Foto: Roberto Yoshida

O festival de cinema “É tudo verdade” chega a sua 17°edição. E nessa edição, o evento é dedicado exclusivamente à cultura do documentário na América Latina. No evento, mais de uma centena de filmes serão exibidos, simultaneamente, em São Paulo e Rio de Janeiro.

Nesta sexta-feira (30/03), acontece a estreia de “Coração do Brasil”, um dos grandes candidatos ao prêmio de melhor documentário na categoria brasileiro, média e longa metragem da mostra competitiva do festival.

O filme retrata uma história que começou em 1958. À época, o presidente Juscelino Kubitschek confiou aos irmãos Villas – Bôas a tarefa de demarcar o centro geográfico do Brasil. Cinquenta anos depois, três participantes da expedição original: Sergio Vahia de Abreu, o documentarista Adrian Cowell e o cacique Raoni – hoje o principal cacique da etnia Kayapó, refazem o mesmo trajeto. Depois da segunda viagem histórica ao centro do nosso país, lança-se hoje um capítulo inédito sobre a história do Brasil.

A pitada de aventura do documentário vem com Sérgio Vahia, filho do Dr. Darcílio Vahia de Abreu- conhecido como Dr. Apêndice por ter realizado dezenas de cirurgias nos índios. O documentário também trata, em algumas partes, da ambição deste homem. Foi Sérgio que convenceu Daniel Santiago, Adrian Cowell e o cacique Raoni a viajar novamente 16 mil quilômetros de barco, caminhão, e, principalmente, a pé na selva, úmida, perigosa e muito quente. São homens que resistiram dia e noite aos carrapatos, às muriçocas, aos piuns, às mangabas e aos marimbondos, às formigas de fogo e as cortadeiras, e às abelhas lambe-olhos e relatam o que viveram com um orgulho que só pertencem aos heróis.

No filme, é interessante perceber a relação de cumplicidade e uma maneira muito particular de interação entre o documentarista com os índios de diferentes etnias. O que se transforma em outro ponto forte do filme, poder conhecer um pouco mais do maior documentarista da Amazônia, que veio a falecer ao final de 2011, aos 77 anos, deixando um legado precioso.

Cowell  filmou a destruição da maior floresta tropical úmida do mundo, a situação dos povos indígenas, os sertanistas, garimpeiros e fazendeiros, sobretudo nos anos 1980 quando fez a premiada série para TV chamada “A década da destruição”.

Além disso, assistir “Coração do Brasil” é também uma chance de entender o que levou um inglês a dedicar 50 anos de trabalho na selva Amazônica. Foi durante a expedição, em 1958, que Adrian, ainda um jovem estudante, decidiu ficar na Amazônia. A partir de então, ele filmou, por 50 anos quase ininterruptamente.  São mais de 16  filmes, quase 7 toneladas de película, hoje disponível para pesquisa na Universidade Federal de Goiânia.

O filme de Santiago também é um convite à reflexão. Em 1943, a Amazônia era um mundo remoto, a segunda guerra trouxe um espírito expansionista, era preciso, crescer e explorar o Oeste do Brasil. Décadas mais tarde, os mesmos lugares permanecem intactos. As terras indígenas são as unidades de conservação mais preservadas no Brasil. Segundo dados do INPE, 98,8% das reservas na Amazônia estão conservadas.

Hoje, os Kayapó ainda aguardam a promessa de regulamentação da Terra indígena do Kapot Nhinore, território Metiktire onde o cacique Raoni nasceu. Em cinco décadas, o povo do cacique Raoni ainda não teve seu direito garantido sobre a terra conquistada.