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Lei homofóbica exclui gays da luta contra a aids no Zimbábue

O Zimbábue penalizou as relações homossexuais, o que despertou o temor em muitas pessoas que ficaram excluídas das estratégias de luta contra o HIV/aids. Foto: Jeffrey Moyo/IPS
O Zimbábue penalizou as relações homossexuais, o que despertou o temor em muitas pessoas que ficaram excluídas das estratégias de luta contra o HIV/aids. Foto: Jeffrey Moyo/IPS

 

Harare, Zimbábue, 19/12/2014 – O Zimbábue nada fez para reduzir a taxa de infecção de HIV/aids entre a população homossexual, embora este seja um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) que vencerão no próximo ano, conforme denunciam ativistas deste país do sul da África. Os oito ODM foram acordados em 2000 pelos Estados membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e incluem desde reduzir pela metade a pobreza extrema até deter a propagação do vírus HIV, causador da aids, até 2015.

Ativistas lésbicas, gays, bissexuais, trans e interssexuais (LGBTI) deste país asseguram que os homens que mantêm sexo com homens (HSH) e as pessoas transgênero estão à margem das estratégias de intervenção contra a epidemia. “Não há programas nacionais dirigidos a grupos minoritários, nem intervenções que sejam de fácil acesso para a população LGBTI em matéria de prevenção e atenção no sistema público de saúde”, disse Samuel Matsikure, da organização Gays e Lésbicas do Zimbábue (Galz). “Há lacunas no conhecimento dos trabalhadores da saúde sobre as necessidades e os melhores métodos de prevenção, tratamento e cuidado das pessoas soropositivas LGBTI”, acrescentou.

A Lei de Crimes Sexuais penaliza a homossexualidade, e o artigo 4.78 da nova Constituição do Zimbábue, aprovada em 2013, proíbe as relações sexuais e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. “Embora o governo não goste, precisa enfrentar a realidade de que gays e lésbicas existem e, portanto, deve cuidar de suas necessidades com relação ao HIV/aids, como faz quanto aos demais cidadãos. Como podemos acabar com este flagelo, se ignoramos um grupo de pessoas que, sem dúvida, transmitirá a doença?”, questionou a ativista Trust Mhindo, em conversa com a IPS.

Os ativistas querem que a lei seja modificada. “Temos que lutar por uma mudança de leis para que os gays e as lésbicas sejam reconhecidos, porque sem isso a luta contra o HIV/aids entre a população LGBTI continuará sendo inútil”, afirmou Benjamin Mazhindu, presidente da Rede Nacional do Zimbábue para as Pessoas que Vivem com HIV (ZNPP+).

“A maioria dos centros de saúde no Zimbábue não é amigável com as pessoas LGBTI, o que dificulta a declaração de doenças como as DST (doenças sexualmente transmissíveis) anais, enquanto a informação sobre saúde sexual e reprodutiva para essa comunidade é inexistente”, apontou o diretor da Galz, Chester Samba. “Quem entrar em qualquer centro público de saúde, seguramente não encontrará nenhuma informação ou bibliografia sobre gays e lésbicas no tocante ao HIV/aids”, acrescentou.

Para muitos gays, como Hillary Tembo, de 23 anos, que vive com HIV/aids, esta situação equivale a uma sentença de morte, porque o jovem teme ir a um centro público de saúde. “Sou soropositivo e tenho úlceras anais relacionadas com as DST e, na verdade, digo que tenho medo de mostrá-las aos trabalhadores da saúde por medo de que me discriminem devido à minha sexualidade”, explicou.

Porém, o ministro da Saúde, David Parirenyatwa, afirmou à IPS que, “quando uma pessoa vai ao centro de saúde, não lhe perguntam nada sobre sua orientação sexual”. Embora não sejam denunciados casos de pessoas soropositivas às quais tenha sido negado o tratamento antirretroviral por causa de sua orientação sexual, “existe a necessidade de uma resposta nacional ao HIV/aids para enfrentar as barreiras que impedem o acesso da comunidade LGBTI aos serviços sanitários, o que inclui o acesso à informação”, destacou Samba.

Mas, como a Constituição proíbe as relações homossexuais, o governo tem a dura tarefa de cuidar para que a luta contra o HIV/aids alcance um grupo de pessoas que não são reconhecidas constitucionalmente. “Não podemos torcer o braço de nossa lei suprema, que não tolera a homossexualidade, para adaptá-la às necessidades de um pequeno grupo de pessoas que estão desobedecendo a lei”, argumentou um alto funcionário que pediu para não ser identificado.

Segundo Samba, “é difícil os programas de prevenção alcançarem os homens que fazem sexo com homens e todos os HSH que vivem com HIV/aids e com frequência não podem ter acesso a tratamento, apoio e atenção necessários”. Perguntado sobre quantas pessoas LGBTI soropositivas há no Zimbábue, Matsikure, da Galz, respondeu que não pode dar números porque “não existe um mecanismo em nível nacional para a captura de dados baseados na orientação sexual”.

Mas uma pesquisa realizada pela Galz, que permanece inédita, sobre pessoas LGBTI que fizeram o teste do HIV em 2013, mostra que, de 393 HSH, 23,5% eram soropositivos, enquanto, de 179 mulheres que mantêm relações com mulheres, 32,6% tiveram resultado positivo.

Os números do Conselho Nacional da Aids no Zimbábue indicam que 1,24 milhão de pessoas neste país, de 13 milhões de habitantes, vivem com HIV/aids, cerca de 15% da população. Os dados da Agência Nacional de Estatística para 2014 indicariam que as pessoas LGBTI representam cerca de 4% dos habitantes soropositivos.

Dos seis mil gays e lésbicas associados ao Galz, 15% vivem com HIV/aids, segundo a organização. Cinco deles morreram desde janeiro. O grupo afirma que a cada ano morrem de aids entre cinco e dez de seus sócios. “As estatísticas que temos até agora são dos sócios da Galz e não são representativas em nível nacional”, explicou Samba.

Para muitos gays soropositivos do Zimbábue, como Tembo, na medida em que se aproxima o prazo para cumprir os ODM, a guerra contra o HIV/aids segue longe de terminar, diante da inexistência de estratégias claramente definidas para combater o flagelo dentro da comunidade LGBTI. Envolverde/IPS