Internacional

Silêncio sobre violência de gênero deve acabar

A secretária SicilyKariuki visita a maternidade no hospital do condado de Kilifi, que conta com apoio do UNFPA do Quênia. Foto: @unfpaken
A secretária SicilyKariuki visita a maternidade no hospital do condado de Kilifi, que conta com apoio do UNFPA do Quênia. Foto: @unfpaken

Por Sicily K. Kariuki e SiddharthChatterjee*

Kilifi, Quênia, 5/7/2016 – O Ministério de Serviços Públicos e Assuntos de Gênero e Juventude do Quênia cria e fortalece os centros de recuperação para vítimas de violência sexual e de gênero, com apoio do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). No dia 1º deste mês, foi criado um desses centros no hospital deste condado, com a colaboração do governo de Kilifi.

A resposta à violência sexual e de gênero é confusa porque, apesar de ser uma das violações de direitos humanos mais generalizada no mundo, é um dos crimes menos processados pela justiça. É um problema que afeta todas as comunidades, os níveis de renda e as religiões e implica metade da humanidade.

Quatro em cada dez mulheres no Quênia sofreram alguma forma de violência por parte de seu companheiro, o que deixa claro que o silêncio sobre a violência contra mulheres, meninas e meninos deve terminar. É hora de deixar de vê-la como um assunto que diz respeito às ativistas de gênero, e passar a vê-la como um requisito do desenvolvimento sustentável.

As provas sobre os tremendos efeitos e o grande impacto da violência contra mulheres e menores são abundantes. As consequências permanecem não só em cada mulher, menina ou menino violado, mas também pode passar à geração seguinte. A violência contra mulheres é uma manifestação extrema da desigualdade de gênero e da sistemática discriminação que sofrem. Seu direito de viver sem violência depende da proteção de seus direitos humanos e de uma justiça forte.

O sistema patriarcal que domina grande parte do mundo, somado à falta de direitos dentro de casa, deixa as mulheres e as meninas vulneráveis à violência sexual, física, emocional, espiritual e intelectual. Essas atitudes se manifestam por meio de práticas como matrimônio infantil, mutilação genital feminina e direitos de herança de mulheres e meninas. São atitudes perversas que propagam o falso paradigma de que as mulheres são meros bens móveis, destinadas a serem relegadas a um segundo plano, atrás de homens e meninos.

O Quênia aprovou várias leis relacionadas com a violência contra as mulheres, como a Lei de Crimes Sexuais, de 2007, a Lei da Mutilação Genital Feminina, de 2011, e a Lei de Política Nacional para a Prevenção e a Resposta à Violência Sexual e de Gênero, em 2014. Também foram criados programas para promover a aplicação das leis. É importante processar os responsáveis, mas também se deve criar programas como a atenção e o apoio às vítimas da violência.

As pessoas que sofreram violência sexual, e concretamente estupro, por exemplo, precisam de um acesso rápido à atenção médica de emergência e a clínicas de saúde, incluindo tratamento para evitar o HIV, vírus causador da aids, aconselhamento sobre gravidez e outros. Uma mulher que apanha do marido deve ter um lugar para onde ir com seus filhos para se sentir segura, protegida e amparada.

As vítimas de violência devem ter a confiança de que, quando fazem uma denúncia policial, se beneficiem de um processo judicial que não apontará um dedo acusatório para elas e que os responsáveis sejam castigados. No começo da campanha contra a violência de gênero, houve grandes desafios, mas agora ganhou um impulso considerável, convertendo-se em assunto de grandes agências e do governo, e também da própria sociedade civil.

É reconfortante saber que um grupo de mulheres komenise dedica a lutar contra o casamento infantil em Pokot. O grupo criou um abrigo para meninas que escapam de casamentos forçados, e colabora com a administração local para deter e processar os responsáveis. São necessárias mais mãos para levar adiante a tarefa. O Ministério deseja trabalhar com iniciativas comunitárias e colaborar na coordenação com os programas nacionais. Isso inclui o enfoque dos cinco pês, em inglês – prevenção, proteção, julgamento dos responsáveis, programação e associação –, para facilitar a concretização do quinto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), sobre igualdade de gênero.

Alguns dos assuntos destacados nos cinco pês são a conscientização das comunidades sobre violência sexual e de gênero, linhas telefônicas gratuitas para receber denúncias, e a criação de centros de atenção para as vítimas, bem como a proteção mediante o processo judicial contra os responsáveis. A criação desses centros ajudará a vincular a comunidade, os hospitais e os diferentes setores que oferecem serviços contra este flagelo, como assessorialegal, atenção psicossocial e segurança.

No longo prazo, é preciso começar a desarmar os motores estruturais da violência de gênero. O status da saúde das mulheres, sua participação na economia e sua educação devem ser prioridades da agenda de desenvolvimento. Enquanto prevalecerem as desigualdades nessas áreas, as mulheres sempre ficarão expostas à violência.

Toda gama de atores de desenvolvimento devem juntar-se para garantir que cada família esteja segura e livre de todas as formas de violência. Essa é a única forma de garantir um progresso e uma paz realmente sustentáveis, das quais cada um de nósparticipe. Falemos forte e claro para acabar com o flagelo da violência sexual e de gênero. Envolverde/IPS

*Sicily K. Kariuki(@sicilykariuki) é secretária do gabinete para Serviços Públicos e Assuntos de Gênero e Juventude do Quênia. SiddharthChatterjee(@sidchat1) é representante do Fundo de População das Nações Unidas no Quênia.