Miami, Estados Unidos, junho/2011 – Estatísticas e impressões não enganam: o Barça pode ser a melhor equipe de futebol da história do “belo jogo”. Em anos recentes, sob comando de dois técnicos e dois presidentes diferentes, conquistou a Champions League, várias vezes a Liga Espanhola (os últimos três anos consecutivos), em uma temporada ganhou todos os torneios que disputou, incluindo o Mundial de Clubes, e este ano maravilhou comentaristas e técnicos ao bater brilhantemente o temível Manchester United, um dos clubes de maior êxito do planeta. Seu treinador, Alex Fergusson, afirmou que, em seu quarto de século no comando dos “vermelhos”, nunca foi vencido tão brilhantemente por uma equipe como essa.
A atuação dos jogadores do Barça transcende os limites do clube. The Economist,, New York Times, Financial Times e Newsweek dedicaram ao clube capas e comentários exclusivos. A equipe nacional espanhola, que conquistou a Copa do Mundo de 2010, contava em algumas partidas com nada menos do que sete jogadores do clube catalão. Na última votação para o “Bola de Ouro”, os três finalistas eram barcelonistas: Messi (o ganhador previsto, pela segunda vez), Xavi e Iniesta. Nada tem de estranho que a cotação do atual plantel esteja fora do alcance das possibilidades da maioria dos clubes de primeira linha, tentados a imitar o sucesso azul-grená.
Convém meditar sobre as chaves do sucesso do Barça. As explicações são tão simples como seu jogo e tão complexas como a sociedade que serve de seio ao clube. A análise deve se fixar em três eixos fundamentais: esportivo, sociopolítico e empresarial-institucional.
A fascinação que produz o jogo do Barça tem uma explicação simples: é “um jogo de meninos”. Joga como um punhado de meninos em uma rua ou no pátio do colégio. Sua obsessão é controlar a bola. Uma maioria dos jogadores do Barça não deixou de ser as crianças que foram nas equipes inferiores de La Masia, a mística escola. A diferença: agora cobram fortunas.
Esses meninos maduros cresceram obcecados pelo controle da bola, mantendo-a fora do alcance dos adversários. Desde a época de Johan Cruiff, nos anos 1970, como jogador, e na década de 1990, como treinador, a concretização do jogo de meninos tem sido o “bobinho”. Um punhado se coloca em círculo e passam a bola um para outro, deixando um “bobinho” no centro. Frustrado, este se esforça para recuperar a bola (como fazem agora os atacantes) e o perdedor passa para o seu lugar.
Assim acontece no “bobinho” durante longos minutos. Como na escola ou na rua, os meninos não entregam a bola a ninguém se não estão certos de que o receptor a devolverá. A exceção, depois de alguns passes e toques, é entregá-la exatamente no lugar adequado para que outro marque. Simples assim. Claro: para ter êxito deve-se contar com passadores como Iniesta ou Xavi e atacantes como Messi ou Pedro, que cresceram interpretando essa partitura.
A segunda chave é que este roteiro foi criado por uma organização onde, desde os dez ou 11 anos, os aprendizes são colocados em equipes de acordo com sua idade e selecionados segundo suas capacidades. O método é simples e quando sobem de categoria, até o time profissional, cada um sabe como interpretar seu papel com duas ou três variantes. Em La Masia, a antiga casa de campo e agora residência de Joan Gamper, nos arredores de Barcelona, os aprendizes de jogadores profissionais são formados em três ramos básicos: esportivo, educacional (como em qualquer escola seletiva) e caráter (como pessoas destinadas a se encaixarem na sociedade).
Nestes momentos, quase dois terços da equipe profissional surgiram de recentes gerações de moradores de La Masia. Em algumas partidas cruciais das recentes vitórias, até oito jogadores formados na casa eram titulares.
O terceiro detalhe é a sistemática construção de um clube em um sinal de identidade catalã. Mas essa marca nacionalista é a da variante aberta e liberal. O Barça foi considerado, desde a década de 1960, algo “mais do que um clube”, a confluência de um sentido nacional, em um contato onde essa consciência não era possível pelas limitações impostas pelo regime político. Na falta de um governo autônomo, algumas prefeituras livremente eleitas, um parlamento funcionando, os recém-chegados e os nativos se identificaram com o Barça, um projeto ao qual não se podia pertencer em poucos dias.
Este modelo é sustentável? Nada é eterno e os adversários podem encontrar o antídoto para a magia do Barça. Para o bem do futebol, é preciso que seja melhor e mais bonito. Envolverde/IPS
* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami ([email protected]).