San Salvador, Bahamas, setembro/2013 – Atualmente poucas pessoas sabem que quando foram criadas as primeiras agências de notícias, no século 19, a Havas francesa e a britânica Reuters dividiram o mundo entre elas. A divisão seguiu as fronteiras dos dois impérios coloniais.
A América Latina foi parar nas mãos da Havas, enquanto a Reuters ficou com os Estados Unidos.
A primeira agência norte-americana que rompeu o monopólio foi a United Press International (UPI), alegando que os Estados Unidos não podiam ser vistos através dos olhos britânicos, um argumento muito parecido à queixa do Terceiro Mundo contra o monopólio de informação do Norte.
No mundo da mídia, esta agência era considerada um gigante, por isso foi uma surpresa quando, em 1986, um milionário mexicano, Mario Vázquez Raña, comprou a UPI por US$ 41 milhões e pronunciou a célebre frase: “Eu tinha dois jatos Falcon. Vendi um e comprei a UPI”.
Desde então a concentração de meios de comunicação em mãos de multimilionários proliferou. Os casos de Murdoch e Berlusconi são os mais famosos. Alguns observadores veem nisto um giro à direita, impulsionado pelos que têm dinheiro. Não se trata de uma teoria da conspiração. Simplesmente, cem possuidores de uma Ferrari tendem a ter uma visão mais coincidente sobre as coisas do que, por exemplo, os donos de cem Volkswagen.
Os Estados Unidos são um bom observatório no mundo da informação. Na verdade, o termo meios de comunicação de massa foi cunhado nos Estados Unidos, porque as vendas dos veículos deveriam ser grandes para serem considerados viáveis. Na Europa, a mídia não se dirigia à massas. O famoso Times de Londres (agora em mãos de Murdoch) vendia cerca de 50 mil exemplares, e seus leitores eram a elite do Império Britânico. Os jornais europeus eram culturais, com artigos longos e bastante analíticos. Os meios de comunicação norte-americanos partiram na direção oposta e assim nasceram os mass midia.
Nas últimas semanas, uma impressionante série de prestigiosos jornais norte-americanos foi comprada por milionários. O caso mais conhecido é o do Washington Post, considerado o jornal mais influente junto com o New York Times.
Durante os últimos 80 anos, o Post esteve nas mãos da mesma família, os Graham. Jeffrey Bezos, fundador da Amazon, o comprou por US$ 250 milhões, cifra que representa 1% dos 25 bilhões de sua fortuna pessoal (a Amazon conta com uma capitalização de mercado de US$ 128,37 bilhões). A venda incluiu no pacote vários outros jornais locais, avaliados há dez anos em US$ 5 bilhões.
Este fato é um golpe de morte definitivo para os jornais de propriedade familiar. Houve um tempo em que os Chandler eram proprietários do Los Angeles Times, os Copley do San Diego Tribune, os Cowles do Minneapolis Star Tribune, e os Bancroft do Wall Street Journal (WSJ).
Aquelas famílias defenderam a independência e a identidade de seus jornais. É patente a diferença entre o WSJ dos tempos dos Bancroft e o de agora, propriedade do onipresente Murdoch.
O Boston Globe foi comprado por outro multimilionário, John Henry, por apenas US$ 70 milhões. O New York Times (NYT) pagou US$ 1,1 bilhão em 1993 pelo Globe.
Até quando o NYT continuará sendo a última referência do jornal familiar, neste caso propriedade de quatro gerações da família Sulzberger, desde 1896? O NYT não sofre perdas, mas não deixa de ser um peixinho em um mundo de tubarões. Tem uma capitalização de mercado de US$ 1,67 bilhão contra os US$ 56,663 bilhões de ativos da Murdoch News Corporation, os US$ 27 bilhões da família Bloomberg, os US$ 93,86 bilhões do Facebook, ou os 284,04 bilhões do Google. Dito de outra forma, hoje em dia a palavra está com o dinheiro. E, segundo parece, a batalha pelo futuro será travada na internet.
A Aliança de Meios de Comunicação Auditados informou recentemente sobre uma queda drástica nas vendas de revistas. A Newssweek foi comprada em 2010 por um dólar pela IBT Media, uma companhia pouco conhecida, enquanto outras revistas, como Vogue, Vanity Fair, Metropolitan e People seguem pelo mesmo caminho. Segundo a mesma fonte, nos Estados Unidos as assinaturas online aumentaram de 5,4 milhões para 10,2 milhões no último ano.
O New York Times já superou os 60 mil assinantes graças a uma agressiva campanha de assinaturas online. Estão seguros de que isto garantirá a viabilidade do jornal no longo prazo e dessa forma descartam a possibilidade de venda.
No entanto, o que se avizinha no horizonte é que a linha que separava os meios de comunicação, quanto ao conteúdo, das redes de distribuição, está ficando apagada. Google, Facebook, Microsoft e Yahoo buscam mais notícias para transmitir, e mais publicidade. Com a compra do YouTube e do Zagat, o Google entrou com tudo no campo do conteúdo.
O Yahoo comprou um novo sistema de microblogging, que permite que 119 milhões de usuários publiquem rapidamente palavras e imagens, por US$ 1,1 bilhão, mais que o triplo dos preços combinados das vendas do Post e do Globe. Nada mais demonstrativo de como os nomes de prestígio estão a preço de banana.
Entretanto, os assinantes online representam uma mudança antropológica em relação ao antigo leitor. As suas são mentes inquietas, ansiosas por mudar de página, e isto fará com que reduzam progressivamente os artigos extensos e as análises. Este processo se acentuará na medida em que avançar a mudança geracional.
Um detalhado estudo da Universidade de Paris indica que entre as pessoas na faixa dos 14 aos 16 anos observa-se um período de atenção menor do que o de seus pais, algo que qualquer professor pode confirmar.
Além disso, para os jovens está desaparecendo a fronteira entre o jornalismo tradicional e profissional e o chamado jornalismo-cidadão, realizado por qualquer pessoa que queira publicar notícias e fotos na rede. Como resultado, qualquer texto com mais de 850 palavras (como este artigo muito resumido, com mil palavras) é considerado excessivamente longo para ser publicado. Isto faz prever um mundo melhor informado e mais consciente?
* Roberto Savio, fundador e presidente emérito da agência de notícias IPS (Inter Press Service) e editor do Other News.