Indicadores para a crise climática

Porto da comunidade amazônica e indígena San Miguel, no Rio Pirá Paraná, no departamento colombiano de Vaupés. Foto: María Cristina Vargas/IPS

Os dados oficiais relevantes sobre a Amazônia colombiana apresentam tantas falhas que os pesquisadores de um novo índice de sustentabilidade regional deixaram registrado que “foi difícil conseguir grande parte da informação”.

Bogotá, Colômbia, 31 de outubro de 2011 (Terramérica).- “É uma grande notícia” o governo da Colômbia estudar a anulação de títulos de mineração concedidos em áreas protegidas e regiões fronteiriças declaradas de segurança nacional, disse ao Terramérica o antropólogo Martín von Hildebrand, diretor da Fundação Gaia Amazonas. Na Amazônia colombiana, os parques nacionais representam sete milhões de hectares. A área considerada de segurança pelo Ministério da Defesa tem 4,8 milhões de hectares, mas poderia ser redefinida.

No total da Amazônia, há atualmente 138.571 hectares com títulos de mineração em vigor. As solicitações em trâmite e ainda vigentes incluem 5,4 milhões de hectares, segundo o Ministério de Minas e Energia. “Infelizmente, alertou Martín, “temos de pensar também que, na medida em que se defende certos territórios, como parques e áreas de segurança nacional, quem está ali buscando minerais se dispersa para outras áreas onde não há esta proteção. Por isso, são necessárias políticas muito sérias de acompanhamento e controle para as outras áreas da selva, afirmou.

Da Amazônia colombiana, 70% é considerada área florestal com certo grau de proteção. O título para mineração é concedido, mas condicionado a uma licença ambiental. O anúncio do Ministério de Minas e Energia, de que estuda anular concessões, foi feito no dia 26, na apresentação do Índice Amazonas 2030, elaborado por uma aliança de mesmo nome que recopila informação social, ambiental e econômica da parte colombiana desta selva que constitui o coração da América do Sul.

O estudo é inovador, pois concede a mesma importância às dimensões ambiental e indígena e às de caráter econômico, social e institucional. Cada uma tem peso de 20%. O valor mínimo do índice é zero (pior cenário) e o máximo é cem (melhor cenário). O resultado é uma análise estratégica equilibrada: a exata visão que requerem a crise ambiental e a mudança climática, na contramão de estudos habituais que privilegiam o econômico.

O xis da questão está em medir a vida dos ecossistemas. Se esta é avaliada na Amazônia segundo o índice de necessidades básicas insatisfeitas, o resultado indicaria que as comunidades indígenas vivem na indigência, e não é assim. Ao considerar o componente ambiental e a relação de conhecimento ancestral dos indígenas com seu território, objetivamente é verificável que a selva e a cultura proporcionam qualidade de vida.

Em todo caso, por meio de dezenas de variáveis que poderiam ser chamadas de “convencionais” (como nível educacional e serviços públicos), o índice observa o efeito das políticas públicas, em primeiro lugar, e da gestão privada, em segundo. “A visão é que, bem ou mal, é isto que tem, ou não tem, o Estado na Amazônia. E, depois, trata-se de fazer entender que estes indicadores para a Amazônia têm outras bases”, disse ao Terramérica a bióloga Natalia Hernández, que coordenou a desenho do estudo Amazonas 2030 em seu início.

“Somente considerando no mesmo nível o cultural, o social e o ambiental com o econômico e o institucional, se estará abrindo caminho para uma visão de desenvolvimento a partir da Amazônia”, acrescentou Natalia. A Amazonas 2030 é uma aliança de organizações não governamentais, empresas e meios de comunicação que promove a sustentabilidade e a qualidade de vida nesta região colombiana para colocá-las nas agendas nacional e internacional.

Seu nome se deve ao fato de, segundo o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática, se for mantido o ritmo de desmatamento, em 2030 mais da metade da floresta amazônica estará degradada. Os dados oficiais relevantes sobre a Amazônia apresentam tantas falhas, que os pesquisadores fizeram constar no relatório que “foi difícil conseguir grande parte da informação, especialmente dados relacionados com salvo-condutos de movimentação de madeira, etnoeducação e legalização de extrações de áreas situadas em reserva florestal, entre outros”.

Além disso, os números coletados e incluídos no índice correspondem apenas a assentamentos urbanos. “O índice não reflete a cosmovisão dos indígenas devido à falta de informação que possa ser coletada”, alerta um texto sobre a metodologia. Talvez, as variáveis onde esta falha é mais intensa sejam as de saúde, que não levam em conta o trabalho dos xamãs, cujo impacto nunca foi medido.

Os departamentos avaliados são Amazonas, Putumayo, Caquetá, Guaviare, Vaupés e Guainía, que somam 403.348 quilômetros quadrados, uma extensa região que inclui o sul e o sudeste. O estatal Instituto Amazônico de Pesquisas Científicas Sinchi acrescenta ao território amazônico colombiano nove municípios do departamento do Meta, um de Vichada, três de Cauca e quatro de Nariño.

Dessa forma, a Amazônia colombiana compreende 483.164 quilômetros quadrados, 42% de seu território continental de 1,1 milhão de quilômetros quadrados. A Colômbia possui 17% dos rios da região amazônica, que por sua vez são fonte de 20% da água doce do planeta. Por seu tamanho, a Amazônia regula o clima global. Contudo, a dimensão geográfica da Amazônia varia, segundo três formas de entender este grande tesouro de diversidade biológica e cultural.

Uma compreende a Amazônia como região ou bioma, e inclui a bacia do Rio Amazonas e parte as dos rios Orenoco e Paraná. A outra inclui a bacia e os afluentes do Amazonas, e, finalmente há a Amazônia político-administrativa de cada país, que é medida em termos de planejamento e desenvolvimento. Bolívia, Peru e Equador, chamados, com a Colômbia, de países “andinos”, na realidade têm quase a metade de seus territórios na Amazônia. A Venezuela definiu que sua Amazônia inclui apenas a bacia amazônica, na beira do Estado venezuelano do Amazonas. Assim, se denomina Guayana Venezuelana toda a selva no resto desse Estado e a maior parte da do Estado Bolívar, ao sul do Orenoco.

O resultado global do Índice Amazonas 2030 é de 51,4, um número que apresenta acentuados contrastes. No colombiano Caquetá, foi destruída quase metade da selva, em Putumayo a quarta parte e em Guaviare um terço. Estes três departamentos do nordeste da Amazônia se caracterizam por uma alta proporção de colonos, poucos nativos e resguardos (territórios sob administração indígena), cidades grandes e infraestrutura viária.

Já nos também colombianos Amazonas, Vaupés, e Guainía, há muito pouco desmatamento e parques nacionais e não existe infraestrutura viária. As diferenças entre estas duas regiões da Amazônia colombiana se refletem meridianamente em uma pesquisa de percepção entre os habitantes da região, apresentada também pela Amazonas 2030 e realizada apenas em centros urbanos.

*A autora é correspondente da IPS.

LINKS

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Índice Amazonas 2030 – Mapa de resultados, pdf em espanhol

Segunda pesquisa de Percepção Amazonas 2030, pdf em espanhol

Amazonas 2030, em espanhol

Fundação Gaia Amazonas, em espanhol e inglês

Instituto Amazônico de Pesquisas Científicas Sinchi, em espanhol e inglês

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.