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Caribe teme perder espécies marinhas essenciais

 

A pesca é uma importante fonte de renda nos países que integram a Comunidade do Caribe. Foto: Desmond Brown/IPS
A pesca é uma importante fonte de renda nos países que integram a Comunidade do Caribe. Foto: Desmond Brown/IPS

 

Codrington, Antiga e Barbuda, 30/4/2014 – A mortalidade generalizada de estrelas do mar registrada nos últimos meses ao longo da costa oeste dos Estados Unidos também pode se repetir na região do Caribe por culpa da mudança climática, que ameaça o vital setor pesqueiro, alertou o biólogo John Mussington. Desde junho de 2013, os cientistas estão notando que as estrelas do mar, que são uma pedra angular do ecossistema marinho, morrem misteriosamente aos milhões.

“A causa desse fenômeno no Oceano Pacífico ainda é desconhecida, mas é possível que seja o resultado de vários fatores, entre eles a mudança climática”, disse Mussington à IPS. “Se fatores ligados à mudança climática, como o aquecimento do oceano, tiverem a ver com a morte das estrelas do mar, então existe a possibilidade de o mesmo ocorrer no Atlântico e afetar as espécies caribenhas”, acrescentou. Segundo o especialista, “vivemos em uma era na qual as previsões sobre mudança climática se tornaram realidade. A morte em grande escala, portanto, pode acontecer no Caribe”.

As estrelas do mar têm papel crucial nos sistemas marinhos. Comem mexilhões, percebes, caracóis, moluscos e outros pequenos animais, por isso sua saúde é considerada um parâmetro para avaliar o quanto é saudável a vida marinha em uma determinada região. Por sua vez, são alimentos de aves de praia, gaivotas e inclusive lontras marinhas. Mussington explicou que algo semelhante ao que está acontecendo no Estado norte-americano da Califórnia já ocorreu antes na região.

Em 1983, houve uma mortandade generalizada de ouriços do mar negros, das Bahamas até o sul. O ouriço do mar “é uma espécie fundamental do ecossistema marinho, semelhante às estrelas do mar afetadas no ecossistema Pacífico-Califórnia”, explicou o especialista. “Se algo afetar suas grandes populações, isso poderá ser interpretado como um sinal confiável de problemas em todo o sistema que provavelmente terá impacto em outras espécies”, acrescentou.

“Algo estava muito mal no ecossistema marinho caribenho em 1983 e o ouriço do mar negro desapareceu; atualmente a espécie é considerada funcionalmente extinta. Com a redução dessas espécies essenciais, o Caribe experimenta uma significativa deterioração de seus arrecifes de coral e das comunidades marinhas que esses mantêm, incluídas espécies comerciais economicamente importantes”, pontuou Mussington. Os ouriços do mar se alimentam de algas e é importante controlar a quantidade de algas nos arrecifes de coral.

A degradação do habitat, especialmente dos arrecifes, é citada em numerosos estudos como a principal causa da atual redução das populações de peixes caribenhos. Nas últimas décadas os arrecifes experimentaram graves perdas. Os peixes se refugiam na estrutura coralina, que também contribui para a proteção costeira.

Algumas pesquisas consideram como provável que as comunidades costeiras, bem como as economias regionais na zona do Caribe em geral, sofram grandes perdas econômicas se for mantida a tendência de degradação e destruição de arrecifes. Estima-se que as reservas pesqueiras associadas aos arrecifes do Caribe geram ganhos líquidos anuais de pelo menos US$ 310 milhões. A contínua degradação dos poucos arrecifes coralinos que restam na região reduzirá esses ganhos anuais entre US$ 95 milhões e US$ 140 milhões até 2015.

A consequente redução do turismo de mergulho também poderá afetar a renda do setor. “Tem de haver certo equilíbrio, e quando espécies importantes estão morrendo há repercussões em todo o sistema. Não devemos esquecer que o ser humano é parte integral desse sistema e que as consequências para nós serão sérias”, ressaltou Mussington à IPS.

O setor pesqueiro da região da Comunidade do Caribe (Caricom) é uma fonte importante de sustento. A população local depende desse recurso, que contribui para a segurança alimentar, o alívio da pobreza, o emprego, a entrada de divisas, o desenvolvimento e a estabilidade de comunidades rurais e costeiras, bem como da cultura, da recreação e do turismo.

A pesca proporciona emprego direto para mais de 120 mil pescadores e oportunidades de emprego indireto a outros milhares, particularmente mulheres, no processamento e na comercialização, na construção de botes, na fabricação de redes e em outros serviços de apoio.

Um pirarucu, o maior peixe de água doce do mundo, nativo do Brasil, está ameaçado pela sobrepesca. Foto: Desmond Brown/IPS
Um pirarucu, o maior peixe de água doce do mundo, nativo do Brasil, está ameaçado pela sobrepesca. Foto: Desmond Brown/IPS

 

O coordenador do Programa Ambiental do Caribe da Unidade Coordenadora Regional Caribenha no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Nelson Andrade Colmenares, afirmou à IPS que a pesca está ameaçada. “O Mar do Caribe, lar de um vibrante ecossistema que beneficia por igual pescadores, indústria turística e moradores, está ameaçado. A pesca excessiva, a mudança climática e a contaminação por esgoto, efluentes agrícolas e industriais, faz com que 75% dos arrecifes coralinos da região estejam em risco”, afirmou.

O secretário permanente do Ministério da Pesca de Dominica, Harold Guiste, explicou que o futuro das populações de caracóis e de lagostas está ameaçado, apesar dos esforços regionais para protegê-las. Guiste culpou a sobre-exploração por países alheios ao Caribe que praticam ilegalmente a pesca de arrasto em águas da região. “Notamos uma febre mundial da pesca, acompanhada por uma falta de comportamento responsável no setor pesqueiro”, advertiu à IPS.

“Esse tipo de conduta hooligan (torcedor violento) causou severas reduções em algumas importantes reservas pesqueiras do mundo, e fez outras colapsarem”, acrescentou Guiste, que pede um enfoque colaborador para evitar que esses recursos se extingam. O comércio de lagosta gera US$ 456 milhões às nações da Caricom, mas a demanda elevou a sobrepesca.

“Alguns fatores estão fora de nosso controle, como mitigar o aquecimento global”, admitiu Mussington, mas tanto os países em desenvolvimento como os industrializados precisam fazer mais, opinou. “Quem mais sofre – as populações desses pequenos Estados insulares em desenvolvimento – definitivamente não é responsável pelos problemas que enfrentamos; os responsáveis são os países industrializados”, enfatizou.

“Até agora os países industrializados resistiram a implantar políticas e mudanças que precisam acontecer”, destacou Mussington. A da mudança climática “é uma luta que o mundo tem de ganhar se quer sobreviver, porque se os pequenos Estados insulares não ganharem, significará que o planeta Terra em seu conjunto não ganha, e que a raça humana pode muito bem enfrentar a extinção total. É isso o que temos pela frente: o mundo se tornará inabitável”, ressaltou. Envolverde/IPS