Punta del Este, Uruguai, 30/10/2012 – O Uruguai está no topo das notícias sobre inovação agrária esta semana, por ser a sede da Segunda Conferência Mundial sobre Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento (GCARD 2), que começou ontem e terminará no dia 1º de novembro, nesta cidade. Destacados pesquisadores e organizações de todo o mundo se reúnem para desenhar ações colaborativas, fortalecer as capacidades e estimular a inovação no desenvolvimento agrícola.
Com especial atenção à associação, serão planejadas ações conjuntas para uma agenda prospectiva, que examine as tendências previstas, as necessidades futuras e as soluções sustentáveis, para definir quais devem ser as medidas e prioridades da agricultura da atualidade. Além de ser anfitrião deste importante encontro internacional, o Uruguai tem outro papel fundamental a desempenhar como modelo emergente e fonte de lições e estratégias agrícolas de sucesso. A evolução de sua produção de arroz é um exemplo.
O setor arrozeiro uruguaio é tão único quanto surpreendente, e, de fato, ostenta a terceira taxa de produção mais alta no mundo, com média de oito toneladas por hectare de arrozal seco. E continua florescendo. Sem subsídios especiais nem proteção do governo, oferece preços justos aos agricultores e resiste à feroz competição de outros grandes produtores, como Estados Unidos, Argentina e Tailândia. O setor também é ambientalmente sustentável, já que adota práticas de gestão agrícola destinada a reduzir suas pegadas de carbono e hídrica.
Qual o segredo do sucesso do arrozeiro no Uruguai, e o que se pode aprender com ele? Para começar, foca em um mercado exportador de alto valor. São aplicados rígidos padrões de produção e beneficiamento para garantir uma qualidade uniforme. A quantidade de produtores é relativamente pequena, menos de 600, e suas terras são grandes, com média de 300 hectares em planícies.
O sistema se baseia em uma cadeia de valor curta e muito interativa. Os agricultores estão vinculados diretamente com os proprietários dos moinhos, que atuam como exportadores. Os dois grupos também têm estreitas relações com o Instituto Nacional de Pesquisa Agropecuária (Inia). As regras sobre os padrões de qualidade para o arroz estão bem definidas.
Agrônomos associados com os donos de moinho e representantes do Inia visitam frequentemente as plantações, dão conselhos e informação sobre os últimos avanços, mas também recebem dados dos produtores sobre suas necessidades de insumos e pesquisa. Os agricultores também se beneficiam de outras características especiais do sistema. Para se protegerem de eventuais danos causados por granizo, existe um seguro coletivo. E os moinhos emprestam aos produtores até 70% do crédito que necessitam para adquirir equipamentos.
Os agricultores e donos de moinho assinam um contrato de produção a cada ano, que inclui um acordo privado de preços. Por sua vez, os moleiros trabalham estreitamente com os comerciantes internacionais, evitando intermediários, e colaboram com os especialistas do Inia fornecendo informações sobre a demanda ou indicando outras necessidades de pesquisa.
A transparência e a integração do modelo uruguaio fomentam a estabilidade e reduzem a incerteza, assegurando a sustentabilidade econômica e a competitividade em um ambiente hostil. Além disso, a gestão dos cultivos e as práticas de rotação favorecem um alto rendimento e a sustentabilidade ambiental.
Aqui também há importantes exemplos para o resto do mundo. O progresso substancial da produção de arroz no Uruguai é resultado de uma combinação de melhorias na semeadura, nas sementes, no uso de fertilizantes, na gestão da água e no controle de pragas. São usadas sementes certificadas de variedades melhoradas e minimiza-se a lavragem para reduzir as emissões de carbono armazenado no solo, que chega à atmosfera contribuindo para os gases-estufa.
A disponibilidade de água é um fator limitante para a expansão da produção e, portanto, os agricultores constroem represas para capturar o excedente das chuvas. Atualmente, mais de 50% dos arrozais uruguaios são irrigados graças a estas represas. O tempo de semeadura é cuidadosamente calculado para maximizar a exposição ao Sol quando as plantas estão florescendo e minimizar o dano do frio quando estas se reproduzem. As práticas de manejo do solo incluem a rotação regular. Depois de dois anos de cultivo de arroz, planta-se pastagens por três anos. Isto também ajuda a reduzir as emissões de carbono e a devolver fertilidade à terra.
É possível aplicar o modelo uruguaio em outro lugar? Elementos como sua integração, padrões de qualidade, transparência e manejo de cultivos podem ser exemplos úteis para serem replicados em diferentes setores de produção. O modelo também pode ser aplicado em países específicos. Algumas áreas do delta do Rio Mekong, no Vietnã, têm grande potencial, pois ali há apoio do governo para desenvolver um setor arrozeiro de alta qualidade para mercados de classe média.
O tamanho deste tipo de mercado nos países em desenvolvimento crescerá mais do que o dobro nesta década, particularmente na Ásia. Isto poderia ser um bom presságio para desenvolver setores de arroz de alta qualidade em países onde esse produto é muito importante. A GCARD 2 fornece uma rica plataforma para considerar as lições e os modelos do setor arrozeiro uruguaio.
Junto a representantes do setor agrícola nacional uruguaio, haverá sócios internacionais, como o Fundo Latino-Americano para Arroz de Irrigação, a Global Rice Science Partnership e o Centro Internacional de Agricultura Tropical, que colaboram no desenvolvimento de variedades melhoradas e em práticas de gestão que ajudaram a impulsionar o êxito uruguaio. Envolverde/IPS
* Gonzalo Zorrilla é engenheiro agrônomo e diretor executivo do Fundo Latino-Americano para Arroz de Irrigação.