros filhos dormem em um corredor do escritório que fica do outro lado da rua. “O mercado se tornou meu lar temporário porque não tenho forças para ir e vir caminhando todos os dias. Prefiro dormir aqui e esperar pelo milho”, afirmou. Phiri vive em Chinsapo, a 40 quilômetros de Lilongwe.
Malawi sofre uma escassez de milho devido a dois períodos seguidos de seca. Este alimento representa 90% da ingestão calórica neste país, seguido de mandioca, batata-doce e sorgo. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a produção de cereal no período 2011-2012 caiu 7% em relação à safra anterior. Cerca de dois milhões de pessoas carecem de alimentos suficientes este ano devido à prolongada seca e à alta dos preços dos alimentos, o que elevou o preço ao consumidor em 36,6%, segundo dados de março.
Todos os dias, antes do amanhecer, Memory Jamesi, grávida de quatro meses, se levanta e caminha 40 quilômetros até o Admarc de Lilongwe. Há algumas semanas, Jamesi, que tem outros três filhos, desmaiou enquanto esperava na fila. “Me senti fraca e cansada, tive fortes tremores enquanto estava na fila, e não sei o que aconteceu depois”, contou à IPS em um quarto da lotada ala de mulheres do Hospital Central de Kamuzu. E sua situação não é única.
Aproximadamente cinco em cada dez pessoas ouvidas pela IPS em Chinsapo disseram que seus filhos passaram fome nos últimos meses. Mas isto não se deve apenas à escassez de milho, porque quando ele existe não dá para pagar seu alto preço. Uma saca de milho de 50 quilos custava cerca de US$ 13, mas agora esse valor mais do que dobrou, muito acima da renda das pessoas pobres, que vivem com menos de US$ 20 por mês, e não podem pagar os US$ 30 que está custando.
Nesse país, onde as mulheres representam 70% da mão de obra agrícola e são o sustento da família, elas e as crianças ficam com a pior parte da alta do preço dos alimentos. A situação alimentar ficou mais crítica nos últimos dois meses, depois que aproximadamente 30 mil toneladas de milho das reservas estratégicas apodreceram.
Segundo o secretário principal do Ministério de Agricultura e Segurança Alimentar, Jeffrey Luhanga, o milho perdido era suficiente para alimentar quase 400 mil dos dois milhões de pessoas que necessitam de assistência alimentar. “Agora tivemos que importar 50 mil toneladas de Zâmbia para cobrir a falta”, acrescentou. É a primeira vez em seis anos que Malawi se vê obrigado a importar milho de seu vizinho.
Entre 2006 e 2011, o país conseguiu uma abundante colheita de milho graças ao sucesso de um programa de subsídio de fertilizantes. Dentro dessa iniciativa, lançada em 2005 e que funcionou muito bem, os camponeses pobres se beneficiavam de uma redução de 40% no preço de fertilizantes e sementes. Além disso, em 2003, adotou o Programa Integral de Desenvolvimento Agrícola da África, que objetiva eliminar a fome e reduzir a pobreza.
Mas a prolongada seca e a corrupção na rede de distribuição e fornecimento de fertilizantes do programa de subsídio reduziram a abundância de colheitas e afetaram a produção. “Nos últimos dois anos de governo do (falecido) presidente Bingu wa Mutharika, houve corrupção no programa de subsídio aos fertilizantes e as famílias-alvo não foram beneficiadas pelo desvio de insumos. Além disso, as duas secas, especialmente no cinturão de produção de milho, prejudicaram as colheitas”, ressaltou Luhanga.
Porém, o ministro de Agricultura e Segurança Alimentar, Peter Mwanza, declarou à IPS que espera que a próxima colheita seja importante graças às abundantes chuvas. “Nossas primeiras estimativas revelam que a colheita ficará em torno de 3,5 milhões de toneladas, mais do que o colhido no ano passado”, acrescentou. As previsões indicam que a produção vai superar o consumo nacional de 2,8 milhões de toneladas. Envolverde/IPS