Debate promovido durante a XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação da UniRitter discutiu o papel do Estado na gestão ambiental. Participaram do evento o Promotor de Justiça Daniel Martini, a Juíza de Direito Patrícia Laydner, o professor de Direito Constitucional Eduardo Carrion e a professora de Direito Ambiental Karine Migliavacca.
Por Roberto Villar Belmonte
Na defesa do meio ambiente, o Estado brasileiro utiliza instrumentos jurídicos inadequados que precisam ser complementados. Além disso, a ausência de estrutura estatal cria um estado de inconstitucionalidade. A atual desgovernança ambiental é resultado destes dois fatores.
Esta foi a tese defendida com ênfase pelo Promotor de Justiça Daniel Martini, coordenador do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público do Rio Grande do Sul, um dos convidados para o debate sobre o papel do Estado na gestão ambiental realizado no dia 21 de outubro no campus Zona Sul da UniRitter de Porto Alegre, dentro da programação cultural da XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação.
Os instrumentos jurídicos utilizados no Brasil têm o objetivo de reprimir e punir, e assim acabam mantendo o status quo, afirmou Martini. Para o Promotor de Justiça, se no lugar do ordenamento protetivo-repressivo fossem utilizados instrumentos econômicos seria possível fomentar, pelo mercado, bons comportamentos.
A visão econômica reformista defendida por Martini é a da Economia Ecológica, que enxerga a economia como um subsistema do planeta Terra e, portanto, com limites que devem ser pactuados pela sociedade e regulados pelo Estado, e não definidos apenas pelas leis do mercado, como defende a visão liberal da Economia Ambiental, outra corrente do campo da Economia do Meio Ambiente.
As normas de comando e controle são ineficientes e devem ser complementadas por um ordenamento promocional, defendeu Martini. Em sua palestra, realizada no turno da noite no Auditório do Prédio D do campus Zona Sul da UniRitter, o promotor com mestrado e doutorado em direito ambiental realizados na Itália, também embasou sua tese sobre a necessidade de um novo ordenamento jurídico para o meio ambiente no funcionalismo sistêmico do sociólogo alemão Niklas Luhmann (1927-1998).
Logística sustentável
Assim como Martini, a juíza Patrícia Laydner, uma das coordenadoras do Plano de Logística Sustentável (PLS) lançado em 2015 pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, também deu destaque para a relação entre ambiente e economia.
“O argumento financeiro foi o que impactou a administração do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Nosso Plano de Logística Sustentável tem indicadores de gestão e metas. Por exemplo, reduzir em 5% o consumo de papel que em 2014 consumiu R$ 3 milhões”, relatou Patrícia Laydner.
A juíza da comarca de Sapiranga (RS) destacou ainda que por meio de licitações sustentáveis, como as realizadas pelo Tribunal de Justiça gaúcho, os órgãos públicos têm poder de mercado. E lamentou que a proposta das compras sustentáveis (Decreto N.º 51.771, de 29 de agosto de 2014) lançada no final da gestão passada do Governo do Estado tenha sido abandonada pela atual gestão.
Com cinco eixos temáticos – uso racional de bens e serviços, gestão de resíduos, licitações sustentáveis, qualidade de vida no trabalho e sensibilização e capacitação ambiental -, o PLS coordenado pela juíza Patrícia Laydner abrange não apenas as instalações e foros em Porto Alegre, mas também as 164 comarcas no interior, atingindo diretamente mais de 15 mil pessoas (802 magistrados, 8.289 servidores, 3.271 estagiários e 2.864 funcionários terceirizados).
Direito à felicidade
Refletindo sobre os novos refugiados climáticos, o professor de Direito Constitucional Eduardo Carrion defendeu o direito à felicidade. Professor da Faculdade de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público e conselheiro da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Carrion criticou o uso do PIB (Produto Interno Bruto) como indicador de desenvolvimento de um país e defendeu o uso de novos indicadores como o FIB (Felicidade Interna Bruta).
Para isso, seria preciso repensar prioridades de vida. No entendimento do professor Carrion, é necessário voltarmos nossa atenção novamente para o valor de uso dos produtos, e não mais apenas para o seu valor de troca imposto pelo mercado. “Perdemos a noção de valor de uso devido a uma espécie de imperialismo do valor de troca que nos levou à atual sociedade do desperdício e da obsolescência programada”, argumentou. A questão ambiental para Carrion deve ser vista como uma questão civilizatória.
O papel do cidadão
Pensar o ambiental é pensar na vida. Por isso o cidadão deve ser visto como sujeito ativo, defendeu a professora de Direito Ambiental da UniRitter Karine Migliavacca. “Os prejuízos ambientais afetarão a todos, do individual ao coletivo. Na ambiguidade em que o Estado se encontra, o cidadão deve ter um papel principal. Temos que repensar o formato que desejamos para a sociedade e reconstruir um Estado socioambiental”, destacou.
A professora Karine Migliavacca foi enfática ao defender o acesso à informação qualificada sobre temas ambientais. Para ela, o Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente, que deveria ser um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, ainda deixa muito a desejar. “Só a informação oportuniza gerar ações”, ressaltou a professora Karine Migliavacca. Todos concordaram neste ponto: a grande ferramenta da gestão ambiental é a informação.
Como fui o coordenador da mesa, no início do evento me apresentei como professor de jornalismo ambiental da UniRitter. No final do debate, um dos estudantes de Direito presentes me perguntou qual deveria ser o papel do jornalismo diante dos desafios ambientais. Respondi com a minha Teoria do Bode na Sala. O jornalismo tem um papel fundamental na educação ambiental informal da sociedade, sem esquecer, no entanto, de sua função primordial: trazer o bode para a sala da agenda pública. (#Envolverde)
* Publicado originalmente no Blog do Villar.