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Grande muralha verde contra o deserto

Um agricultor de Taipingdi, protegido pela barreira de árvores. Foto: Manipadma Jena/IPS

 

Chifeng China, 13/9/2012 – O Sol ainda brilha sobre os álamos, que formam uma barreira natural no horizonte, mas Horquin Lianjun decide encerrar seu trabalho na fazenda. O vento que chega do deserto se torna ameaçador. Em seu meio hectare, Lianjun planta milho, como seu vizinho, Hua Limei, e outros agricultores da região. “Ganhamos cerca de 400 yuans (US$ 63) para cada ‘mu’ colhido”, disse à IPS. “Mu” é uma medida chinesa equivalente a 1/15 hectare.

Os dois agricultores, de aproximadamente 40 anos, vivem com suas respectivas famílias na localidade de Taipingdi, na região de Chifeng, sudeste da Mongólia Interior. Esta região autônoma chinesa, com majoritária população mongol, possui pastagens no leste e desertos no oeste, e fronteira com Mongólia e Rússia no norte. É difícil acreditar que há 60 anos estas terras de cultivo eram parte do deserto. Na época, menos de 66 hectares de floresta estavam rodeados por dunas de areia. O avô de Lianjun conseguia apenas um quarto do que ele colhe agora. Hoje, as árvores servem de abrigo para dez mil hectares de terra cultivável.

Chifeng tem uma precipitação anual entre 300 e 450 milímetros, e uma desproporcional evaporação, entre dois mil e 2,3 mil milímetros. A precipitação média na China é de 619 milímetros, e na costeira Xangai chega a 1,144 mil milímetros. Nas zonas mais secas, a regeneração da pastagem é difícil. Enquanto Taipingdi e outras localidades chinesas lutam contra a degradação, cada vez mais terras esgotadas por pastores se convertem em pequenos desertos neste país, formando verdadeiros oceanos de areia. Nos últimos 50 anos a China perdeu para o deserto uma área equivalente ao tamanho da Groenlândia, segundo especialistas.

O chamado “pote de areia” representa a maior perda de terra produtiva no mundo. Enquanto a areia degrada progressivamente as áreas cultiváveis, a pobreza cresce e gera um círculo vicioso. “Quanto mais pobre é o agricultor, mais desesperadamente busca se beneficiar da terra. Como consequência, o cultivo excessivo acelera a degradação”, explicou à IPS o ativista Bao Yongxin, do condado Aohan. Sua missão é promover as plantações como forma de frear o deserto, pelo qual também foi duramente afetado.

Yongxin e sua mulher lutaram anos para impedir o avanço da areia sobre sua terra, mas o ponto crucial chegou em 1993, quando, em uma noite de tempestade, seu irmão ficou gravemente enfermo. “Caminhei com ele toda a noite em meio aos fortes ventos e à abundante areia, sem poder enxergar para onde íamos e sem saber há quantas horas estávamos andando, até chegar à clínica mais próxima”, recordou.

Depois, nesse mesmo ano, o vento arrancou o telhado de sua casa de apenas um cômodo. “Com nossos filhos (o mais novo com apenas alguns meses de idade), minha mulher e eu passamos toda a noite encolhidos num canto enquanto a tempestade e a chuva nos atingiam”, prosseguiu Yongxin. Foi então que decidiu combater decididamente o deserto. Convenceu a comunidade de Aohan a recuperar 600 hectares de terras invadidas pela areia. Mas, em 1998, Yongxin havia gasto todas as suas economias em uma luta desigual.

Então, a comunidade se dirigiu ao Departamento de Florestas local, com o qual elaborou um projeto de quatro anos para recuperar 465 hectares. Os agricultores forneceram a mão de obra e as autoridades o apoio técnico. O Departamento capacitou os produtores em diversos métodos de conversão de terras e luta contra o deserto. A comunidade de Aohan optou por uma combinação de métodos mecânicos e biológicos. As dunas foram niveladas com máquinas e demarcadas pequenas áreas cercadas com barricadas de palha, que ajudam a estabilizar a areia e manter a umidade.

No começo da temporada de monções, em cada uma dessas áreas foram plantadas diversas espécies de pinheiros, salgueiros e outras árvores resistentes à seca, das quais 75% sobreviveram. Depois, estas foram regadas naturalmente pelas águas dos degelos. “Esta tecnologia foi amplamente usada por mais de 20 anos”, disse Dong Haijun, chefe do escritório florestal do condado de Wengnuite.

Até 2005, foram recuperados 2,4 mil hectares em Aohan, e 135 hectares de florestas se mantinham firmes como barreiras para impedir a invasão de areia. As 120 casas de Aohan agora contam com telhados resistentes aos ventos. Em 2006, foi criada uma estrada para conectar ao condado. Nesse mesmo ano, Yongxin foi eleito presidente da comunidade, e no ano seguinte o primeiro-ministro Wen Jiabao lhe concedeu o título de “combatente modelo” contra a desertificação.

Até agora, 124 milhões de agricultores e 32 milhões de famílias rurais participaram deste tipo de projeto, disse o diretor do escritório de conversão de terras da Autoridade Estatal de Florestas, Wang Feiyue. “A conversão de terras degradadas em florestas, plantações e colinas se transformou no maior projeto a favor dos agricultores até o momento na China”, acrescentou.

Os produtores recebem uma compensação em dinheiro pela falta de renda durante o período de conversão, além de sementes subsidiadas e informação técnica. Porém, ainda temem os efeitos da mudança climática, que reconhecem como a raiz de seus problemas. “Os invernos são mais longos e mais frios, os ventos sopram mais forte e os verões são mais secos. E quando chegam as chuvas, são fortes e provocam inundações”, lamentou Yongxin. Envolverde/IPS