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Cartagena amplia praia e avenidas em adaptação à mudança climática

Pescadores trabalham no setor de Crespo, em Cartagena das Índias, entre materiais de construção para a ampliação da praia e da avenida costeira. Foto: Helda Martínez/IPS

 

Cartagena das Índias, Colômbia, 31/1/2013 – Com a ampliação de sua praia e a construção de uma calçada dupla nas avenidas que margeiam o norte desta cidade do Caribe colombiano, o histórico e turístico lugar consolida sua adaptação à mudança climática.

A obra, nas proximidades do aeroporto internacional Rafael Núñez, começou em agosto de 2010 e a previsão é de que esteja pronto em 2014, mas já desperta receios entre pescadores que trabalham na área, que veem os trabalhos como uma ameaça à sua atividade. O projeto inclui a ampliação da Avenida Santander e tem entre seus objetivos “melhorar a mobilidade, criar uma ciclovia e ajudar na proteção da beira-mar”, segundo documento público da prefeitura do Distrito de Cartagena das Índias, de dezembro de 2009.

A ampliação da via e da praia representará “o mínimo de impacto, segundo o estabelecido por mais de cem profissionais de diferentes disciplinas, incluídos biólogos marinhos”, disse à IPS o engenheiro Jaime Silva, coordenador geral da obra executada pelo privado Consórcio Vía Al Mar.

A construção da dupla calçada se estende por sete quilômetros desta cidade de um milhão de habitantes, e na altura do setor de Crespo incorpora um túnel de 600 metros, mais 400 distribuídos entre a entrada e a saída para a superfície.

Nesta parte da cidade, com quase 49 quilômetros de costa sobre o mar do Caribe, a largura da praia será ampliada em 60 metros e protegida com um muro de pedra de 2,3 quilômetros. Além disso, nove novos esporões (construções em ângulo agudo) serão colocados ao longo dessa faixa marítima, no setor que margeia as avenidas Santander e Primera de Bocagrande.

“Em cidades costeiras como as nossas, quando se necessita material de arrasto, extraído mar adentro, é necessário pedir autorização aos órgãos públicos” de âmbito nacional, disse à IPS o biólogo marinho Francisco Castillo, assessor da Secretaria de Planejamento de Cartagena das Índias. Essas autorizações facilitaram a dragagem do leito marinho e de suas dunas em vários quilômetros da costa, para trazer sua areia e assim aumentar a profundidade da praia.

O projeto faz parte do plano de “Integração da adaptação à mudança climática no planejamento territorial e gestão setorial de Cartagena das Índias”, destinado a enfrentar fatos como a paulatina elevação do nível do mar, a crescente intensidade das chuvas, a frequência de ondas altas, inundações e outras alterações climáticas constatáveis neste século.

“As autorizações se baseiam em estudos técnicos nas dunas, mediante estudos de batimetria, pelos quais se identifica as profundidades do solo marinho. É como um empréstimo ao leito marinho, para dispor da linha costeira, e conseguir a proteção branda que garante a amplitude da praia”, explicou Castillo.

Os pescadores não precisam de estudos ou relatórios para considerar que o projeto os afeta. Eles se baseiam em sua experiência na cotidiana busca pelo sustento. “Com as obras somos prejudicados porque antes tínhamos praias. A água chegava até aqui”, disse um deles, Pedro Pineda, à IPS, enquanto apontava um limite agora coberto de areia e máquinas pesadas, à beira de antigos esporões. Mas estes perderam força e capacidade com o passar do tempo, “falta de manutenção” e devem ser substituídos, pontuou Castillo.

Por sua vez, Eduardo Jiménez, com 40 de seus 50 anos dedicados à pesca, disse que “as obras nos prejudicam porque, imagine, já com os atuais esporões, quando há ondas agitadas não se pode pescar. E isso acontece a qualquer momento”. E acrescentou: “sabíamos que serão feitas obras, mas não nos consultaram a tempo. Nos últimos tempos vieram nos falar, lá em La Boquilla onde vivo, mas as pessoas se mostram descontentes. E, como agora, temos que ir pescar mais longe”. O pescador detalhou que agora, “em dia bom”, consegue o equivalente a US$ 10.

“Aos pescadores e vendedores na praia, como aos moradores do setor, tudo foi informado de maneira eficiente e oportuna”, afirmou o engenheiro Silva. Além disso, “estamos atentos para responder a qualquer preocupação das pessoas”, acrescentou, destacando a contratação para trabalhar com operários na construção, limpeza ou vigilância, quem vive da pesca no mar ou de aplicar massagens e vender produtos na praia. Mas, “às vezes, são trabalhos duros, ou aborrecidos para nós, acostumados ao mar e ao ar livre, por isso muitos dos que contrataram já saíram”, contou Pineda.

Silva, por sua vez, explicou que os pescadores e outras pessoas da área é oferecido um trabalho estável, até que a obra termine. Também garantiu que o projeto é uma resposta as pretensões de trabalhadores, incluídos os informais, moradores e comerciantes, em uma das áreas de maior pujança de Cartagena na última década.

“A oposição e a incerteza ocorrem, em boa parte, por falta de informação suficiente. Mas isto vem sendo solucionado de maneira efetiva, planejando e corrigindo na parte social”, destacou Castillo. O assessor em planejamento destacou que só no começo deste século a cidade começou a olhar, tímida no começo, para seu desenvolvimento frente ao mar, da maneira integral que se requer, incluindo a variável de superaquecimento global.

“Na revisão dos planos de ordenamento territorial para os próximos anos, trabalharemos muito forte no tema de cota de inundação”, explicou Castillo. Assim, de “maneira adicional às obras, serão estabelecidas referências claras e contundentes para evitar a construção de prédios em áreas de risco, praticamente na praia, como ocorre hoje”, acrescentou.

“Oxalá terminem, porque é para o bem”, declarou à IPS um transeunte, enquanto passeava pela beira da praia. “É certo que existe descontentamento, pela demora em diferentes obras, com a instalação do sistema de transporte de massa e do emissário submarino, que apresentou atrasos por mais de um ano”, reconheceu Castillo.

“Mas é normal em obras de grande magnitude, tendo o mar como ator, e condições marinhas duras, o planejamento nem sempre ser cumprido, mas, neste caso, o cronograma segue bem”, enfatizou Castillo. “Cartagena é uma cidade rodeada de mar, composta de ilhas como Manga, Manzanillo, Barú, o que deixa mais complexa a atuação urbanística e social”, detalhouo o biólogo marinho.

No entanto, se mostrou convencido de que “a realidade destes projetos permitirá à comunidade confirmar que Cartagena das Índias está deixando de ser uma cidade paroquial para se converter em uma verdadeira estratégia geopolítica no Caribe”. Envolverde/IPS