Por Jasmin Ramsey, da IPS –
Washington, Estados Unidos, 22/5/2015 – Mais de 25 mil combatentes que pretendem lutar a “jihad”, ou guerra santa islâmica, abandonaram seus países para se integrarem a grupos extremistas no estrangeiro, segundo informes reservados vazados destinados ao Conselho de Segurança da ONU e dados de outras investigações.
Estes combatentes estrangeiros, que em sua maioria aderem à Frente al Nusra, da Síria, ou ao Estado Islâmico (EI), presente na Síria e no Iraque, procedem de mais de 100 países, segundo o documento da Organização das Nações Unidas (ONU), do qual recentemente foram divulgadas partes e que analisa as sanções impostas à rede islâmica Al Qaeda.
Embora os recrutas estrangeiros seja majoritariamente do Oriente Médio e do norte da África, eles também procedem de países ocidentais. Uma lista publicada em fevereiro pelo Centro Internacional para o Estudo da Radicalização, com sede em Londres, diz que entre os países ocidentais a França produziu o maior número de recrutas estrangeiros, com 1.200, seguida de Alemanha e Grã-Bretanha com 500 e 600 cada uma, enquanto os Estados Unidos tiveram apenas 100.
Por que os Estados Unidos tiveram um número tão baixo de recrutas em comparação com seus aliados da Europa ocidental?
“Neste país as autoridades da ordem pública trabalham muito mais próximo às comunidades muçulmanas de modo que agora alguns elementos dentro da comunidade seguem o lema ‘se vejo algo, digo algo’”, afirmou à IPS Emile Nakhleh, professor da universidade do Novo México (EUA) e fundador do Programa de Análise Estratégica do Islã Político da Agência Central de Inteligência (CIA). “Aqui, em sua maior parte, os muçulmanos sentem que são parte do sistema e do país, não se sentem alienados”, acrescentou Nakhleh.
Enquanto a maioria dos muçulmanos em todo o mundo rejeita o extremismo violento e teme sua expansão em seus países de origem, os muçulmanos norte-americanos, que são cerca de 2,6 milhões, em sua maioria de classe média e com educação formal, o rejeitam em maior porcentagem.
Uma pesquisa do Centro de Investigação Pew sobre os muçulmanos norte-americanos em 2011, a mais recente de seu tipo, mostra que 81% acreditavam que os atentados suicidas e outras formas de violência contra objetivos civis nunca ou raramente (5%) se justificava como defesa do Islã diante de seus inimigos. Isso em comparação com uma média de 72% de muçulmanos em todo o mundo para os quais esse tipo de ataque não se justifica e 10% para os que acreditam que raramente se justificam.
Entre os muçulmanos norte-americanos tampouco predomina uma seita ou uma origem étnica em particular. Uma pesquisa do Pew de 2007 indica que estavam mais assimilados à cultura norte-americana do que os muçulmanos da Europa ocidental.
A maioria dos muçulmanos norte-americanos expressou, em geral, uma opinião positiva da sociedade e disseram que seus locais de residência são excelentes ou bons para viver. Setenta e dois por cento concordaram com a opinião de que o trabalho duro ajuda a prosperar.
Em geral, os muçulmanos europeus não têm uma posição econômica tão boa e se sentem frustrados com a falta de oportunidades. Calcula-se que cerca de 1.200 combatentes deixaram a França para se converterem em jihadistas na Síria e no Iraque, segundo o ICSR. Mais homens britânicos aderiram a grupos extremistas islâmicos nos estrangeiro do que os que ingressaram nas forças armadas de seu país.
O recrutamento baseado na ideologia, particularmente pela Internet e mediante as redes sociais, e o descontentamento com as políticas de seus países com relação aos muçulmanos são as principais causas da radicalização islâmica nos países ocidentais, especialmente quando suas comunidades estão isoladas das demais.
A sensação de alienação, especialmente dos filhos dos imigrantes muçulmanos, mesclada com a antipatia pela política externa de seu país faz com que alguns islâmicos sejam os principais alvos dos recrutadores estrangeiros. “Os imigrantes franco-argelinos muçulmanos ou os muçulmanos do sul da Ásia na Grã-Bretanha se sentem excluídos e constantemente vigiados e seguidos pelas autoridades”, explicou Nakhleh.
Embora os Estados Unidos também tenha programas de vigilância da população muçulmana, e mais da metade dos norte-americanos muçulmanos ouvidos pelo Pew em 2011 tenham dito que as política antiterroristas de vigilância se concentravam neles, esta não expressou o mesmo nível de descontentamento com sua vida apresentado por essa população na França e Grã-Bretanha. De fato, os muçulmanos norte-americanos ouvidos nessa pesquisa que denunciaram discriminação igual expressaram um alto nível de satisfação com suas vidas nos Estados Unidos.
Já os muçulmanos franceses, em particular, se queixam da intolerância religiosa na sociedade, em geral laica. A lei francesa que proíbe o véu islâmico e a burca, túnica que cobre todo o corpo, provocou irados protestos e enfrentamentos com a polícia. Grupos muçulmanos também se queixaram do aumento de ataques violentos desde que essa proibição virou lei em 2010.
No sul da França, dois homens agrediram, em março, uma mulher grávida de nove meses para lhe arrancar o véu enquanto gritavam “nada disso aqui”. Outro ataque islamofóbico em 2013 fez com que uma mulher muçulmana francesa em Paris sofresse aborto voluntario.
Já o governo dos Estados Unidos procura evitar que suas comunidades muçulmanas se sintam discriminadas e isoladas. Em suas duas administrações o presidente Barack Obama em várias ocasiões diferenciou extremismo islâmico e o Islã como religião. “Não estamos em guerra com o Islã, estamos em guerra com os que perverteram o Islã”, afirmou Obama no dia 18 de fevereiro na Cúpula para Enfrentar o Extremismo Violento, realizado pela Casa Branca.
Obama também incentivou a tolerância religiosa ao convocar os líderes da comunidade muçulmana para que trabalhem mais próximos com o governo com vistas à erradicação do extremismo.
O atentado de 7 de janeiro em Paris, quando dois homens armados assassinaram 11 funcionários do semanário satírico Charlie Hebdo por considerarem ofensivas aos Islã caricaturas que publicaram, deixou os países ocidentais em alerta máximo diante dos chamados ataques de “lobo solitário”, nos quais indivíduos cometem violência por uma causa.
Os Estados Unidos não tiveram um atentado terrorista semelhante desde abril de 2013, quando dois irmãos chechenos-norte-americanos explodiram bombas caseiras na maratona de Boston matando três pessoas e ferindo centenas.
Embora o Estado Islâmico e grupos semelhantes possam planejar ataques em território norte-americano se considerarem que Washington está diretamente implicado em seus combates, seu principal objetivo neste momento é recrutar estrangeiros como combatentes, afirmou Nakhleh.
“Quanto mais jihadistas ocidentais puderem contratar, mais internacionais se poderão apresentar na hora de buscar alianças nos países asiáticos, e no norte da África. Assim, se apresentam a si mesmos como um califato muçulmano mundial”, concluiu o acadêmico. Envolverde/IPS