Por Philipp Lichterbeck para Deutsche Welle –

O novo governo está caminhando para transformar o meio ambiente brasileiro num inferno. Um inferno de soja, pastos, agrotóxicos, cana-de-açúcar e lama da indústria de mineração, escreve o colunista Philipp Lichterbeck.

De longe, o Brasil parece um paraíso ambiental. O país divulga suas praias, seu mar, o Pantanal cheio de biodiversidade e a Floresta Amazônica, aparentemente infinita. Mas, na verdade, o Brasil está caminhando para transformar seu meio ambiente num inferno. Um inferno de soja, pastos, eucalipto, cana-de-açúcar e lama da indústria de mineração.

A destruição do meio ambiente brasileiro parece ser um dos principais projetos do novo governo. Ele está numa missão mefistofélica: quer acabar com os bons costumes. Com os direitos humanos. Com a ciência. Com os projetos de emancipação. Com o próprio pensamento esclarecido.

São pessoas que agem e falam com arrogância e crueldade. São pessoas que riem quando morre uma criança de sete anos. Que comemoram quando a polícia comete massacres em favelas, quando morrem ambientalistas ou vereadoras negras. Pessoas que não conhecem a diferença entre flertar e assediar. Pessoas com relações com milícias. Pessoas que falam toda hora em Deus mas mentem, xingam e difamam. Pessoas que gritam “zero corrupção!”, mas que são corruptas.

Em nenhum aspecto, a Agenda do Negativo fica mais clara do que na relação com o meio ambiente e a saúde dos brasileiros.

Em alemão, um provérbio diz que “o peixe começa a feder pela cabeça”. Já se sabe o que o presidente pensa sobre proteção ambiental desde 2012. Bolsonaro foi multado pelo Ibama enquanto pescava ilegalmente numa reserva natural. Ele violou a lei e prometeu pagar a multa – mas até hoje não o fez.

Em outras palavras: o presidente bate na tecla do direito e da lei. Mas não quando se trata dele e do seu clã. Nesses casos, fica raivoso. Curiosamente, agora o seu governo trabalha para tirar o poder do Ibama e esvaziar a proteção ambiental.

O novo ministro do Meio Ambiente é Ricardo Salles. Ele poderia ter sido originado na obra 1984, de George Orwell, na qual o “Ministério da Paz” é responsável pela organização da guerra. Porque, no Brasil, o ministro não tem interesse em proteger o meio ambiente, e sim em explorá-lo. É interessante notar que ele também já foi condenado: por fraudar o processo do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê, quando foi secretário estadual de São Paulo.

Salles anunciou que vai fazer o Ibama entrar na linha. Ele escolheu um novo presidente do instituto. E, como que por milagre, o Ibama anulou a multa contra Jair Bolsonaro.

Salles demitiu 21 superintendentes do Ibama. A justificativa: “Precisam ter um alinhamento conosco. É um cargo de confiança.” Isso é a língua da máfia. A tarefa do Ibama é proteger o meio ambiente dos brasileiros, mas não a obediência ao senhor Salles e seus interesses.

Como que por coincidência, entre os superintendentes exonerados do Ibama, também está Julio Cesar Dutra Grillo. Ele havia alertado para o rompimento da barragem em Brumadinho.

Consequentemente Salles também prometeu “analisar, mudar o valor ou anular” as multas para criminosos ambientais. Salles não é um ministro do Meio Ambiente, mas da Destruição Ambiental.

Da mesma forma, Tereza Cristina não parece ser a ministra da Agricultura, mas do Envenenamento dos Consumidores. Nos primeiros 50 dias do novo governo, 54 novos agrotóxicos foram aprovados. O Ministério da Agricultura deu sinal verde para que novos fabricantes possam comercializá-los, e que novas combinações químicas entre eles sejam permitidas.

Por causa de sua alta toxicidade, alguns desses produtos são proibidos no exterior. Mas isso parece ser secundário, desde que o agronegócio esteja bombando. Tem sentido, nessa lógica, que a Anvisa também deverá ser esvaziada quando se tratar de participar das reuniões de licenciamento de novos pesticidas.

Em outros países do mundo, procuram-se meios de plantar alimentos de forma mais saudável. Na Alemanha, até 2030, os orgânicos deverão ser plantados sobre 20% das terras agrícolas. Ao mesmo tempo, o mercado de alimentos orgânicos registra crescimento constante ano por ano – só em 2018, foram 5,5%.

Não é o caso do Brasil. A Fundação Oswaldo Cruz analisa 30 alimentos regularmente. Em algumas amostras, é possível encontrar até 15 agrotóxicos diferentes. E o que o legislador faz? Nada. No Congresso circula o chamado “pacote do veneno”, que almeja a aprovação de mais agrotóxicos.

O relator é o deputado Luís Nishimori (PR). Ele tem duas empresas que vendiam agrotóxicos. Mas no Brasil de hoje isso não é uma razão para substituí-lo. Poderíamos chamar também de corrupção. Nada de novo em Brasília.

A catástrofe ambiental no Rio Grande do Sul passou quase despercebida pela opinião pública. A Associação dos Apicultores Gaúchos contabiliza a perda de 6 mil colmeias, inviabilizando a entrega de 150 toneladas de mel. Em 80% das análises das abelhas mortas, foi constatado algum tipo de agrotóxico presente. Nem a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, e muito menos o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, se pronunciaram sobre o caso.

Com frequência, os inseticidas chamados de neonicotinoides são responsáveis pela morte das abelhas. Na Europa, os neonicotinoides são proibidos. No Brasil, não. A indústria agrícola é contra. Mais um produto licenciado recentemente é o Sulfoxaflor, igualmente conhecido por envenenar abelhas.

Não surpreende que a última campanha eleitoral de Tereza Cristina tenha sido financiada por 12 empresários ligados ao agronegócio. Entre eles está por exemplo o empresário rural Ismael Perina Júnior. Ele é membro do conselho consultivo da Coplana, que vende agrotóxicos no interior de São Paulo. Agro é tudo. Agro é pop. Agro é encher o bolso ao custo do meio ambiente e da saúde dos brasileiros.

Philipp Lichterbeck queria abrir um novo capítulo em sua vida quando se mudou de Berlim para o Rio, em 2012. Desde então, ele colabora com reportagens sobre o Brasil e demais países da América Latina para os jornais Tagesspiegel (Berlim), Wochenzeitung (Zurique) e Wiener Zeitung. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.

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