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Caribe olha para o céu em busca de segurança hídrica

A coleta de água de chuva é praticada nas áreas rurais de Trinidad, embora esse método ao ar livre, sem filtro, apresente riscos que o projeto promovido pela Global Water Partnership-Caribbean tenta evitar. Foto: Jewel Fraser/IPS
A coleta de água de chuva é praticada nas áreas rurais de Trinidad, embora esse método ao ar livre, sem filtro, apresente riscos que o projeto promovido pela Global Water Partnership-Caribbean tenta evitar. Foto: Jewel Fraser/IPS

 

Porto Espanha, Trinidad e Tobago, 31/10/2013 – Um sistema centenário para garantir a segurança hídrica retorna ao Caribe. Trata-se da coleta de água de chuva, que agora integra formalmente o planejamento estratégico da região, com vistas não só a tempestades mais frequentes e intensas, mas também a secas. Até 2100, as precipitações poderão diminuir entre 20% e 30%, segundo pesquisas, fazendo com que cada gota conte.

“A coleta de água de chuva, na verdade, é vista como uma das ferramentas importantes para garantir a resiliência e a disponibilidade nos fornecimentos hídricos caribenhos, em particular para aumentar o fornecimento municipal já existente”, disse à IPS Natalie Boodram, da Global Water Partnership-Caribbean (GWP-C). “A água de chuva pode dar um apoio hídrico em caso de alterações”, acrescentou.

Uma vantagem é que a tecnologia já é implantada, e especialmente muitos moradores de zonas rurais criam áreas de captação para a água de chuva que cai de seus telhados, para poder usá-la diariamente em casa. Nas Ilhas Virgens, pouco mais da metade das moradias usam esse método para atender suas necessidades hídricas. Estima-se que 500 mil pessoas na região dependem pelo menos parcialmente da coleta de água de chuva. Entre os países que mais a usam estão Antiga e Barbuda, Bahamas, Ilhas Virgens norte-americanas e britânicas, Turcas e Caicos, e Granadinas.

No começo deste mês, ministros da Comunidade do Caribe reunidos em Barbados lançaram um Programa de Água, Clima e Desenvolvimento para o Caribe, que promove o aproveitamento das precipitações como uma das maneiras de garantir água para a região. Embora a coleta de água de chuva exista há séculos, Boodram apontou que os sistemas municipais que dependem dos fornecimentos superficiais foram deslocados em muitas partes do Caribe, por isso há necessidade de restabelecer na região a cultura que implica esse método.

A GWP-C está encarregada de vários projetos deste tipo no Caribe, como parte da iniciativa mundial de sua entidade-mãe para apoiar a integração da segurança hídrica e a adaptação à mudança climática no planejamento do desenvolvimento. O objetivo era eliminar alguns dos problemas comuns associados à coleta de água de chuva, como a “exposição à contaminação aérea, aos excrementos dos animais e aos contaminantes dos telhados mal conservados, entre outros”, disse Boodram.

A tecnologia promovida pela GWP-C com a ajuda de seus sócios, particularmente o Instituto de Saúde Ambiental do Caribe, inclui um primeiro filtro grosso. Esse sistema, “que integra a parte inferior do duto, é usado para desviar a água inicial que cai do teto com contaminantes, garantindo que tudo isso não entre no tanque de armazenamento”, explicou Boodram. “O primeiro fluxo de água, que contém sujeira do teto, é fixado na parte inferior da tubulação, enquanto a água mais limpa fica na superior, permitindo que entre no local de armazenamento”, acrescentou.

Esse projeto foi usado pelo Instituto Nacional de Educação Superior, Pesquisa, Ciência e Tecnologia (Niherst) de Trinidad e Tobago, que se associou à GWP-C, para introduzir a tecnologia de coleta de água de chuva nas comunidades rurais da ilha de Trinidad. A ideia era criar abrigos para situações de desastres, especificamente escolas, detalhou a encarregada de projeto da entidade, Lovaan Superville. “Devido à mudança climática, precisamos estar preparados para os desastres”, pontuou, acrescentando que a primeira coisa a ser prevista no caso de furacões é a água.

O Niherst desenhou 15 escolas com a tecnologia de coleta de água de chuva, e algumas delas com painéis solares como fonte de apoio energético. Para garantir a manutenção, Superville explicou que capacitaram cerca de 25 pessoas em cada comunidade: Toco, Moruga e Barrackpore. “Os coletores de água de chuva são de fácil acesso e limpeza, e são feitos com materiais obtidos localmente, assim não são caros. Qualquer encanador ou eletricista, uma vez treinado no funcionamento de nosso sistema, pode facilmente duplicá-lo”, acrescentou.

Entrevistas com os diretores de algumas das escolas das comunidades de Moruga e Barrackpore, no sudeste de Trinidad, confirmam que os coletores são um sucesso. Benjamin Santoo, diretor da Escola Presbiteriana Rochard Douglas, contou à IPS que, quando o tanque que está ligado a uma torneira comum é limpo, contém dez centímetros de lodo. “Quando limpamos os tanques de água de chuva não temos esse problema”, ressaltou. “A água costuma chegar uma vez por mês” através da tubulação principal. “Dependíamos dos caminhões-tanque para nos abastecer de água toda segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira. Como a escola tinha mais de 500 alunos, a água não era suficiente para beber e limpar os banheiros”, acrescentou.

Em muitas localidades, as escolas recebiam a água pela tubulação correspondente ao fornecimento municipal apenas duas vezes por semana, e às vezes menos. Com a instalação dos coletores de água de chuva, puderam reservar a água da rede para beber e usar a da chuva para os banheiros, regar jardins e realizar projetos escolares.

Henry Smith dirige o Instituto de Pesquisa de Recursos Hídricos na Universidade das Ilhas Virgens, onde a escassez de água subterrânea dificulta garantir um fornecimento estável. “A coleta de água de chuva em instalações individuais permite aos usuários o acesso a uma fonte que podem manejar de modo independente para seu benefício, enquanto aprendem a compreender suas próprias necessidades, o que podem esperar da chuva em sua área e, também quais outras fontes de água podem estar disponíveis para eles”, destacou Smith à IPS.

“A coleta de água de chuva pode ser uma alternativa de baixo custo, ou um complemento, que se baseia em uma tecnologia relativamente simples que pode fazer uma diferença importante para muitas pessoas que de outro modo poderiam não ter abastecimento por culpa da mudança climática”, enfatizou Smith. Envolverde/IPS