Internacional

Sul está atrasado em tecnologia digital

Mapa da velocidade da banda larga na América Latina no final de 2014, segundo informe da Comissão Econômica da América Latina e do Caribe (Cepal). Foto: Cepal
Mapa da velocidade da banda larga na América Latina no final de 2014, segundo informe da Comissão Econômica da América Latina e do Caribe (Cepal). Foto: Cepal

Por Thafli Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 11/1/2016 – O Sul em desenvolvimento, que consta de mais de 130 países, continua muito atrasado diante dos 34 países industrializados na corrida pela tecnologia digital. No Norte industrial, 81,3% das famílias têm acesso à internet, em comparação com 34,1% do mundo em desenvolvimento, segundo a União internacional de Telecomunicações (UIT), com sede em Genebra, na Suíça. Mas a pior situação é vivida pelos 48 países menos adiantados (PMA), considerados os mais pobres entre os pobres do mundo, onde apenas 6,7% das famílias têm acesso à rede mundial de computadores.

Embora a tecnologia digital avance a passos de gigante, a Organização das Nações Unidas (ONU) indica que apenas 3,2 bilhões dos 7,3 bilhões de habitantes do planeta têm acesso à internet. Entretanto, a posse de telefone celular avança enormemente e já está na casa dos 7,1 bilhões de aparelhos, além de mais de 95% da população mundial estar coberta por sinal móvel, segundo a ONU.

Uma reunião de alto nível da Assembleia Geral, a CMSI+10, reafirmou um dos direitos humanos básicos reconhecidos pela ONU, o de que cada pessoa no mundo digitalizado de hoje tenha os meios para acesso às tecnologias da informação e das comunicações (TIC), consideradas impulsionadoras essenciais do desenvolvimento sustentável.

A CMSI+10 – realizada nos dias 15 e 16 de dezembro de 2015, dez anos após a Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, realizada na Tunísia em 2015 – examinou as importantes divisões digitais que existem entre homens e mulheres e entre nações ricas e pobres. Como disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, mais de 80% das famílias nos países industrializados contam com acesso à internet, mas duas em cada três no Sul em desenvolvimento carecem dessa condição. “As mulheres são metade da população mundial, mas 200 milhões de mulheres a menos do que homens têm acesso à internet. Devemos acabar com essas divisões”, afirmou Ban.

O documento adotado na CMSI+10 também se refere a problemas novos e emergentes, como os crimes e os ataques cibernéticos e o uso das TIC com fins terroristas. Reconhece o protagonismo dos governos em matéria de cibersegurança relacionada à segurança nacional, e também o importante papel que tem o direito internacional, especialmente a Carta da ONU, na geração da confiança e segurança na utilização das TIC pelos Estados membros.

Ahmed Shaheed, pesquisador da Universidade de Essex, na Grã-Bretanha, disse à IPS que os recentes atentados sofridos no mundo reforçaram a necessidade de maior vigilância sobre o uso da internet por parte de grupos terroristas, além dos pedidos de maiores poderes de vigilância para as agências de segurança. “Mas insistimos na importância de dar passos pensados e proporcionais que respeitem a privacidade e os direitos de todos em uma sociedade democrática”, acrescentou.

Segundo Shaheed, as medidas a serem tomadas devem se basear na evidência sobre sua eficácia e estar fundamentada nos princípios básicos dos direitos humanos de prestação de contas, transparência e não discriminação. “É por isso que pensamos que era tão importante que a CMSI+10 fizesse do enfoque de direitos humanos um pilar central do documento final”, ressaltou o especialista.

“O documento final é uma grande melhora diante dos rascunhos iniciais – e nos satisfaz a crescente importância dada às disposições sobre direitos humanos –, mas poderia fazer muito mais para destacar e abordar os desafios que as TIC apresentam além das questões relacionadas com a privacidade, acessibilidade e segurança”, pontuou Shaheed, ex-ministro das Relaçoes Exteriores de Maldivas.

Kathryn Brown, a presidente da organização independente Internet Society, expressou seu firme apoio ao compromisso com o modelo multiparticipativo, que foi adotado pela primeira vez na cúpula da Tunísia. Também se manifestou a favor da renovação do mandato do Fórum para a Governança da Internet e da atenção central dada à criação de um contexto propício à digitalização para cumprir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), adotados em uma cúpula da ONU realizada em setembro do ano passado.

Mas a declaração final não reconheceu plenamente o caráter transnacional da internet como uma “rede de redes” sem fronteiras. Tentou aplicar soluções nacionais para problemas mundiais, particularmente os relacionados à segurança, afirmou Brown aos delegados em Nova York. Essa postura foi agravada pela “lamentável” crença errônea de alguns de que a cooperação exclusivamente entre os governos basta para resolver os problemas que requerem experiência e compromisso de todos, acrescentou.

“Na medida em que mais gente, e coisas, tenham acesso à internet, nos esperam muitos desafios, conhecidos e desconhecidos”, afirmou Brown, lembrando que os processos centrados nos governos são apenas uma das muitas maneiras de como as soluções podem ser concebidas e implantadas.

“As TIC desempenham um papel cada vez mais importante na promoção do desenvolvimento econômico e social, como melhora da produtividade e da governança, facilitação do comércio, criação de empregos de qualidade e prestação de serviços”, afirmou o dinamarquês Mogens Lykketoft, presidente da Assembleia Geral. A Assembleia Geral decidiu prorrogar o mandato do Fórum para a Governança da Internet por dez anos. Os Estados membros também pediram o rígido alinhamento entre o processo da CMSI e a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, destacando a contribuição transversal das TIC para os ODS e a erradicação da pobreza.

Constance Bommelaer, da Internet Society, observou à IPS que o documento final representa, em geral, uma visão positiva, ao confirmar o compromisso assumido na Tunísia e o princípio de um modelo multiparticipativo para a governança da internet. Ao reconhecer a função do Fórum, o documento da CMSI+10 não só renova seu mandato, como também afirma que os direitos humanos devem ser protegidos na internet, bem como fora dela.

“Estamos especialmente satisfeitos com a maneira com foi realizado e administrado o processo de exame pelos facilitadores dos Emirados Árabes Unidos e da Letônia.. pode ser qualificado, realmente, de um sucesso”, ressaltou Bommelaer. Envolverde/IPS